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domingo, 12 de setembro de 2010

domingo, 21 de junho de 2009

MEMÓRIAS DE UM PERDULÁRIO

Por Beto Magno

ENVOLTA NUM FASCÍNIO INDESCRITÍVEL EMERGE MÁGICA MÚLTIPLA E DESAFIADORA A VIDA, TRANSMUTADA EM INFINITA PROGRESSÃO MAS COMO DESCOBRIR OS SEUS SEGREDOS SEM PROVAR DO MEL E DO AMARGO DO FEL, SEM HABITAR CASTELOS E ESCOMBROS, SEM PERCORRER PALÁCIOS E ABISMOS, SEM CONHECER INTENSA E PROFUNDAMENTE O ANTAGONISMO FACIAL DESSA MISTERIOSA MOEDA? ESTE PORTANTO É UM FILME FEITO DE RISOS E LÁGRIMAS, DE CENAS E IMAGENS REAIS, PROJETADAS DO ARQUIVO DAS MEMÓRIAS DE UM PERDULÁRIO....
RELIZAÇÃO: VM FILMES

sábado, 20 de junho de 2009

"O TEMPO E O LUGAR"


BETO MAGNO E JORGE MELLO (JM)

Por EDILSON SAÇASHJMA.


Genivaldo Vieira da Silva é o protagonista do documentário "O Tempo e o Lugar". Esse nome poderia passar despercebido em meio à população que sobrevive no semi-árido nordestino. Porém, a sensibilidade do cineasta Eduardo Escorel conseguiu captar naquele homem uma história que levanta questões sobre a realidade agrária do país.O primeiro contato entre Genivaldo e Escorel aconteceu em 1996, quando o cineasta realizou com ele uma peça publicitária chamada "Gente que Faz", parte de uma série institucional de um banco apresentada nos intervalos do Jornal Nacional. O anúncio mostrava Genivaldo como um agricultor familiar, mas o cineasta notou que aquele morador de Inhapi, no interior de Alagoas, possuía outras histórias.


Estava certo.Genivaldo também era um militante da causa agrária e líder do Movimento Sem-Terra. Participou de invasões, foi preso e, anos depois, tentou a carreira políticao registro do depoimento de Genivaldo relatando esta parte de sua biografia aconteceu em 2005. Em 2007, Escorel voltou a Alagoas e captou novos relatos do protagonista, desta vez com os comentários dele em relação aos depoimentos de 2005. Com isso, o ex-líder do MST passa em revista a sua trajetória e avalia sua própria história."O Tempo e o Lugar" é um filme sobre a memória e também uma revisão crítica da história recente do Brasil.Carismático e com boa retórica, Genivaldo apresenta críticas ao MST, demonstra frustração com o PT e com o presidente Lula.


Talvez se possa esperar reações acaloradas de uma parte da platéia, como ocorreu durante o festival É Tudo Verdade deste ano. O tema incendiário, porém, é tratado com sutileza e leveza por Escorel. O diretor, colaborador de cineastas como Joaquim Pedro de Andrade, Glauber Rocha e Eduardo Coutinho, consegue fugir da crítica fácil e inflamada sem perder de vista a refinada análise do contexto histórico brasileiro em que se enquadra o personagem.Cineasta, montador, roteirista e ensaísta, Escorel transforma o quase monólogo de Genivaldo em diálogo com a realidade brasileira.


Mas o diálogo é possível também em outros níveis. A estrutura e o tema de "O Tempo e o Lugar" podem ser vistos à luz de "Cabra Marcado para Morrer", de Eduardo Coutinho e do qual Escorel foi montador.Os dois filmes tratam da questão agrária do país, retratam um período histórico preciso e falam de memória.Porém, como lembrou Escorel em entrevista ao UOL, João Teixeira, protagonista de "Cabra", é um herói trágico. Genivaldo, um herói realizado. Mas ele teria atingido seus objetivos políticos e sociais? Está aí mais um ponto para se refletir.
VM FILMES

quarta-feira, 17 de junho de 2009

CINE MARACANGALHA

ELENCO DO CURTA (CINE MARACANGALHA)

Alunos do CAP Escola de TV gravam documentario em Maracangalha (cantada por Dorival Caymmi) sobre a vida do jornalista Berbert de Castro. Um dos "sete Samurais de Maracangalha" que teve tambêm uma de suas cronicas (O Pum no Cinema) adaptada para a teledramaturgia, o lançamento do documentario e do curta Cine Maracangalha será em julho de 2009.
VM FILMES

terça-feira, 16 de junho de 2009

MOSTRA DE CINEMA VITÓRIA DA CONQUISTA


Beto Magno ( VM FILMES)
nucleouniversitario

De 17 a 24 de novembro Vitória da Conquista, na Região Sudoeste da Bahia, situada a 520 km da capital baiana, é palco da terceira edição da Mostra Cinema Conquista – Um olhar para o novo cinema. Durante oito dias, a terra do cineasta Glauber Rocha será envolvida pela sétima arte, integrando o circuito nacional de mostras e festivais. O evento é uma realização da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista e da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), por meio da Secretaria Municipal de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer e do Programa Janela Indiscreta Cine-Vídeo Uesb.

A Mostra Cinema Conquista apresenta produções recentes do mundo cinematográfico, privilegiando filmes de qualidade que estão fora do grande circuito comercial, além da diversidade, que favorece a todos os estilos. O evento tem como objetivos formar público para o cinema e democratizar o acesso à sétima arte. Serão exibidos, nos oito dias da mostra, 22 longas metragens nacionais e internacionais, 42 curtas metragens nacionais, além de filmes e vídeos digitais baianos e de outros estados.

Os Espaços:
A Mostra estará acontecendo em diversos espaços da cidade, como o Centro de Cultura Camillo de Jesus Lima; o Teatro Glauber Rocha e os auditórios da Uesb, o Cine Tenda Brasil, espaço montado na Praça Nossa Senhora dos Verdes, no Bairro Brasil; e as praças públicas de bairros como Urbis VI, Alto Maron, Patagônia, Guarani e Vila Serrana. A novidade desta edição fica por conta do espaço itinerante das praças públicas, realizado em parceria com o Projeto Cine-Cidadão, da Secretaria Municipal de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer.
Além da exibição de filmes, a programação é composta por lançamentos de livros sobre temas ligados à produção cinematográfica, seminário e cinco oficinas, com a presença de pesquisadores, gestores, cineastas e renomados profissionais da Bahia, de Minas Gerais, de São Paulo e do Rio de Janeiro. Já estão confirmados nomes como Eryk Rocha, cineasta filho de Glauber Rocha; José Araripe Júnior, cineasta e diretor do CTAv/MinC-RJ; Luiz Gonzaga Assis, professor da FGV/RJ; João Baptista Pimentel Neto, secretário-geral do Conselho Nacional de Cineclubes, entre outros. Toda a programação é gratuita.
Educação para o cinema e o audiovisual:
As temáticas abordadas no seminário desse ano, intitulado "Educação para o cinema e o audiovisual" e que será realizado entre os dias 21 e 23 de novembro, abrangem assuntos atuais e de grande destaque no cenário nacional, como o cinema no mundo contemporâneo, cinema e educação, políticas públicas, cinema digital e cineclubismo. A programação conta com palestras e mesas redondas como "O cinema no mundo contemporâneo e as relações entre indústria, política e mercado", "Cinema e Educação: diálogos e perspectivas", "Cinema e TV Digital no Brasil: o caminho da convergência", "Políticas Públicas para o audiovisual no Brasil e na Bahia" e "Cinema e mercado no Brasil contemporâneo".
Livros:
Além disso, serão lançados livros como "A infância vai ao cinema", de Inês Assunção de Castro Teixeira; a coleção "O eterno e o efêmero", de Walter da Silveira, composta por quatro volumes, e a coleção "Cinema Mundial: Indústria, Política e Mercado", composta por cinco volumes, organizada pela Dra. Alessandra Meleiro e com lançamento programado em todo o mundo. Vitória da Conquista será a segunda cidade brasileira, depois de São Paulo, a sediar o lançamento desta coleção. Será lançada também a revista dos 15 anos do Programa Janela Indiscreta Cine-Vídeo Uesb.
Segundo a organização da Mostra Cinema Conquista – Um olhar para o novo cinema, a estimativa é que 10 mil pessoas, entre cinéfilos, estudantes, atores, produtores e diretores de cinema ou pessoas que, simplesmente, gostam de assistir a filmes de qualidade e que são de difícil acesso para o grande público, passem pela Mostra durante os oito dias de realização. O evento tem como patrocinador máster a Oi e o apoio cultural da Oi Futuro, por meio do Fazcultura. Também conta com o patrocínio institucional da Secretaria do Audiovisual – Ministério da Cultura, através do Fundo Nacional da Cultura e o apoio do CTAv/MinC, da TVE Bahia e da TV Sudoeste.
Inscrições:
As inscrições para os cursos e as oficinas que compõem a programação da Mostra Cinema Conquista – Um olhar para o novo cinema, estão abertas. Os interessados podem se inscrever pelo site http://www.mostracinemaconquista.com.br/ ou na sala do Programa Janela Indiscreta, no prédio do Teatro Glauber Rocha, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb).
http://www.mostracinemaconquista.com.br/ ou na sala do Programa Janela Indiscreta, no prédio do Teatro Glauber Rocha, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb).
As oficinas e os cursos serão realizados de 19 a 21 de novembro, nos auditórios da Uesb.
Serão oferecidas duas oficinas (Roteiro e Animação) e três cursos (Cinema Digital, Cinema e Educação e História do Cinema Baiano). Todos com carga horária de 20 horas, com exceção da oficina de Animação, que será de 24 horas. O número de vagas é limitado. São disponibilizadas 40 vagas para os cursos de Cinema Digital, História do Cinema Baiano e Cinema e Educação; as oficinas de Animação e Roteiro terão capacidade para 20 pessoas.


http://www.mostracinemaconquista.com.br/ contatos: Ticiana Amaral(DRT 2529/BA–(77)9962-3477 / (77) 3424–8592/8594); Evelly Freitas (77) 9198-3494 / (77) 3424-8645 e Talita Nobre (77) 9966-3754.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A NOVÍSSIMA ONDA BAIANA

Xeno Veloso, Beto Magno, Chico Argueiro, que juntamente com Jorge Mello (JM) formam o "EXPRESSO BAIANO"


Por Jorge Alfredo Guimarães

No verão de 1993 aconteceu um fato muito significativo para o cinema baiano; mesmo sentindo as fortes conseqüências da interrupção da atividade cinematográfica com o fechamento da Embrafilme, seis realizadores decidiram se reunir na Ilha de Mar Grande para, juntos, criarem um roteiro de uma longa metragem; Moisés Augusto, Fernando Bélens, Edgard Navarro, Pola Ribeiro, José Araripe Jr. e Jorge Alfredo.
Foram dias intensos e de muita interatividade entre cabeças de diferentes formações em torno de um ideal comum; levar para a tela grande as nuances e matizes, trejeitos e esquisitices dessa gente de ginga inconfundível dos becos e ruas de pedras seculares do Pelourinho; ícone da tradição cultural soteropolitana. Desse encontro surgiu o ainda inédito “Via Pelô”, que no meu entender, desencadeou o movimento de retomada do cinema baiano.

