Beto Magno
A palavra cinema origina-se do cinematógrafo (invenção dos irmãos Lumière), que vem do grego "kinema", movimento e "ghaphein", registrar. Cinema significa registro do movimento, e pode ser definido como a arte de produzir imagens em movimento.
Entretanto, o cinema é antes de tudo uma ilusão de ótica. Só enxergamos as imagens se movimentando na tela porque somos portadores de uma deficiência visual chamada "persistência retineana", ou seja, uma característica do olho humano que faz com que uma imagem permaneça fixa na retina por algumas frações de segundos, mesmo depois de não estarmos olhando para ela. Nossos olhos não são capazes de perceber, durante a projeção, os intervalos que separam os fotogramas na cópia do filme. Fotogramas constituem uma série de fotografias paradas, cada uma das quais representando uma parte de um movimento completo. Quando aparece uma faixa negra, ainda estamos vendo o fotograma anterior, e continuamos vendo o fotograma que vem depois da faixa quando o fotograma seguinte toma o seu lugar. Isto quer dizer que uma sucessão de figuras (imagens) passadas torna-se capaz de mostrar a sensação do movimento contínuo. Atualmente a velocidade da filmagem é de 24 fotogramas por segundo.
O cinema é, também, conhecido como "a sétima arte". Esta expressão foi criada pelo crítico e estudioso de cinema Ricciotto Canudo , italiano radicado na França, e fundador do "Clube dos Amigos da Sétima Arte", e popularizada, no início da segunda década do século XX, época dos "filmes de arte" franceses, colocando o cinema no mesmo patamar de status do teatro, da música, da literatura, do balé, da pintura e da escultura. Esta denominação é bastante utilizada atualmente.
Segundo Louis Delluc, "o cinema é, talvez, a única arte realmente moderna, porque é ao mesmo tempo filha da máquina e do ideal humano".
A princípio, o cinema foi apenas uma maravilhosa invenção mecânica. Depois, sua linguagem evoluiu, a técnica e seus efeitos se sofisticaram, até chegar à fase atual, caracterizada por uma evolução dos temas, do conceito de personagem e do conceito de estrutura narrativa.
PRECURSORES:
A preocupação do homem com o registro do movimento é muito antiga. O desenho e a pintura rupestres foram as primeiras formas de representação da vida humana e da natureza registradas pelos nossos ancestrais, produzindo narrativas através de figuras.
Durante séculos, civilizações buscaram meios para produzir a realidade. A mais remota precursora do cinema de que se tem noticia é a Sombra Chinesa. Surgidas na China, por volta de 5.000 a.C., e difundidas na Índia e em Java, o jogo de sombras do teatro de marionetes oriental projetavam silhuetas de figuras humanas, animais ou objetos recortados sobre paredes ou telas de linho. O operador narrava a ação quase sempre envolvendo príncipes, guerreiros e dragões.
No século XV, Leonardo da Vinci enuncia o princípio da Câmara Escura. O invento é desenvolvido pelo físico napolitano Giambattista Della Porta, no século XVI, que consiste em projetar imagens numa caixa fechada, com um pequeno orifício coberto por uma lente. Através dele penetram e se cruzam os raios refletidos pelos objetos exteriores. A imagem, invertida, inscreve-se na face do fundo, no interior da caixa. A Câmara Escura permitia a projeção de imagens externas dentro de um quarto escuro.
No século XVII, o alemão Athanasius Kircher cria a Lanterna Mágica, que se baseia no processo inverso da câmara escura, composta por uma caixa cilíndrica iluminada à vela, que projeta as imagens desenhadas em uma lâmina de vidro. A Lanterna Mágica é considerada a precursora das sessões de cinema.
Nos séculos XVIII e XIX, o teatro em caixa é apresentado nas ruas e feiras. O apresentador, puxando fios, desenrola cenas iluminadas por velas. No fim do século XIX, as placas de lanterna mágica não são mais apenas pintadas à mão, mas podem ser recobertas de cromolitografias ou de fotografias. O teatro passa também por uma renovação, com os espetáculos do cabaré parisiense "Le Chat Noir", em que se projetam silhuetas em zinco, variando as cores e a intensidade luminosa.
SÉCULO XIX:
A invenção da fotografia pelos franceses Joseph- Nicéphone Niépce e Louis-Jacques Daguerre abre caminho para o espetáculo do cinema, que também deve sua existência às pesquisas do inglês Peter Mark Roget e do belga Joseph-Antoine Plateau sobre a persistência da imagem na retina após ter sido vista. Sendo o fenômeno da "persistência retineana" conhecido desde a antiguidade, o problema dos cientistas era descobrir o princípio da composição e decomposição do movimento a partir de uma série de imagens fixas. Em 1832, Plateau inventa um aparelho o fenacistoscópio, formado por um disco com várias figuras desenhadas em posições diferentes, ao girar o disco elas adquiram o movimento.
Durante todo o século XIX, inventores tentam produzir a ilusão do movimento. Em 1833, o britânico W.G. Horner idealiza o zootrópio, jogo baseado na sucessão regular de imagens. Em 1877, o francês Émile Reynaud cria o teatro óptico, uma combinação de lanterna mágica e espelhos para projetar filmes de desenhos numa tela. Na mesma época, Eadweard Muybridge, nos Estados Unidos, experimenta o zoopraxinoscópio, decompondo em fotogramas corridas de cavalos. Pesquisas posteriores sobre o andar do homem ou o vôo dos pássaros levam Étienne-Jules Marey, em 1887, ao desenvolvimento da cronofotografia, a fixação de fotografias de várias fases de um corpo em movimento, que é a própria base do cinema. Contudo, o inventor americano Thomas Alva Edison, desenvolve, com o auxílio do escocês William Kennedy Dickson, o filme de celulóide perfurado. E, em 1890, roda uma série de pequenos filmes em seu estúdio, o Black Maria, primeiro da história do cinema. Esses filmes não são projetados em uma tela, mas no interior de uma máquina, um aparelho para a visão individual de filmes chamado cinetoscópio.
A partir do aperfeiçoamento do cinetoscópio, os irmãos franceses Auguste e Louis Lumière idealizam o cinematógrafo, invento equipado com um mecanismo de arrasto para a película, conseguindo projetar imagens ampliadas numa tela. Na apresentação pública de 28 de dezembro de 1895, no Salão Indiano do Grand Café do boulevard des Capucines, em Paris, o cinema nascia oficialmente, o público viu, pela primeira vez, filmes como "A saída dos operários da fábrica Lumière" e "Chegada de um trem à estação", breves testemunhos da vida cotidiana. O cinema começava a dar os seus primeiros passos.
O CINEMA MUDO:
No início do século XX, a arte cinematográfica já era uma indústria, os filmes silenciosos divertiam o público com a força das suas imagens e das expressões dos atores. As cenas eram acompanhadas por instrumentos musicais e por pequenas orquestras e apresentavam legendas que explicavam as ações ou o diálogo dos personagens.
Desde a sua origem até o seu apogeu, o cinema mudo evoluiu. Os primeiros filmes eram curtos e rudimentares, apenas documentários sobre a vida cotidiana, marca dos irmãos Lumière; O gênero ficção foi introduzido pelo ilusionista, diretor, ator, produtor, figurinista e fotógrafo Georges Méliès, conhecido como o criador do espetáculo cinematográfico, que desenvolve diversas técnicas como: fusão, exposição múltipla, uso de maquetes, truques ópticos, precursores dos efeitos especiais. Dos trabalhos que marcaram destacam-se "O encouraçado Maine" (1898), "A caverna maldita" (1898), "A gata borralheira" (1899) e sua obra-prima mais conhecida "Viagem à Lua" (1902); Edwin Porter inaugura o western americano com "O Grande Roubo do Trem" (1903), e marca o começo da indústria do cinema; David Griffith estabeleceu a linguagem narrativa, seus maiores sucessos são "O Nascimento de uma Nação" (1915) e "Intolerância" (1916).
Escolas experimentais expandiram a estética do cinema e legalizaram a sua visão artística, como:
A Escola de Brighton, na Inglaterra: seus principais representantes foram James Williamsom e George Albert Smith que tinham predileção por filmagem ao ar livre, com luz natural, em amplos espaços. Esta tendência, combinada com o aprimoramento das técnicas de montagem e planificação, criou um tipo de filme envolvente e vibrante, entre eles se destaca "Attack on a China Station", de Williamson, onde a câmara não permanecia fixa, obedecendo o ponto de vista do espectador, fazendo com que o mesmo participasse da ação. Os ingleses são considerados os pais dos filmes de perseguição.