Infelizmente, nossos super egos e a falta de recursos não permitiram que o filme fosse produzido, mas creio que a partir desse encontro, todos nós, individualmente, mas sempre com a colaboração afetiva e/ou profissional dos outros cinco, intensificamos esse desejo com muita obstinação e conseguimos juntamente com outros cineastas (Agnaldo Siri Azevedo, José Umberto, Joel de Almeida, Tuna Espinheira, Sérgio Machado, Umbelino Brasil, Lázaro Faria, Sofia Federico, Edyala Yglesias, Lula Oliveira, Fábio Rocha, Bernard Attal, Joselito Crispim, Caó Cruz Alves e Conceição Senna) realizar nesses últimos anos 26 títulos em 35mm, fazendo com que a Bahia experimentasse um novo ciclo de produção cinematográfica.

Foi também nesse período que surgiu e se fortaleceu na Bahia a ABCV (Associação Baiana de Cinema e Vídeo), filiada a ABD (Associação Brasileira de Documentaristas) primeira entidade associativa do cinema brasileiro que hoje agrega associados de todas as regiões do país.

Ainda nesse ano de 1993 Fernando Belens rodou “Heteros, a comédia”, estrelado por Patrício Bisso, ator transformista argentino, com direção de fotografia de Hélio Silva, um nome consagrado do cinema novo. Foram meses de intensa excitação e muito trabalho. Logo depois estávamos a caminho do sertão de Canudos para rodar o episódio “Confirmação”, uma produção da ZDF com roteiro meu dirigido por Pola Ribeiro, tendo Vito Diniz na direção de fotografia. E Joel de Almeida rodava “Penitência”, outro episódio de “Os 7 Sacramentos de Canudos”. Também fiz a direção de fotografia de “Troca De Cabeça”, de Sérgio Machado, uma produção com a participação de Grande Otelo, Mário Gusmão, Léa Garcia, Diogo Lopes e Harildo Deda
Patricio Bisso em Heteros - A Comédia,filme de Fernando Bélens
Jofre Soares é o Mr. Abrakadabra!filme de José Araripe Jr.

Em julho de 94, José Araripe Jr. ganha o Prêmio Resgate do Cinema Nacional do MinC com o roteiro “Mr.Abrakadabra!”. Rodado em Cachoeira, esse filme foi um marco na produção baiana em muitos sentidos; Trouxemos o mestre René Persin para fotografar o filme em P&B, pela primeira vez utilizamos o recurso do videoassist e efeitos especiais no set, tendo como protagonista do filme o saudoso Jofre Soares. Moisés Augusto (Truq), até então, produziu todos esses projetos.

A Bahia novamente respirava cinema. A coisa engrenou e a gente não parou mais de produzir filmes. Em 2001, conseguimos romper um jejum de 18 anos sem produzir uma longa metragem e lançamos “3 Histórias da Bahia”, um filme de episódios dirigido por José Araripe Jr., Edyala Yglesias e Sérgio Machado. Nesse mesmo ano, Sérgio Machado realiza o documentário sobre Mário Peixoto “Onde A Terra Acaba”, e eu lanço no Festival de Brasília o documentário sobre o samba da Bahia ”Samba Riachão”.

De lá pra cá, o nosso cinema mantém uma produção sempre crescente. Em 2002, são produzidos os curtas “Catálogo de Meninas”, de Caó Cruz Alves, “Lua Violada”, de José Umberto e “No Coração de Shirley”, de Edyala Yglesias.Em 2003, “Hansen Bahia”, de Joel de Almeida, “Cega Seca”, de Sofia Federico e “Corneteiro Lopes” (Lázaro Faria).Em, 2004, mais dois longa metragens; “Esses Moços” , de José Araripe Jr., e “Cascalho”, de Tuna Espinheira.

Até que em 2005 o cinema baiano chega a uma produção surpreendente; quatro curtas e quatro longas. Solange Lima (Araçá Azul) se firma como uma grande produtora, “Cidade Baixa”, de Sérgio Machado, ganha o prêmio de melhor filme do Festival do Rio, e no Festival de Brasília, “Eu me Lembro”, de Edgard Navarro, ganha sete candangos e confirma definitivamente que a terra de Walter da Silveira tem vocação para o cinema!Urge, agora, uma revisão crítica dessa produção; Para 2006, estão sendo produzidos os longas “Pau Brasil”, de Fernando Bélens, “Jardim das Folhas Sagradas”, de Pola Ribeiro, “Estranhos”, de Paulo Alcântara e “Revoada” de Zé Umberto.

O Prêmio Braskem de Cinema que já havia premiado em 2004 “O Anjo Daltônico”, de Fábio Rocha, em 2005 dá continuidade com “E Aí, Irmão”, de Pedro Léo Martins; Joel de Almeida vai rodar “Isto é Bom”; Nivalda Silva Costa “A Incrível História de Seu Mané”; Bernard Attal já começou a rodar um filme sobre Santa Luzia e eu continuo na captação para rodar “Avant Garde”. Chico Argueiro, Beto Magno, Xeno Veloso e o veterano Jorge Mello (JM), que formam o Expresso Baiano, e estão produzindo um Documentário sobre os 25 anos da UNEB.

Convoco todos os críticos, produtores culturais e amantes da sétima arte para avaliarem essa novíssima onda baiana - a retomada do povo de cinema da Bahia.

“Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor.”
VM FILMES

A NÃO RETOMADA DO CINEMA BAIANO

VERDADEIROS HEROIS DA RESISTENÊNCIA


Por Patrick Brock
overblog.

Pra quem não conhece a história do cinema baiano, pode parecer que a produção local está vivendo tempos de gloriosa retomada tardia, com o sucesso de Cidade Baixa e Eu me lembro.

Mas se a questão for bem analisada, percebe-se que é parte de um processo contínuo de evolução, de ciclos que se abrem e fecham."Retomada é um termo que sugere continuação de algo que foi interrompido. Em relação ao cinema nacional cabe, mas em relação à produção baiana não", explica Sandro Santana, mestrando em Comunicação e Sociedade pela UFBA.

Convoquei o cara que sabia tudo dos filmes de John Ford, atento para a história coletiva dos esforços cinematográficos destas paradas. Sem mitificação."Na Bahia tivemos um período, entre os anos de 1958 e 1962, onde floresceu a atividade cinematográfica.

No entanto, foi fruto da inventividade de Roberto Pires, da capacidade de Glauber Rocha enquanto agente catalisador, da agitação cultural que vivia a Bahia naqueles anos e dos terrenos e propriedades que Rex Schindler vendeu para bancar as produções sem nunca ter retorno financeiro.

Com o fracasso financeiro dos filmes e a ida de Glauber e Roberto Pires para o Rio o 'Ciclo' baiano acabou", explica. Depois da esparsa produção nos anos 70 e 80, o cinema baiano só voltou ao cartaz com 3 histórias da Bahia, na década de 90.Sandro acredita que a Bahia ainda está tentando formar cineastas, e que a emergência de um cinema baiano segue distante.

Concordo com ele nesse ponto, mas penso que precisamos ser mais condescendentes com a parada, vamos jogar fermento, não precisa o bolo solar todo mas se com sabor."O caso de um Edgard Navarro é bastante elucidativo.

Após uma carreira de décadas, para fazer o seu primeiro filme teve que vencer um edital do governo do Estado, conseguir mais verbas para a finalização junto ao Ministério da Cultura e ainda que o filme tenha recebido os principais prêmios no Festival de Brasília, dificilmente irá se pagar e, o pior, ainda enfrentará grandes dificuldades para chegar às telas, como qualquer outro filme brasileiro que não esteja atrelado à Globo Filmes e produtoras que estão vinculadas as distribuidoras americanas".
O produtor cultural tem um olhar crítico sobre a política cultural de fomento ao cinema, considerando que é preciso a formação de uma economia de mercado nacional voltada para a produção de cinema que envolva o sucesso comercial de tais empreitadas - o famoso "fazer um filme que se pague com bilheteira". Quem impulsiona a retomada atual em nível nacional, considera, são produtoras publicitárias competitivas que trabalham com isenção fiscal e apoio de grandes empresas. "Para se falar em um cinema baiano precisamos pensar em estratégias dedistribuição e exibição que não se restrinjam a um dia de sonho". Ok. No final, me lembra que apenas 8% dos baianos têm condições financeiras de ir ao cinema.

Então temos uma pilha encruada de falta de público pagante, mercado publicitário incipiente, quase derruba o vivente que tenta escalar a parada e chegar lá no alto, pra divisar o horizonte. Decidimos pelo assalto a banco ou a produção inteiramente independente, e vamos ruminar com uma cerveja a vontade de produzir um longa metragem no estilo de No tempo das diligências.

sábado, 6 de junho de 2009

TUNA ESPINHEIRA: UM BRAVO GUERREIRO DO CINEMA BAIANO


André Setaro

O problema do cinema brasileiro, entre outros, encontra-se no tripé produção/distribuição/exibição. Se os realizadores sulinos encontram guarida nas salas dos complexos, porque formam, na produção, parceria com as multinacionais, os filmes baianos vivem, é preciso dizer, da caridade dos exibidores. Basta ressaltar que o premiado Eu me lembro, de Edgard Navarro, ainda que exibido em várias capitais, teve lançamento meio de escanteio. O exemplo de Cascalho, de Tuna Espinheira, é bem claro nesse sentido. Seu autor esteve recentemente em Feira de Santana a fim de apresentá-lo na universidade feirense e debatê-lo com um grupo de professores e intelectuais.

Noutros tempos, existia a Embrafilme que distribuia bem os filmes brasileiros, ainda que houvesse uma lei de obrigatoriedade. Collor, de uma canetada, fè-la desmorronar-se, a exemplo do Concine e da Fundação Cinema Brasileiro. Lembro-me que ia todas as semanas, quando tinha uma coluna diária no jornal baiano Tribuna da Bahia, ao escritório da Embrafilme comandado, aqui, por Nivaldo Mello Lima. Quase todos os lançamentos eram divulgados e muitos dos diretores e atrizes dos filmes vinham à Bahia prestigiá-los. Mas não quero me alongar muito neste post para dar lugar ao relato de bravo Tuna Espinheira, um lutador na aventura que é se fazer cinema na Bahia. Abrindo as necessárias e devidas aspas:

"Estive, neste 28 de maio, a convite dos professores da UEFS, Aleilton Fonseca e Francisco Lima, no Seminário de Literatura e Diversidade Cultural, para exibir e debater meu filme, CASCALHO, com professores e alunos da Pós-Graduação. As conversações, num ambiente descontraído, reforçaram a importância do dialogo franco entre o Diretor da obra e o público assistente, mesmo tendo sido com um grupo selecionado e de nível elevado. Só ter observado o interesse pelo cinema tupiniquim e os porquês dos motivos que trafegam de forma clandestina no mercado. ( Estou me referindo aqui aos filmes de baixo orçamento que não adotam o besterol, o voyerismo, a violência gratuita, e outros condimentos eleitos por aquelas fitas dirigidas a macacas(os) de auditórios).

Sou contra qualquer tipo de censura e intrépido defensor da diversidade. Os espetáculos tipo Trio Elétrico que arrasta todo mundo, sempre existiram e sempre existirão, o que preocupa é a proibição, mesmo velada, de filmes culturais que respeitam e tratam o público com seres de sensibilidade, vidas inteligentes.

Com todos os prós e contras, posso dizer, parafraseando Darcy Ribeiro, em licença poética, a EMBRAFILME caiu mais pelos seus acertos do que pelos seus erros. Um dos seus acertos que pode ser lembrado muito justamente como uma época de ouro do cinema brasileiro, foi a atuação da sua distribuidora, cujos benditos tentáculos atingiam o maior pedaço do continente brasileiro. Nesta época, a maioria dos filmes tinha acesso a uma finalização condigna, cartazes, traileres e, principalmente, oportunidade de adentrar no escurinho do cinema, seu habitat natural, através da rede de distribuição de filmes, (da EMBRAFILME) com a ajuda das suas subsidiarias, situadas em pontos estratégicos país afora.

O cinema brasileiro podia ter alguma respiração no tempo da Distribuidora da Embrafilme. É claro, cada macaco no seu galho, não estou falando de conquista de público, não se pode pegar espectadores a dente de cachorro, na vida, como no mercado, o filme vale quanto pesa. Mas a chance de baixar na luminosidade da tela grande, seja para qualquer número de pessoas que fossem frequentadoras dos cinemas já era uma glória. Filme sem público, na prateleira, por falta de uma política cultural que permanece omissa, é no mínimo um cadáver insepulto. É de arrepiar quando se sabe que as próprias associações de classe fazem ouvidos de mercador para este problema. Mais uma vez temos de fazer a diferença entre o cinema Daslú e o outro Daspú, este o de baixo orçamento. O chamado “Cinemão”, (DASLÚ), cujo jogo de cintura é grilar a parte do leão das famigeradas “Lei de Incentivo”, não está nem aí para o assunto distribuição, contam naturalmente com as distribuidoras estrangeiras. E assim caminha a humanidade.

Para não perder o mote deste texto que foi minha estada gratificante na UEFS, devo dizer que participar deste tipo de encontro é contribuir para que o filme (CASCALHO) permaneça vivo como merece. Adorei ter ido a Feira de Santana, terra do meu saudoso amigo/irmão, Olney São Paulo"

quinta-feira, 30 de abril de 2009

O CRÍTICO E GUERREIRO PROFETA DO INCONFORMISMO


Beto Magno

Relançado há três anos pela Cosacnaify em edição primorosa, mas que ainda se encontra para comprar nas boas livrarias do ramo, O século do cinema reúne os principais escritos de Glauber Rocha desde os seus primórdios no Jornal da Bahia e Diário de Notícias até as derradeiras criticas, quando ressuscita as letras mortas K, Y e W numa tentativa de provocação, e é o terceiro volume da Coleção Glauberiana lançada pela editora (os outros: A revolução do cinema novo, e Revisão crítica do cinema brasileiro). A primeira edição do livro se deu em 1983, editada pela Embrafilme/Alhambra, com introdução de Orlando Senna, mas destituída do material iconográfico, das notas de rodapé, que fazem parte da publicação da Cosacnaify, além do prefácio do ensaísta Ismaiel Xavier. Na fortuna crítica, textos de Orlando Senna [ Notas de apresentação da edição de 1983], José Carlos Avellar [Nem de deus nem do diabo], Pedro Karp Vasquez (Glauber vê o cinema), Rogério Sganzerla (O século do cinema em discussão), e Paulo Leminski (Câmera e idéias). O livro se encontra dividido em três grandes blocos: Hollywood, Neo-Realismo e Nouvelle Vague. É o pensamento glauberiano sobre o que deve ser o cinema que se encontra exposto nas suas páginas, partindo de uma contemplação mais amena dos filmes em seu período inicial para as diatribes de seu ocaso. Sempre, porém, procurando buscar nos filmes o rompimento com as estruturas mentais tradicionais e a renovação na sua forma de narrar, sem, contudo, desprezar os clássicos da indústria cinematográfica de Hollywood, apesar de lhe reconhecer um caráter imperialista e colonizador.

Os escritos de cinema dos grandes críticos do pretérito estão, desde a década passada, sendo reunidos em livros, porque, dada a efemeridade da crítica publicada em jornais, muitos textos importantes estavam desaparecidos nas poeira dos arquivos. Francisco Luiz de Almeida Salles, Paulo Emílio Salles Gomes, José Lino Grunewald, Antonio Moniz Vianna, entre outros, podem ser lidos nas antologias de suas críticas. Mas, surpreendentemente, os ensaios de Walter da Silveira, o único verdadeiro ensaísta de cinema surgido na Bahia, apesar de reunidos para publicação, em pesquisa exaustiva, sofrem sistemáticos boicotes para vir à luz, e Walter da Silveira, vale ressaltar, foi o mestre confesso de Glauber Rocha, conforme ele mesmo declarou em vários artigos e em um, especialmente, quando da sua morte ocorrida em novembro de 1970.
As críticas de Glauber Rocha estão atreladas, em sua maioria, à constituição de um cinema engajado, que registre a problemática do homem contemporâneo, que desmistifique os falsos mitos e o maniqueísmo, instaurando a ambiguidade do ser numa relação dialética com a História. A preocupação essencial de seus textos é refletir sobre aqueles grandes cineastas que, além de radiografar o seu tempo, também proporcionaram um avanço nas estruturas da linguagem cinematográfica, como Serguei Eisenstein, Jean-Luc Godard, Luchino Visconti, Orson Welles, Jean Renoir, entre tantos outros. Em alguns casos, era capaz de elogiar um filme por questão política, como a crítica benevolente que fez a Bahia de Todos os Santos, de Trigueirinho Neto, porque via, neste filme, um impulso importante como semente para o estabelecimento de um cinema genuinamente baiano, ainda que a obra de Trigueirinho esteja eivada em graves desequilibrios estruturais.

Por outro lado, não vendo em Federico Fellini um cineasta empenhado em renovar o mundo, condena o seu escapismo, o seu circo, como fez em artigo sobre A doce vida (La dolce vita), chegando, inclusive, a dizer que não conseguiu vê-lo até o seu final. Um radicalismo - que não se concorda aqui, pois A doce vida é um monumento da arte do filme - que se propõe como necessario não somente para mudar a mentalidade retrógrada, mas, e principalmente, rearranjar o cinema. Seu projeto de um Cinema Novo justificava os excessos de julgamento, e um novo cinema não somente para o Brasil, mas em função de um imaginário criativo através das imagens em movimento nas nações subdesenvolvidas e principalmente latinoamericanas (o texto de A estética da fome é singular nesse sentido). Conteúdo revolucionário exigia também uma forma revolucionária.

A crítica praticada nos anos 50, exceção se faça a Walter da Silveira, e alguns luminares do eixo Rio-São Paulo, era uma crítica que se restringia ao cinema hollywoodiano. O advento de Glauber Rocha nas páginas do Jornal da Bahia mudou o panorama crítico da província, com um enfoque mais centrado no cinema brasileiro (e no baiano que surgia) e nas obras dos grandes mestres, que eram mostradas pelo Clube de Cinema da Bahia. Glauber, no entanto, não desdenhava dos nomes do cinema americano, principalmente John Ford e o gênero western, o cinema americano por excelência na sábia definição de André Bazin. A bem da verdade, alguns cineastas dos Estados Unidos, como Robert Aldrich, Nicholas Ray, Robert Wise, Samuel Fuller, Richard Brooks etc, foram responsáveis pela renovação da linguagem cinematográfica que iria se radicalizar com a emergência de Jean-Luc Godard e Alain Resnais.
Mas Glauber, como se pode ler em O século do cinema, não estava indiferente ao que acontecia na indústria de Hollywood, acompanhando todos os lançamentos, verificando a evolução de certos realizadores (o artigo sobre William Wyler é exemplar). Para revolucionar o cinema, como Glauber Rocha o revolucionou em Deus e o diabo na terra do sol e Terra em transe, era preciso conhecer em profundidade a estrutura narrativa clássica. O bloco dedicado a Hollywood é uma prova do conhecimento do crítico de seus nomes significativos, desde David Wark Griffith, o pai da narrativa fílmica, até mesmo um Vincente Minnelli.

Sobre este estilista, Glauber foi um dos poucos críticos de sua época que lhe soube ver os inegáveis atributos. Minnelli, o cineasta que revolucionou o filmusical (A roda da fortuna, O pirata...), também se notabilizou por ser um realizador de dramas ásperos e imensos (Deus sabe quanto amei, Assim estava escrito, A cidade dos desiludidos...), além de comédias perfuratrizes do american way of life. Assim Glauber vê uma delas, Chá e simpatia: (...) "Chá e simpatia por isso é um filme de triunfos: vitória da ternura e elevação da mulher sobre os homens de musculatura e fala grossa; a seqüência na qual Deborah Kerr se entrega ao jovem Tom Lee é o selo dessa dignificação feminina: é a revelação de uma potencialidade de amor inato na mulher sem respeito geográfico, político ou moral; por isso, Chá e simpatia não é apenas um filme bonito, sensibilizante, mas um filme de imensas profundezas: a revelação sobretudo de um poeta agudamente participante como Robert Anderson."

O século do cinema ajuda a compreender o fenômeno estético glauberiano a partir de suas preferências. Brando a princípio, seu nível de exigência cresce com o livro e não é difícil verificar, em suas obras cinematográficas, as influências contagiantes de seus diretores mais aclamados. Em Deus e o diabo na terra do sol, para muitos sua obra-prima, mas esta se encontra também em Terra em transe(o maior filme brasileiro de todos os tempos, ultrapassando, inclusive, Limite, de Mário Peixoto), há, nítidas, as marcas de um John Ford (no enquadramento dos grandes espaços ou em seqüências como a da morte do fazendeiro na feira e o consequente massacre da casa de Manuel, o vaqueiro), Eisenstein (a matança dos beatos em Monte Santo calcada na Escadaria de Odessa de O encouraçado Potemkin), Akira Kurosawa (os rodopios do cangaceiro Corisco), a tragédia grega (o cego Júlio como fio condutor da narrativa) e, em Terra em transe, Orson Welles (a biografia de um aventureiro), Alain Resnais (a memória pulsante na agonia final de Paulo Martins/Jardel Filho). Um amálgama que não diversifica mas une um estilo, o estilo glauberiano.
Na crítica de Rastros de ódio (The seachers), de John Ford, nota, no prefácio, Ismail Xavier: "A fórmula aí é curiosa, e nos lembra a pergunta de Godard - "imperialismo ou mise-en-scène? " - diante da cena decisiva de Rastros de ódio em que se dá a inversão na postura do Tio Etham (John Wayne). Perto do final do filme, ele ergue de modo paternal a jovem sobrinha, repetindo o gesto de reencontro feito quando ela era criança; o lance é dramático porque ele parece estar na iminência de matá-la por não aceitar de volta a moça que procurou durante anos para encontrá-la transformada em "índia". Neste e em outros momentos, Rastros de ódio faz, da tensão e da violência, um caminhopara a poesia. Não é difícil ver na composição do personagem de Ethan uma consciência trágica muito cara a Glauber, pois estão lá nos seus próprios filmes estas figuras de não-reconciliação que entendem estar elas mesmas contaminadas por aquilo que combatem, vivendo como sombras amarguradas sem futuro, condenadas a não ter lugar no mundo melhor que julgam preparar (como no caso de Antônio das Mortes)."