Na França com Charles Pathé e Ferdinand Zecca, que realizam filmes longos em que substituem a fantasia pelo realismo, com "Histoire d'um Crime"(1901) e "Lês Victimes de L'Alcoolisme"(1902). Seus filmes eram simples, diretos, claros e objetivos, e também, utilizavam doses de erotismo e aberrações; Léon Gaumont , montou uma fábrica de equipamentos cinematográficos, como o cronotógrafo, um equipamento que unia projetor e câmara ao mesmo tempo, o cronofone (1902), um sistema que tentava sincronizar o som dos filmes com um disco previamente gravado, e o cronochrone (1912), uma técnica que se utilizava de três cores para proporcionar a sensação de filmes coloridos. Gaumont produziu pequenos filmes; a primeira mulher cineasta, Alice Guy; secretária de Gaumont.
A Itália, produziu grandiosos espetáculos culturais. O filme mais conhecido foi "Cabiria"(1914), de Giovanni Pastrone, que utilizou cenários suntuosos com locações na Tunísia, Sicília e nos Alpes, alcançando sucesso internacional.
A Alemanha foi o berço dos filmes de terror. A série "Der Golen"(1914), de Paul Wegener é tido como um clássico do terror antigo.
A Rússia se destaca com experiências pioneiras, como o "stop motion", efeito de
animação através de filmagem quadro a quadro. Um dos filmes mais conhecidos é "A Bela Leukanida"(1912), de Wladyslaw Storewicz, que usa bonecos animados.
O expressionismo alemão, o construtivismo Russo e o Surrealismo Espanhol surpreenderam com sua complexidade e inovação.
O expressionismo alemão: a obra que inaugurou e até hoje simboliza o expressionismo no cinema é o "Gabinete do Dr. Caligari"(1919), de Robert Wiene. As perspectivas distorcidas, os cenários grosseiros, móveis, que não se encaixavam na anatomia humana, um forte jogo de luzes e sombras, e uma aberta discussão sobre a sanidade e a loucura, transformou o filme numa obra obrigatória dos cursos de cinema e em todas as listas dos mais importantes filmes do século. Outro gênio do expressionismo alemão foi Fritz Lang, uma das suas obras-primas foi "Metrópolis"(1927), o mais caro filmes já rodado na Alemanha. A visão futurista do homem dominado pelo sistema capitalista até hoje impressiona. Os gigantescos edifícios, pontes, viadutos e construções dispostas de forma caótica, cria um ambiente claustrofóbico.
O construtivismo russo: "Greve" e "Encouraçado Potemkim", ambos de 1925, de Sergei Eisenstein, revoluciona a arte e a técnica da montagem, imprimindo em seus filmes um ritmo e uma riqueza visual jamais apreciada até então. Este último filme colocou a União Soviética no mapa do cinema e fez de Eisenstein uma celebridade do dia para a noite.
O surrealismo espanhol: com Luis Bǔnuel e Salvador Dali. A produção "Um Cão Andaluz"(1928), mostra uma série de imagens chocantes, aparentemente sem conexão umas com as outras.
Com a primeira guerra mundial, o cinema se concentrou nos Estados Unidos. Em Hollywood, na Califórnia, nasceram os primeiros grandes estúdios, como a Universal, a Keystone, a Paramount, Fox, United Artists, Columbia, entre outros. A denominação "estrela" passou a consagrar e a imortalizar mitos como Douglas Fairbanks, Mary Pickford, Rodolfo Valentino, John Barrymore, Theda Bara, Gloria Swanson, Greta Garbo, entre muitos. Os reis da comédia Max Linder, Mack Sennett, Charles Chaplin, Buster Keaton, Harold Lloyd, Stan Laurel e Oliver Hardy ( a dupla "o gordo e o magro") e diversos outros, ampliaram e solidificaram o cinema como o mais popular das diversões.
Exatamente quando a imagem silenciosa alcançava o seu ápice, o cinema começava a falar.