Num momento em que a crítica cinematográfica impressa se encontra cada vez mais rarefeita, quase desaparecida, com exceção de poucos, pouquíssimos nomes (Inácio Araújo, Luiz Carlos Merten...), e o cinema se tornou um objeto nos papers acadêmicos, que colocam a emoção excludente de qualquer tentativa de análise, ler os escritos glauberianos traz de volta o prazer da leitura de textos inflamantes nos quais a teoria se aliava à praxis, uma exortação para uma tomada de consciência do poder da arte cinematográfica no sentido de mudar as mentalidades e mudar o mundo, que, viu-se depois, com a derrocada do status político do cinema, não passava, na verdade, de uma grande utopia. Mas, sem a utopia, não vive a arte, não vive o cinema. O século do cinema representa um momento de efervescência criadora da crítica cinematográfia, que refletia o seu tempo, o seu aqui e agora.

sábado, 25 de abril de 2009

O NOVO LONGA DE EDGAR NAVARRO

EDGARD NAVARRO E JORGE MELLO (JM)


Por: Carlos Helí de Almeida

Edgar Navarro já estava quase desistindo de procurar pelo ator ideal para fazer um personagem-chave da trama de O homem que não dormia, que o diretor está rodando na Chapada Diamantina, em Minas Gerais, quando topou com Luiz Paulino durante a Jornada de Cinema da Bahia do ano passado. Figura mítica do cinema nacional, Paulino foi substituído por Glauber Rocha (1939-1981) na direção de Barravento (1962), dirigiu curtas e médias seminais do cinema novo antes de abandonar o cinema e virar líder místico de uma comunidade no Sul de Minas. Navarro encontrara o peregrino sem nome que mexe com os destinos dos moradores do vilarejo fictício de sua história.

– Foi um achado. O peregrino era uma peça superimportante do quebra-cabeças e o Luiz Paulino surge diante de mim com aquela barba longa e um passado cheio de mistério. Ele não poderia ter aparecido em momento mais oportuno – conta Navarro, durante um dos intervalos das filmagens, na cidade de Igatu, no interior da Bahia. – No início da vida, o Luiz Paulino foi entregador de cartas, um andarilho. É uma das muitas coincidências com o personagem.

Os bastidores de O homem que não dormia é ilustrado por outros reencontros memoráveis. Bertrand Duarte, que interpretou o louco de rua de impulsos quixotescos de SuperOutro (1988), premiado média-metragem que projetou o nome de Navarro no fim daquela década, interpreta padre Lucas, o protagonista, um dos cinco moradores do povoado assombrado pelo mesmo pesadelo. A ficha técnica do novo filme também ostenta o nome do diretor de fotografia Hamilton Oliveira, que trabalhou com Navarro no também premiado Eu me lembro (2005), o primeiro (e tardio) longa-metragem do diretor de 59 anos.

– Estamos filmando tudo em película 16mm, em tela larga. O visual do filme é inspirado na pintura de Caravaggio (1571-1610), que buscava o equilíbrio entre o claro e o escuro – avisa o diretor.

Ligação íntima
Nostálgico e irreverente, Eu me lembro foi a grande surpresa do Festival de Brasília de 2005, de onde saiu com os principais prêmios, inclusive os de Direção e Filme. O enredo cruza as memórias afetivas de um jovem que adolesceu entre o fim dos anos 60 e o início dos 70 e a história do país naquele período. O protagonista é uma espécie de alter ego do diretor. O homem que não dormia toma caminhos narrativos e estéticos "completamente diferentes", embora esteja mantenha uma ligação íntima com o filme anterior.

– Eu me lembro fala de uma memória coletiva, a partir de uma particular, a minha. Já O homem que não dormia é sobre a memória de vidas passadas, que é uma espécie de memória cármica. Inventei um barão que viveu no século 19 para a história e me projeto nele. Tenho a impressão de que estou sempre falando de mim mesmo – admite Navarro, que deixou a barba crescer para viver um personagem menor na história.

O enredo do novo filme combina elementos folclóricos e religiosos. O sonho que tira o sossego dos personagens é inspirado na lenda, que ganha variações dependendo do estado brasileiro, do homem que enterrou um tesouro e, ao morrer, seu espírito passa a visitar o sono de outros para inspirá-los a encontrar a fortuna e assim libertá-lo do pecado. Além do padre Lucas, sofrem com as visões o louco da cidade, uma vítima da repressão militar, que ainda apresenta sequelas, e a mulher do coronel que controla o vilarejo.

– Quero falar de um tesouro que não é material. Essas cinco pessoas estão vivendo uma crise muito grande, estão no limite da suas existências, quando não são totalmente surtadas, são neuróticas demais– explica Navarro. – A ideia de desenterrar o tesouro vai determinar uma virada na vida delas. Representará uma espécie de luz na vida, uma mudança de rumo, uma revelação O tesouro é uma metáfora da libertação dos medos, da hipocrisia que vivemos.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

EDGAR NAVARRO


TEXTO DE EDGAR NAVARRO

Para o Jornal A Tarde



“Estou há quase 2 semanas de trabalho com dias muito proveitosos, dando conta de um cronograma que estava bem apertado e até avançando em relação a este.
Temia que tivéssemos problemas climáticos, pois nesta época pode chover muito, mas estamos com sorte, o elenco está muito afinado, todo mundo numa relação de muita boa vontade, gostando de participarem deste filme e isso é parte do caminho pra fazermos coisas bem feitas. Temos um enorme revezamento de atores, indo e vindo de Salvador, intercalando suas cenas.
Gente como Bertrand Duarte, Fernando Neves, Evelyng Buchegger, Ramon Vane - um ator de Itabuna que estava há muito fora do circuito - e Luiz Paulíno dos Santos, uma lenda do cinema brasileiro, que trabalhou com Glauber Rocha no início do ciclo baiano, tem 78 anos e é praticamente o nosso padrinho, pois nos inspira muito com a sua energia e traz uma espécia de benção e dádiva ao filme. Estava agoniado, achando que iria sofrer com as mudanças e adaptações dos roteiros e produções aos meus sets de filmagens, coisa quase sempre comum.

Mas desta vez tudo está fluindo de um modo que estou me surpreendendo, me sinto muito feliz dentro e fora do set e, pela 1a vez estou tendo total real prazer em estar neste, pois as coisas estão bem organizadas – o que me deixa confiante de que tudo vai dar certo. Mesmo cansado ao final de cada dia, como hoje, que tivemos sequências difíceis de rodar, me sinto feliz!Me diverti muito esta semana com Psit Mota, um ator que acompanhei quando ainda trabalhava com Bira Freitas, no premiado espetáculo O Deus Danado. Ele é um ator muito versátil, que faz comédia, mas também sabe nos emocionar muito. O personagem dele é o “boca do inferno”, é quem traz à tona aquilo que ninguém diz, que é desbocado, coloca o dedo na ferida de certas coisas, fala do campo minado, do submundo humano, das paixões, do mundo das taras, do sexo, da vida comezinha da cidade pequena onde correm os boatos, em que um é corno e o outro é puta.

Ele é o contraponto com o divino – uma das vertentes do filme -, pra não fugir à regra universal do bem e do mal, embora, sem ser maniqueísta, vejo o bem e o mal como vejo a sombra e a luz, como o dia e a noite, como as batidas do meu coração, como a sístole e a diástole, como tudo o que pulsa no universo.
Ele engloba o núcleo ordinário, do comezinho, daquilo que ninguém revela nem quer ouvir ou ver, mas que faz parte da vida. Seu personagem, o Pereba, é a coluna social da cidade, a rádio-peão que diz quem está comendo quem, quem está fazendo o quê, tudo de uma forma sórdida e mesquinha, mas sempre muito bem humorada. Me divirto com este núcleo porque vejo ali a miniatura da sociedade humana hipócrita. Tenho a pretensão de fazer dele o fragmento de uma biópsia que se faz da humanidade. Tem tudo ali: vejo a ternura e a sacanagem, o sublime e o sórdido. Como relatei anteriormente, acho que desta vez as coisas estão bem mais organizadas e planejadas, tivemos um trabalho de pré-produção mais longo, o orçamento do filme em relação ao número de sequências é um pouco mais confortável, embora não tenhamos grana a mais pra fazer outras coisas, mas, do aspecto da produção de grandes orçamentos, não pretendia fazer grandes voos.
Vejo no nosso país uma grande injustiça social e isso me faz refletir sobre o acinte que é fazer filmes com orçamentos muito altos, num mercado de lucro cinematográfico que não existe.Acredito que o filme irá responder como obra de arte, trazendo um retorno cultural, ressonando no espírito das pessoas. Se não der bilheteria, ao menos isto, esta conquista no humano, este fime vai ter.
Com o orçamento adequado ao planejamento ficou nítida a competente administração da Truque, nas pessoas da Sylvia de Abreu e Taissa Grisi.
Estas é a maior razão do meu conforto para produzir agora. Um outro aspecto que não posso esquecer é a qualidade de toda a equipe técnica, que está dando conta do recado, os chefes das equipes com muita garra e boa vontade, tudo indo muito a favor.
O que mais me marcou aqui estes dias foi a aparição de André Luis Oliveira, diretor de Meteorango Kid.
Foi enorme a felicidade e surpresa de tê-lo no set, em Ibiquera, durante as filmagens no casarão do barão. Ele veio com o produtor Péricles Palmeiras e tudo isso gerou um encontro bacana! Há 30 anos que André Luis não encontrava Luiz Paulíno e isso foi um marco! André agora está produzindo um documentário para o Canal Brasil sobre o meu trabalho, onde cada cineasta faz um filme sobre outro cineasta. Me senti lisonjeado por ele ter me escolhido porque André é um irmão para mim, uma pessoa com a qual me identifico muito.
A presença do ator Luiz Paulíno é mágica dentro do filme, me traz uma paz muito grande, pois ele é uma pessoa especial, muito mais bonita do que a maioria de nós. Embora com a minha idade e experiência, Paulíno me faz sentir um aprendiz no meio deste processo todo.”

quarta-feira, 25 de março de 2009

O CINEMA COMO ESPETÁCULO DE UMA ELITE

RADA REZEDÁ, VITÓRIA MAGNO, BETO MAGNO E TÁBITA CHANANDA


Por André Setaro

Sim, uma ida ao cinema atualmente significa um gasto considerável, que fura o orçamento do classe média, que está pagando a conta das bolsas familiares A verdade é que, depois do Plano Real, a economia se dolarizou, os preços subiram muito e os salários, congelados em freezer potente. Um casal para ir ao Multiplex gasta, de saída, 34 reais, considerando que o ingresso custa 17. Se quiser se empipocar, como é de praxe, mais uma grana – e os complexos de cinema cobram muito mais nas guloseimas compradas dentro deles. Mas, uma ida a seco, e de ônibus, adicione-se aos 34 dos ingressos, os 9,20 das passagens (2,40 reais por cabeça). O resultado assinala que um filme custa 43,20 reais. Muito caro. E o povo, e o povo, como é que pode ir ao cinema? Já que não mais existem os chamados cinemas de rua nem os de bairros?

Se formos fazer uma comparação entre o número de salas exibidoras que Salvador tinha em 1958 e o que tem atualmente, a conclusão é uma só: os cinemas estão fechando suas portas. Com uma população de, mais ou menos, quinhentos mil habitantes, em 1958, a província possuía em torno de quase trinta salas, considerando, no cômputo final, as de primeira linha, os poeiras da Baixa dos Sapateiros, e os cinemas de bairro. Para arredondar o raciocino, que se coloque trinta salas em 1958 para quinhentos mil habitantes, sendo que cada uma delas tinha, em média, mil poltronas, variando entre as salas maiores, de quase duas mil cadeiras, como o Guarany e o Jandaia, e as menores, que beiravam a mil lugares. Para não haver crescimento das salas exibidoras, e considerando, sempre, a densidade demográfica, nos dias que correm – e como correm!, com uma população de dois milhões e quinhentos mil habitantes – e, aqui, nivelando por baixo, Salvador deveria ter, no mínimo, cento e cinqüenta salas, pois a sua população, entre 1958 e 2009, aumentou cinco vezes. O cálculo é simples. Multiplicam-se as trinta salas do passado por 5 e se tem o número de cinemas que a cidade deveria ter e, repetindo-se, sem haver crescimento
Mas atualmente o que se tem é um máximo de trinta e cinco salas e cada uma com um máximo de 400 lugares, a maior parte se localizando nos complexos chamados Multiplex.

Então que se faça uma nova contagem, considerando que cada cinema, em 1958, tinha em média mil lugares e, hoje, trezentos. Trinta vezes mil, em 1958, é igual a trinta mil. Que se coloque, para ficar bem claro, em números inteiros: tinha-se, na província, nesta época, 30.000 lugares e, se o número for multiplicado por cinco, porque a população cresceu cinco vezes, tem-se o número redondo de 150.000. Este, o número que, para não se constatar crescimento, mas, apenas, manutenção, deveria a cidade possuir em número de lugares. Mas o que se tem atualmente? Com a média de 400 lugares e 35 salas, fazendo-se a multiplicação, o resultado é de 14.000 lugares. Que diferença brutal!

Se antigamente o povo ia muito ao cinema, hoje, como disse Gustavo Dahl no seminário internacional de cinema e audiovisual, não tem acesso a ele. O cinema, que era um meio de comunicação de massa, atualmente é um veículo cujo acesso somente é possível à elite. Antes, existiam os cinemas de primeira linha, lançadores, que ficavam concentrados no centro histórico, os poeiras da Baixa dos Sapateiros e os de bairro.
Luiz Carlos Barreto, que conhece muito bem a mercadologia cinematográfica, afirmou, em entrevista no Canal Brasil, que o ingresso custava em torno de um dólar e, nos cinemas de segunda, cinqüenta centavos. É como se hoje o ingresso para entrar numa das salas do Multiplex custasse dois reais e cinqüenta centavos, a inteira, a inteira! Mas quanto custa realmente? Em torno de 17 reais. Como uma pessoa que ganha a miséria do salário mínimo pode freqüentar as salas de exibição? Ir com a família ao cinema? Nem pensar.

O Plano Real dolarizou a economia de uma forma perversa. O povo está excluído do cinema, assim como a chamada classe média baixa. A conclusão é estarrecedora e reveladora: apenas dez por cento da população baiana pode ir ao cinema, sendo que dois milhões e tanto de pessoas estão completamente fora da rota cinematográfica. Constatou-se, em pesquisa recente, que a maioria dos baianos nunca foi ao cinema. Um grupo organizou uma sessão cinematográfica num bairro periférico e o que se viu foi espantoso. As pessoas ficaram maravilhadas pelas imagens em movimento, pois estavam a contempla-las pela primeira vez. E isto aconteceu na região metropolitana de Salvador!

Na década de 50, o Brasil tinha perto de dez mil salas exibidoras. Em 1975, já se contavam apenas cinco mil. No ano passado, chegou a mil e novecentos. Os cinemas interioranos fecharam suas portas. Assim como aqueles de rua, como os antigos e inesquecíveis da Baixa dos Sapateiros e os de bairro. O que se constata é que os cinemas estão sendo construídos para o usufruto de uma elite que pode pagar os 17 reais de ingresso, ainda a se refestelar com as guloseimas caríssimas que lhe são oferecidas no fast food. O público se infantilizou e se idiotizou.
Ir ao cinema, antes um ritual, uma solenidade, uma função, atualmente é comparável a uma ida ao fast food.E ainda se tem que aguentar o comportamento selvagem da platéia, verdadeiros vândalos que podem ser comparados a débeis mentais.
Triste país!

segunda-feira, 16 de março de 2009

NECESSIDADE DE BERGMAN

INGMAR BERGMAN


Por André Setaro

Ingmar Bergman, quando, em 1982, realizou Fanny e Alexander (Fanny och Alexander) tinha em mente ser este o seu último filme, pretendendo, após o seu término, aposentar-se ou, no máximo, escrever alguns roteiros ou dirigir peças no proscênio de Estocolmo. Apesar de ainda forte e com disposição, com 64 anos, não cumpriu o prometido, ainda que um filme que lhe é posterior, Depois do ensaio, tenha sido exibido nos cinemas do mundo inteiro, mas, na verdade, foi feito apenas para a televisão. Mas, há poucos anos, já velho, dirigiu um outro filme.

O fato é que o que seria o derradeiro opus bergmaniano, a considerar Fanny och Alexander, é uma obra-prima, uma síntese perfeita de sua obra, uma película deslumbrante, valendo, aqui, a adjetivação. Visto no Art 2, em 1984, Fanny e Alexander desapareceu das salas exibidoras e foi se esconder numa fita magnética distribuída pela Breno Rossi, que é um verdadeiro atentado à integridade da obra bergmaniana, pois pessimamente telecinada. Mas, agora, com o DVD distribuído pela Europa (distribuidora não muito confiável, pois matou Menina de ouro com a abominável tela cheia, mas que, aqui, respeita Bergman e sua luz pontecostal), os admiradores de Bergman têm a oportunidade de, vinte e sete anos depois, rever o filme na sua inteireza original em cópia luminosa. A fotografia é de um artista: Sven Nykvist. Um fecho de ouro para um dos maiores cineastas-pensadores do século passado.

Originariamente feito como minissérie para a televisão sueca, Fanny e Alexander, devido ao grande êxito, despertou em Bergman a vontade de montar uma versão para cinema e, com isso, declarou que este seria a sua despedida do cinema. Na telinha, o filme tem mais de cinco horas, dividido em episódios. Olhando aqui a capa do DVD, vejo que o disco tem 175 minutos, quase, portanto, três horas.
A montagem foi feita pelo próprio Bergman tendo em vista uma continuidade dramática eficaz e a preocupação de tapar os buracos por causa da duração televisiva. Nada a comparar com o estilhaçamento feito por Guel Arraes em Auto da Compadecida, que, na versão para o cinema, não deixou espaço, nos cortes, para o espectador contemplar, pois rápidos, movidos por uma compulsão de videoclip, no embalo da estética da tesourinha.

É impressionante a reconstituição da época – a ação se passa em 1907, como também a perfeição dos intérpretes, todos afinados, todos perfeitos, todos dotados daquele necessário – e sem o qual o filme não funcionaria – poder da verdade. Bergman se utiliza do enquadramento como fonte de reflexão, não se importando com o corte em movimento. O que importa é, por assim dizer, uma substancialização do que está sendo dito e do que está sendo mostrado e nunca uma adjetivação da obra como sintaxe, ainda que esta exista nas transições.
A grande casa aonde se festeja o Natal, sequência primorosa e que leva uma hora, como fizera Visconti com a seqüência do baile em O leopardo, faz lembrar, talvez pela acentuação da cor vermelha, Gritos e sussurros.Esta desvinculação do discurso cinematográfico no qual a sintaxe adquire um status mais nobre – Persona, A hora do lobo, etc – em função de uma narrativa dentro de uma linha dramática mais convencional – o que não quer dizer nada nem diminui o mérito dessa obra de arte – revela o Bergman da maturidade, do ocaso, da despedida, fazendo de Fanny e Alexander o seu canto de cisne. Cineasta que encantou o século XX, introduzindo, inclusive, em Morangos silvestres, o monólogo interior, Bergman é um mestre supremo cuja falta nestes bicudos tempos e nesta fajuta contemporaneidade é imensa. Falta, no cinema, um homem de seu gênio, atualmente, para pensar o homem contemporâneo.

terça-feira, 10 de março de 2009

BREVE HISTÓRICO DO CINEMA BRASILEIRO


por Beto Magno
VM FILMES

Caso alguém pergunte, num futuro distante, qual terá sido o meio de expressão de maior impacto da era moderna, a resposta será quase unânime: o cinematógrafo. Inventado em 1895 pelos irmãos Lumière para fins científicos, o cinema revelou-se peça fundamental do imaginário coletivo do século XX, seja como fonte de entretenimento ou de divulgação cultural de todos os povos do globo. Desde cedo, o cinematógrafo aporta no Brasil com Affonso Segretto. Segretto, imigrante italiano que filmou cenas do porto do Rio de Janeiro, torna-se nosso primeiro cineasta em 1898.
Um imenso mercado de entretenimento é montado em torno da capital federal no início do século XX, quando centenas de pequenos filmes são produzidos e exibidos para platéias urbanas que, em franco crescimento, demandam lazer e diversão. Nos anos 30, inicia-se a era do cinema falado. Já então, o pioneiro cinema nacional concorre com o forte esquema de distribuição norte-americano, numa disputa que se estende até os nossos dias. Dessa época, destacam-se o mineiro Humberto Mauro, autor de “Ganga Bruta” (1933) - filme que mostra uma crescente sofisticação da linguagem cinematográfica – e as “chanchadas” (comédias musicais com populares cantores do rádio e atrizes do teatro de revista) do estúdio Cinédia. Filmes como “Alô, Alô Brasil” (1935) e “Alô, Alô Carnaval” (1936) caem no gosto popular e revelam mitos do cinema brasileiro, como a cantora Carmen Miranda (símbolo da brejeirice brasileira que, curiosamente, nasceu em Portugal).

A criação do estúdio Vera Cruz, no final da década de 40, representa o desejo de diretores que, influenciados pelo requinte das produções estrangeiras, procuravam realizar um tipo de cinema mais sofisticado. Mesmo que o estúdio tenha falido já em 1954, conhece momentos de glória, quando o filme “O Cangaceiro” (1953), de Lima Barreto, ganha o prêmio de “melhor filme de aventura” no Festival de Cannes. A reação ao cinema da Vera Cruz representa o movimento que divulga o cinema nacional conhecido para o mundo inteiro: o Cinema Novo. No início da década de 60, um grupo de jovens cineastas começa a realizar uma série de filmes imbuídos de forte temática social.
Entre eles está Gláuber Rocha, cineasta baiano e símbolo do Cinema Novo.
Diretor de filmes como “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964) e “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro” (1968), Rocha torna-se uma figura conhecida no meio cultural brasileiro, redigindo manifestos e artigos na imprensa, rejeitando o cinema popular das chanchadas e defendendo uma arte revolucionária que promovesse verdadeira transformação social e política.

Inspirados por Nelson Pereira dos Santos (que, já em 1955, dirigira “Rio, 40 Graus” sob influência do movimento neo-realista, e que realizaria o clássico “Vidas Secas” em 1964) e pela Nouvelle Vague francesa, diretores como Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade e Ruy Guerra participam dos mais prestigiados festivais de cinema do mundo, ganhando notoriedade e admiração. As décadas seguintes revelam-se a época de ouro do cinema brasileiro. Mesmo após o golpe militar de 1964, que instala o regime autoritário no Brasil, os realizadores do Cinema Novo e uma nova geração de cineastas – conhecida como o “údigrudi”, termo irônico derivado do “underground” norte-americano – continuam a fazer obras críticas da realidade, ainda que usando metáforas para burlar a censura dos governos militares. Dessa época, destacam-se o próprio Gláuber Rocha, com “Terra em Transe” (1968), Rogério Sganzerla, diretor de “O Bandido da Luz Vermelha” (1968) e Júlio Bressane, este dono de um estilo personalíssimo. Ao mesmo tempo, o público reencontra-se com o cinema, com o sucesso das comédias leves conhecidas como “pornochanchadas”.
A fim de organizar o mercado cinematográfico e angariar simpatia para o regime, o governo Geisel cria, em 1974, a estatal Embrafilme, que teria papel preponderante no cinema brasileiro até sua extinção em 1990. Dessa época datam alguns dos maiores sucessos de público e crítica da produção nacional, como “Dona Flor e Seus Dois Maridos” (1976), de Bruno Barreto e “Pixote, a Lei do Mais Fraco” (1980), de Hector Babenco, levando milhões de brasileiros ao cinema com comédias leves ou filmes de temática política. O fim do regime militar e da censura, em 1985, aumenta a liberdade de expressão e indica novos caminhos para o cinema brasileiro. Essa perspectiva, no entanto, é interrompida com o fim da Embrafilme, em 1990. O governo Collor segue políticas neoliberais de extinção de empresas estatais e abre o mercado de forma descontrolada aos filmes estrangeiros, norte-americanos em quase sua totalidade.
A produção nacional, dependente da Embrafilme, entra em colapso, e pouquíssimos longas-metragens nacionais são realizados e exibidos nos anos seguintes.
Após o cataclisma do início dos anos 90, o sistema se reergue gradualmente. A criação de novos mecanismos financiamento da produção por meio de renúncia fiscal (Leis de Incentivo), juntamente com o surgimento de novas instâncias governamentais de apoio ao cinema, auxilia a reorganizar a produção e proporciona instrumentos para que realizadores possam competir, mesmo de modo desigual, com as produções milionárias das majors norte-americanas. Esse período é conhecida como a “Retomada” do cinema brasileiro. Em pouco tempo, três filmes são indicados ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro: “O Quatrilho” (1995), “O Que é Isso, Companheiro” (1997) e “Central do Brasil” (1998), também vencedor do Urso de Ouro do Festival de Berlim. Nomes como Walter Salles, diretor de “Terra Estrangeira” (1993) e “Central do Brasil” e Carla Camuratti, diretora de “Carlota Joaquina, Princesa do Brazil” (1995) tornam-se nomes conhecidos do grande público, atraindo milhões de espectadores para as salas de exibição. Cem anos após os irmãos Lumière, o cinema brasileiro reivindica seu papel na história da maior arte do século XX para apresentar sua contribuição para o futuro.

sábado, 24 de janeiro de 2009

"GLAUBER, UM A REVOLUÇÃO BAIANA" ANTECIPA AS COMEMORAÇÕES DOS 70 ANOS DE NASCIMENTO DO CINEASTA, EM 2009

QUADRO DE ROMEU FERREIRA (UESB)

Em 14 de março de 2009, o cineasta baiano Glauber Rocha completaria 70 anos. Para comemorar a data, um ano antes, a Associação dos Amigos do Tempo Glauber, em parceria com a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, promove a exposição multimídia “Glauber, Uma Revolução Baiana”, de 12 a 24 de março no Teatro Castro Alves. Através dela, o público terá oportunidade de conhecer um pouco mais sobre a vida e a obra de um de seus filhos mais diletos.

No foyer do teatro será montada uma exposição com cerca de 100 metros quadrados em painéis, contendo fotografias, cartazes, manuscritos e textos que recriam a trajetória do artista desde o seu nascimento. Cinco TVs de plasmas exibirão curtas-metragens, documentários especialmente produzidos, a partir de trechos de entrevistas de Glauber e depoimentos das equipes e do elenco de seus filmes, além do lendário programa Abertura, exibido na extinta TV Tupi. Totens darão acesso ao conteúdo “off-line” do portal http://www.tempoglauber.com.br/ e do banco de dados do acervo do Tempo Glauber com cerca de 10 mil documentos. Além disso, haverá debates e a mostra “Cinema da Terra” com exibição de oito filmes em tela grande – sendo cinco do cineasta - na SALA DE ARTE/MAM. Dentre os destaques serão exibidos pela primeira vez no Brasil os filmes restaurados “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro” (1968) e “Barravento” (1960) e, em Salvador, os documentários “Anabazys” de Paloma Rocha e Joel Pizzini e “Diário de Sintra”, de Paula Gaitán.

Na abertura do evento, dia 12, para convidados, haverá ainda o lançamento de um catálogo com cerca de 70 páginas, contando a vida de Glauber e criação de seus principais trabalhos, contextualizando-os com momentos importantes da vida cultural, política e cinematográfica do país. Ainda neste dia, será assinado um protocolo de intenções entre a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia e a Associação Amigos do Tempo Glauber para a implementação do Tempo Glauber Digital em Salvador. O Tempo Glauber e a restauração da obra do cineasta são patrocinados pela Petrobras.

Segundo Paloma Rocha, filha de Glauber, o objetivo da mostra é fazer com que o público de todos os segmentos interaja com a obra do artista baiano. Sobre a oportunidade do encontro, ela diz: “Com o lançamento dos filmes restaurados em DVD e a duplicação do acervo do Tempo Glauber poderemos criar diversos pontos digitais de acesso à obra. Graças à iniciativa de Márcio Meirelles, da Secretaria de Cultura da Bahia, realizamos um antigo desejo, que é a implementação de uma filial do Tempo Glauber em Salvador, permitindo uma maior convivência de Glauber com a Bahia.”

Para o secretário Márcio Meirelles, que conta ter procurado a família do cineasta, no início do ano passado, para “propor uma volta de Glauber à Bahia”, a presença desse acervo em Salvador é fundamental para reposicionar a importância que a Bahia tem na história do cinema brasileiro. “Sempre achei uma incoerência a Bahia não contar com uma referência à Glauber. Até pouco tempo, tínhamos apenas um cinema fechado com o seu nome, que agora está sendo reformado. Ele foi um dos mais importantes cineastas do país, sua obra é conhecida internacionalmente e é uma grande inspiração”, afirmou, ressaltando que o Templo Glauber Digital em Salvador deve se transformar num espaço de reflexão, discussão e dinamização da memória audiovisual do Estado.

A implementação do projeto, que deve ser finalizado até o próximo ano, em tempo para as comemorações do aniversário de 70 anos de Glauber Rocha, será conduzida pelo Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia (Irdeb), através da Diretoria de Audiovisual (Dimas) – unidade atualmente vinculada à Fundação Cultural do Estado da Bahia. O cineasta e diretor do Irdeb, Pola Ribeiro, defende que a aposta no desenvolvimento da produção audiovisual na Bahia não poderia acontecer sem o resgate desse acervo. “A presença desses arquivos aqui deve fazer parte da construção de um desejo de se fazer cinema na Bahia, e a retomada desse contato com a família do cineasta tem sido feita com confiança e compromisso”, ressalta.


A mostra – Teatro Castro Alves
Aberta ao público de 13 a 24 de março no Teatro Castro Alves (Praça Dois de Julho, s/n° - Campo Grande/ Salvador – Bahia) – Entrada franca.

No foyer do teatro será montada uma exposição com cerca de 100 metros quadrados em painéis de , contendo fotografias, cartazes, manuscritos, e textos que recriam a trajetória do cineasta desde o seu nascimento. Computadores “totens” darão acesso ao conteúdo “off-line” do portal http://www.tempoglauber.com.br/ e do banco de dados do acervo do Tempo Glauber com cerca de 10 mil documentos. Cinco TVs de plasma exibem documentários e curtas-metragens programados em DVD e exibidos ininterruptamente, em looping. São eles:

TV1 – documentários sobre o processo de restauração dos filmes: “Barravento”, “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”, “Idade da Terra” e “Terra em Transe”;
TV2 – curtas-metragens: “Maranhão 66”, “Pátio” e “Di Cavalcanti”;
TV3 – documentários: “Depois do Transe” e “Primeyridade”;
TV4 – documentários : “Milagres” e “Retrato da Terra”;
TV5 – entrevistas sobre o filme “Barravento” e “Programa Abertura”.

* os documentários são dirigidos por Paloma Rocha e Joel Pizzini , e foram especialmente produzidos para o relançamento dos filmes restaurados.

Sinopses dos filmes
TV2 - curtas-metragens: “Maranhão 66”, “Pátio” e “Di Cavalcanti”
Maranhão 66
O filme é uma encomenda de José Sarney, que acabava de ser eleito governador do Estado do Maranhão (e seria Presidente da República 19 anos depois), e desejava que seu amigo Glauber Rocha produzisse um documentário sobre a cerimônia de sua posse. Isso se dá dois anos depois da tomada de poder dos militares. A franqueza do filme é total e anuncia o tom de “Terra em Transe”. Não se encontra no curta-metragem o mínimo de complacência para com o político que encomendou a obra. Ao contrário, o filme é construído como um verdadeiro desafio às promessas eleitorais demagógicas: enquanto o político se compromete solenemente a acabar com as misérias da região, elas são simplesmente mostradas, com uma terrível crueza, em imagens documentais (casas miseráveis, hospitais infectos, vítimas da fome, tuberculose...), alternando com as imagens do discurso em terrível oposição entre a retórica e a realidade, mas igualmente apontando a necessidade urgente de transformar as palavras em ações para promover o progresso social.

Pátio
Primeiro filme de Glauber, curta metragem experimental com 11 minutos de duração, rodado na Bahia. Num terraço de azulejos em forma de xadrez, um rapaz e uma moça. Esses dois personagens evoluem lentamente: se tocam, rolam no chão, se distanciam, se olham. Belos planos de mãos e rostos são montados em alternância com planos de vegetação tropical e do mar. Já nesse primeiro filme podemos discernir alguns traços específicos do cineasta: forte presença da natureza, tratamento do espaço e enquadramento.

Di Cavalcanti
Pouco depois de retornar ao Brasil após longo exílio, Glauber Rocha é surpreendido pela notícia da morte do pintor Di Cavalcanti. Amigo e admirador do artista, Glauber resolve filmar o velório que se realizava no Museu de Arte Moderna, e o enterro realizado no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro. A estas imagens foram depois acrescidas outras, que resultaram num dos mais criativos e originais filmes do cineasta. Em tom irreverente, porém nunca desrespeitoso, Glauber mescla imagens de obras de Di com a leitura do poema de Vinícius Mourão “Balada de Di Cavalcanti”, e com o depoimento pessoal em tom de narrativa esportiva radiofônica.. Trata-se de um marco na obra de Glauber, sinalizando o caminho cinematográfico subseqüente: a ruptura radical dos gêneros, diluindo agressivamente a distancia entre o documentário e a ficção.

TV3 – documentários: “Depois do Transe” e “Primeyridade”
“Depois do Transe” é dividido em 13 blocos com os temas: “América Nuestra”, “Roteyroz”, “Em Busca do Ouro”, “Atuação”, “A Luz de Eldorado”, “Montagem”, “O Som da Terra”, “Terra em Debate MIS RJ/1968”, “Filme em Transe”, “Cinema Novo”, “Polytika e Poetyka”, “3 Historyaz” e “Restauração”.
Através das “vozes” de Glauber Rocha, depoimentos da equipe e do elenco, além da participação de críticos de cinema e jornalistas foram recriados o ambiente político e método de criação utilizado para a realização do filme. Foram utilizados diversos materiais do acervo do Tempo Glauber como sobras de montagem, roteiros e anotações manuscritas e fotos de cena e bastidores.
O bloco “Terra em Debate” traz trechos do debate no MIS, mediado pelo jornalista Sérgio Augusto, com a participação de Alex Viany, Luiz Carlos Barreto, Fernando Gabeira, Hélio Pellegrino e Joaquim Pedro de Andrade.
Em "3 Historyaz", depoimentos bem-humorados de Luiz Carlos Barreto, Walter Lima Jr. e José Carlos Avellar revelam curiosidades do filme e do cenário político da época, a censura e artifícios utilizados para a liberação

TV4 – documentários: “Milagres” e “Retrato da Terra”

TV5 - entrevistas sobre o filme “Barravento” e “Programa Abertura”
O Programa "ABERTURA" teve sua estréia em 4 de fevereiro de 1979, na extinta TV Tupi, dos Diários Associados, com criação e direção de Fernando Barbosa Lima. Considerado um dos mais importantes inovadores da TV brasileira, foi também o criador do famoso "Jornal da Vanguarda" (1962 - 1969). O Programa Abertura foi ao ar de fevereiro de 1979 até julho de 1980, quando a Tupi fechou suas portas. Fernando Barbosa colocou no ar uma equipe de intelectuais, jornalistas, artistas e personalidades de primeira linha, como Antônio Callado, Fausto Wolff, Fernando Sabino, Sérgio Cabral, Oswaldo Sargentelli , entre outros, e representando o cinema brasileiro, Glauber Rocha, que aceitou o convite sem ponderar.
A participação de Glauber ocorreu de fevereiro a outubro de 1979. Em 8 meses, com 4 inserções (quadros) semanais, a estimativa é que Glauber tenha aparecido mais de 32 vezes no programa, que teve ao todo, 60 edições.


A mostra “Cinema da Terra” – no Solar do Unhão
Entre os dias 14 e 20 de março haverá também a exibição de filmes dentro da mostra “Cinema da Terra”, com títulos recém-restaurados na SALA DE ARTE – MAM (Av. do Contorno, s/n° - Solar do Unhão). Os ingressos custam R$ 6,00.

Programação por filme
O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, direção de Glauber Rocha
Dia 14/03, às 21h30m
"O Dragão é inicialmente Antonio das Mortes, assim como São Jorge é o cangaceiro. Depois, o verdadeiro dragão é o latifundiário, enquanto o Santo Guerreiro passa a ser o professor quando pega as armas do cangaceiro e de Antonio das Mortes. Em suma, queria dizer que tais papéis sociais não são eternos e imóveis, e que tais componentes de agrupamentos sociais solidamente conservadores, ou reacionários, ou cúmplices do poder, podem mudar e contribuir para mudar. Basta que entendam onde está o verdadeiro dragão."
SinopseNuma cidadezinha chamada Jardim das Piranhas aparece um cangaceiro que se apresenta como a reencarnação de Lampião. Seu nome é Coirana. Anos depois de ter matado Corisco, Antônio das Mortes (personagem de Deus e o Diabo na Terra do Sol) vai à cidade para ver o cangaceiro. É o encontro dos mitos, o início do duelo entre o dragão da maldade contra o santo guerreiro. Outros personagens vão povoar o mundo de Antônio das Mortes. Entre eles, um professor desiludido e sem esperanças; um coronel com delírios de grandeza, um delegado com ambições políticas; e uma linda mulher, Laura, vivendo uma trágica solidão.

Anabazys (documentário), direção de Paloma Rocha e Joel Pizzini
Dia 15/03, às 18h30m e dia 19/03, às 20h30m
O documentário Anabazys (“ascensão” em grego) é um inventário sobre a gênese, a erupção e a ressonância de “A Idade da Terra” o filme de Glauber Rocha que anunciou em 1980 a revolução audiovisual contemporânea. O título faz alusão ao nome dado pelo autor a uma das primeiras versões de seu roteiro original. Composto de 13 blocos autônomos que abordam desde a concepção, interpretação, figurinos, a trilha sonora (executada ao vivo), até a polêmica provocada pelo filme no Festival de Veneza; o documentário busca recriar a memória em torno da produção como forma de amplificar a percepção do “cinema espacial” proposto por Glauber. Neste ensaio, há cenas inéditas extraídas das 60 horas encontradas do material bruto não aproveitado na montagem final de "A Idade" e que flagram a dicção delirante de Glauber nas filmagens. Mais do que um tributo ou registro de época, Anabazys procura investigar as motivações estéticas e políticas que levaram o artista a compor o seu “testamento do futuro”, conforme definição do cineasta argentino Fernando Birri. Com a participação do elenco, equipe técnica, amigos e colaboradores de Glauber, que revisitam o imaginário de “A Idade da Terra” o documentário procura examinar ainda as raízes dos pré-conceitos forjados historicamente para excluir o filme do circuito cinematográfico. Narrado em primeira pessoa pelas “vozes” de Glauber, “Anabazys” é como um prolongamento de “A Idade”, propondo experimentar as lições visionárias de um artista no auge do processo de ruptura da linguagem cinematográfica do final dos anos setenta. Um filme “sob” um filme onde o autor assume também o papel de ator de sua verdade históryka. Em “Anabazys”, Glauber se expõe por inteiro: antevê e se arrisca pela Abertura política do país e, anos-luz à frente de seu tempo, inventa uma ousada narrativa, três décadas após, assimilada enfim pelas novas gerações.

A Idade da Terra, direção de Glauber Rocha
Dia 15/03, às 20h30m e dia 18/03, às 20h20m
“O filme mostra um Cristo-Pescador, o Cristo interpretado pelo Jece Valadão; um Cristo-Nengro, interpretado por Antônio Pitanga; mostra o Cristo que é o conquistador português, Dom Sebastião, interpretado por Tarcísio Meira; e mostra o Cristo Guerreiro-Ogum de Lampião, interpretado pelo Geraldo Del Rey. Quer dizer, os quatro Cavaleiros do Apocalipse que ressuscitam o Cristo no Terceiro Mundo, recontando o mito através dos quatro Evangelistas: Mateus, Marcos, Lucas e João, cuja identidade é revelada no filme quase como se fosse um Terceiro Testamento. E o filme assume um tom profético, realmente bíblico e religioso.”

Deus e o Diabo na Terra do Sol, direção de Glauber Rocha
Dia 16/03, às 18h30m e dia 20/03, às 20h30m
"Eu parti do texto poético. A origem de "Deus e o Diabo..." é uma língua metafórica, a literatura de cordel. No Nordeste, os cegos, nos circos, nas feiras, nos teatros populares, começam uma história cantando: eu vou lhes contar uma história que é de verdade e de imaginação, ou então que é imaginação verdadeira. Toda minha formação foi feita nesse clima. A idéia do filme me veio espontaneamente." - Glauber Rocha

Terra em Transe, direção de Glauber Rocha
Dia 17/03, às 20h30m e dia 20/03, às 18h30m
Senador Porfírio Diaz odeia o seu povo, e pretende se coroar imperador de um país fictício chamado Eldorado, para impor ao povo todas as suas vontades. Mas existem outros homens que querem esse poder e lutar contra este poder.

Rocha que voa, de Eryk Rocha
Dia 17/03, às 18h30m
O exílio em Cuba de 1971 a 1972, um dos períodos menos conhecidos da vida do diretor Glauber Rocha, coincide com um período de grande euforia e discussão em torno do papel das artes na revolução social e política dos países da América Latina e do Terceiro Mundo. Glauber, com sua fala barroca e poética, propõe o cinema como o principal instrumento cultural e político para a promoção da unidade latino-americana, servindo como fio condutor para a reconstituição do Cinema Novo brasileiro e do Cinema Revolucionário cubano.
O diretor Eryk Rocha apresenta um filme-ensaio sobre o papel dos intelectuais na América Latina, em especial os que fizeram a ligação entre o Cinema Novo brasileiro e o Cinema Revolucionário cubano.

Diários de Sintra, de Paula Gaitán, última esposa de Glauber
Dia 18/03, às 18h30m
A partir dos registros pessoais do cotidiano do cineasta Glauber Rocha na cidade de Sintra, em Portugal, onde morou com a esposa Paula Gaitán e os dois filhos Eryk e Ava no ano de 1981, vemos as últimas imagens, ainda inéditas, de Glauber Rocha vivo. O filme revela com poética delicada os últimos meses de Glauber. Refaz percursos, reinventa caminhos, reencontra amigos da cidade e analisa o momento em contraponto à história de sua geração. A atualidade está no discurso do cineasta, que confirma a contemporaneidade do seu pensamento.

Barravento, direção de Glauber Rocha
Dia 19/03, às 18h30m
Numa aldeia de pescadores de xaréu, cujos antepassados vieram da África como escravos, permanecem antigos cultos místicos ligados ao candomblé. A chegada de Firmino, antigo morador que se mudou para Salvador fugindo da pobreza, altera o panorama pacato do local, polarizando tensões. Firmino tem uma atração por Cota, mas não consegue esquecer Naína que, por sua vez, gosta de Aruã. Firmino encomenda um despacho contra Aruã, que não é atingido, ao contrário da aldeia que vê a rede arrebentada, impedindo o trabalho da pesca. Firmino incita os pescadores à revolta contra o dono da rede, chegando a destruí-la. Policiais chegam à aldeia para controlar o equipamento. Na sua luta contra a exploração, Firmino se indispõe contra o Mestre, intermediário dos pescadores e do dono da rede. Um pescador convence Aruã de pescar sem a rede, já que a sua castidade o faria um protegido de Iemanjá. Os pescadores são bem-sucedidos na empreitada, destacando-se a liderança de Aruã. Naína revela para uma preta velha o seu amor impossível por Aruã. Diante da sua derrota contra o misticismo, Firmino convence Cota a tirar a virgindade de Aruã, quebrando assim o encantamento religioso de que ele estaria investido por Iemanjá. Aruã sucumbe à tentação. Uma tempestade anuncia o "barravento", o momento de violência. Os pescadores saem para o mar, com a morte de dois deles, Vicente e Chico. Firmino denuncia a perda de castidade de Aruã. O Mestre o renega. Os mortos são velados, e Naína aceita fazer o santo, para que possa casar com Aruã. Ele promete casamento, mas antes decide partir para a cidade de forma a trabalhar e conseguir dinheiro para a compra de uma rede nova. No mesmo lugar em que Firmino chegou à aldeia, Aruã parte em direção à cidade.

“Cinema que pensa” – mesas de debate
Nos dias 14 e 15 de março acontecem duas mesas de debate em torno da obra de Glauber Rocha e do cinema latino-americano. O “Cinema que pensa”, concebido e dirigido pela cineasta Paula Gaitán, pelo filósofo Juan David Posada e pelo cineasta Eryk Rocha, abre um espaço de discussão em que intelectuais, cineastas e artistas, de várias matizes de pensamento, projetam um cinema futuro a partir das provocações do presente e das experiências transmitidas pelo passado.
Os debates acontecem na Sala Walter da Silveira (Rua General Labatut, 27/ Barris - prédio da Biblioteca Pública Estadual), às 10h. A entrada é franca.

Dia 14/03
Mesa I: “A idéia de um cinema latino-americano nos anos 60 do século passado e o cinema de Glauber Rocha”.
Participantes: Orlando Senna, Márcio Meireles, Geraldo Sarno, Sofia Federico, Pedro Paulo Rocha e Eryk Rocha (Mediador).

Dia 15/03
Mesa II: “A Idade da Terra, o cinema político e uma nova idéia de ‘polis’”.
Participantes: Póla Ribeiro, Paloma Rocha, Edgar Navarro, Joel Pizzini, Cláudio Marques e
Juan David Posada (Mediador).

O cineasta
Glauber Rocha nasceu em Vitória da Conquista, Bahia, em 14 de março de 1939. Estreou no cinema com o curta experimental “O Pátio”, em 1959. No ano seguinte, rodou o seu primeiro longa-metragem:“Barravento”. O filme que chamou a atenção da crítica e já evidenciava o talento do diretor.
Em 1963, Glauber realiza aquele que seria considerado o divisor de águas do cinema nacional: “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. Desde então, a polêmica se tornou uma rotina a cada um de seus filmes. Ao todo, o cineasta fez 11 longas e seis curtas, tendo a luta pela liberdade como tema recorrente.
Glauber, que também ficou consagrado por obras como “Terra em Transe”, “O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro”, “O Leão de Sete Cabeças” e “Câncer”, entre outras, acumulou prêmios ao longo de sua carreira. O diretor morreu de septicemia, no Rio de Janeiro, no dia 22 de agosto de 1981.

Associação dos Amigos do Tempo Glauber
Instituição que preserva e divulga a obra do cineasta Glauber Rocha, tem como objetivo principal nessa mostra multimídia, proporcionar acesso mais abrangente e detalhado ao conteúdo do acervo Tempo Glauber, que atualmente se encontra em processo de catalogação e digitalização. A mostra “Glauber, Uma Revolução Baiana” visa alcançar de forma simples, objetiva e interessante, o público, que atualmente pouco conhece a obra desse importante pensador baiano. Os organizadores pretendem transformar o espaço disponível em um ambiente cinematográfico, com informações relevantes e um forte diálogo visual, transitando pela obra cinematográfica e intelectual do artista. O foco é simplificar e dialogar, através de um contato direto com a história, a obra do artista. O conteúdo do acervo e a maioria da produção intelectual de Glauber Rocha, que permaneceu inédita por quase 20 anos, devido às condições de preservação do material original, e no presente, com o processo de restauração e catalogação de todo o inventário, torna-se possível disponibilizar uma parcela ao público de forma responsável, educativa e atual através de mostras, exposições e dos sites hoje disponíveis: http://www.tempoglauber.com.br/ e http://www.janelaparaonovo.inf.br/.

O Tempo Glauber
O Tempo Glauber foi criado em 1983, mas só abriu suas portas ao público seis anos mais tarde. Foi uma longa batalha travada pela mãe do cineasta, Lúcia Rocha. Avanços e recuos ao longo de quase duas décadas. Em 2004, é fundada a Associação de Amigos do Tempo Glauber, sociedade sem fins lucrativos composta por Paloma, Sara, Eryk Rocha e Dario Correa, cuja proposta é captar e gerir verbas para a instituição. A associação recebe sua manutenção do Ministério da Cultura e contrata equipe de profissionais para compor o quadro de funcionários.

O Tempo Glauber foi declarado pelo Conselho Nacional de Arquivos (Conarq), em 2006, como Arquivo Privado de Interesse Público e Social e assim reconhecido por decreto de lei pela Casa Civil da Presidência da República por conter documentos relevantes para o estudo e pesquisa da expressão artística brasileira.
VM FILMES

Fonte: Tempo Glauber

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

RETOMADA

Beto Magno, fotografando

Em dezembro de 1992, ainda no governo de Itamar Franco, o Ministro da Cultura Antonio Houaiss cria a Secretaria para o Desenvolvimento do Audiovisual, que libera recursos para produção de filmes através do Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro e passa a trabalhar na elaboração do que viria ser a Lei do Audiovisual, que entraria em vigor no governo de Fernando Henrique Cardoso.

A partir de 1995, começa-se a falar numa "retomada" do cinema brasileiro. Novos mecanismos de apoio à produção, baseados em incentivos fiscais e numa visão neo-liberal de "cultura de mercado", conseguem efetivamente aumentar o número de filmes realizados e levar o cinema brasileiro de volta à cena mundial. O filme que inicia este período é Carlota Joaquina, Princesa do Brasil (1995) de Carla Camurati, parcialmente financiado pelo Prêmio Resgate. No entanto, as dificuldades de penetração no seu próprio mercado continuam: a maioria dos filmes não encontra salas de exibição no país, e muitos são exibidos em condições precárias: salas inadequadas, utilização de datas desprezadas pelas distribuidoras estrangeiras, pouca divulgação na mídia local.

Alguns filmes lançados nos primeiros anos do novo século, com uma temática atual e novas estratégias de lançamento, como Cidade de Deus (2002) de Fernando Meirelles, Carandiru (2003) de Hector Babenco e Tropa de Elite (2007) de José Padilha, alcançam grande público no Brasil e perspectivas de carreira internacional.

Em Janeiro de 2009 o Cinema Brasileiro tem um momento histórico: Uma continuação de sucesso com Se Eu Fosse Você 2 de direção de Daniel Filho com Tony Ramos e Glória Pires nos papéis dos protagonistas que ultrapassa 1 milhão de espectadores com menos de uma semana.

(Fonte: Folha de S.Paulo)

domingo, 18 de janeiro de 2009

O CASCALHO (PRECISAMOS RECONHECER NOSSOS TALENTOS)


Artigo de Lúcia Mesquita:

"Uma força telúrica invade a tela com a sucessão de imagens de escarpas, grutas, montanhas, cascatas e vales por uma câmera ansiosa em registrar a exuberância da paisagem de uma beleza estonteante na região da Chapada Diamantina. Em seguida, surge a grande música de Aderbal Duarte e Walter Queiroz Jr.acompanhando os planos com o um contraponto indispensável à expressão cinematográfica, até que os letreiros apresentam Cascalho, livre transposição do cineasta Tuna Espinheira para o romance homônimo de Herberto Sales.

Verdadeiro diálogo de sensibilidades entre romancista e cineasta, Cascalho é o exemplo de como a literatura pode ser recriada por outras fontes narrativas sem perder sua essência. Em outras palavras, quando o texto é sumarento, permite que diferentes linguagens se apropriem da idéia original e recriem outras formas de narração sem perder força e identidade.

Manejando técnicas diversas, escritor e cineasta souberam usar com maestria as armas de seu ofício. Herberto preocupou-se com a exploração e a sobrevivência do homem duplamente fragilizado quando subjugado pelas forças da natureza e do poder político do coronelismo predominante na Bahia.

Com essas tintas, retratou sua Andaraí natal na década de 30 com um realismo tal que as forças da intolerância e da opressão obrigaram-no a emigrar para o sul do País, onde reafirmou sua vocação de escritor regionalista e ocupa até hoje um lugar de destaque na literatura brasileira.
A leitura do magistral romance não passou despercebida ao cineasta também de origem interiorana, que se debruçou sobre o texto para recriar com imagens o universo herbertiano. Em contrapartida, a ação é a matéria-prima da criação cinematográfica, basta lembrar que é o grito enérgico do diretor o passe de mágica capaz de imprimir no celulóide a imagem, e ela está aqui valorizada e manejada com talento invulgar pelo cineasta.

Utilizando-se da construção linear, o filme de Tuna não recorre a efeitos especiais nem a recursos narrativos banalizados. Nele, a estrutura do enredo e da linguagem foi de tal forma alicerçada num trabalho artesanal consistente e vigoroso, de forma que uma cena brota da outra, pontuadas todas por uma tensão entre as personagens e as situações interpretadas, prendendo naturalmente a atenção do espectador do princípio ao fim.

Pedra e água são os elementos que delimitam o cenário físico e político dos habitantes da mineração e pontuam o relacionamento entre os donos da terra e os que nela garimpam seus sonhos e sustento. Em conluio com a natureza agreste, a brutalidade ali presente permeia o cotidiano da luta pela sobrevivência em condições adversas, não se apresentando como mero artifício para impressionar o público. Dedicado ao seu labor criativo de transformar texto em imagem, escolheu distanciar o seu cinema da violência urbana decalcada de uma matriz hollywoodiana que ultimamente vem se tornando um tema recorrente no cinema nacional.
Inclusive, há de ser dito que Cascalho mostra com lucidez e coragem uma realidade social do século passado, que de forma surpreendente continua se reproduzindo apesar do avanço democrático, em nossos dias atuais. A disputa travada na tela entre o poder do coronel e as demais autoridades locais, representadas pelo prefeito, promotor e o juiz, permanece tão atual que a ação parece ter-se transportado para a contemporaneidade.

Há uma passagem premonitória no filme, quando o coronel e seu preposto tramam desviar, para uso particular, verba pública armazenada e transportada em moeda corrente numa mala de couro. Esse artifício concebido pelo roteirista/cineasta para ilustrar a corrupção e o desvio de dinheiro público em proveito de dirigentes políticos, por coincidência, precedeu em alguns meses ao escândalo do “mensalão”, amplamente divulgado na imprensa.

Diante do registro, perfeitamente cabível o comentário: a vida imita a arte ou é a arte que imita a vida? Há, sobretudo, uma riqueza narrativa no filme que enfoca em seus vários aspectos a saga do garimpo, com o conflito entre o proprietário da terra e os que nela laboram, a dominação do dinheiro, de um lado e a necessidade de sobrevivência, na outra extremidade, a exploração do homem pelo homem e a crueldade da relação entre poder versus subser viência.
E como cenário, transborda a natureza na profusão da água que brota incessante da pedra como seu elemento primordial.Sendo fonte de utilidade para todos, o precioso líquido pode se transformar em humilhação para o negro cujo corpo empurrado pelo patrão chafurda na lama, ou de redenção para o garimpeiro que encontra a morte no alagamento da gruna. Esta comovente cena final consagra o lírico e o onírico como vitória do homem sobre o inexorável, num desfecho apoteótico.

Louve-se, ainda a escolha dos atores para caracterização das diversas personagens, merecendo menção especial às interpretações impecáveis do renomado Othon Bastos, como coronel Ramiro, Harildo Deda, Wilson Mello, Jorge Coutinho, famoso por seu trabalho em Ganza-Zumba e que desempenha o papel de Zé de Peixoto, Lúcio Tranchesi, inesquecível como o garimpeiro Filó, da expressiva e talentosa Maria Rosa Espinheira, de Ângelo Roberto, em breve e marcante aparição, do saudoso Irving São Paulo em seu último trabalho como o memorável promotor público, e afinal do próprio cineasta dublê de ator, numa evocação direta a Orson Welles e Hitchcock.

Neste filme emblemático, de forte conotação política e regional, uma página da história deste país é revivida, sob a competente direção de Tuna Espinheira que com ele consolida seus múltiplos talentos de roteirista, ator e diretor.Deve ser dito que a película foi garimpada como um diamante bruto até atingir a cintilação de uma gema lapidada. Por vários e vários anos o projeto esteve nos sonhos do cineasta, até que recebeu o premio de melhor roteiro no concurso Fernando Coni Campos, em 2002, e foi graças a este laurel que as filmagens foram iniciadas. Em seguida, foi escolhido o melhor filme no 1º Festival de Cinema de Macapá.Este é o primeiro longa-metragem de Tuna, que vem sendo elogiado em todas as partes onde é exibido e, inclusive, recebeu convite para, no primeiro trimestre de 2009, participar de uma mostra na Alemanha para onde seguirá tão logo sejam colocadas legendas em inglês.Desejo sucesso ao filme no exterior e torço para que ele volte a confirmar o prestígio de nossa tradição cinematográfica inaugurada com o cinema novo.

LÚCIA LEÃO JACOBINA MESQUITA Advogada, ensaísta e autora de Aventura da palavra