domingo, 12 de setembro de 2010

NOVO FILME DE ARNALDO JABOR


Arnaldo Jabor dirige Marcos Nanini no Rio de Janeiro

Por André Setaro

Após 25 anos sem filmar, Arnaldo Jabor está de volta com A suprema felicidade, filme que se passa nos anos dourados no Rio de Janeiro e apresenta o itinerário de um garoto desde a infância até a adolescência. Este retorno de Jabor ao cinema, quando ficou mais de duas décadas dedicado ao jornalismo e à televisão, é um filme, na verdade, sobre ele próprio, e o jovem que tem sua trajetória percorrida é a trajetória de Jabor no maravilhoso Rio de Janeiro de fins da década de 50. Mistura comédia e drama, com alguns acentos trágicos, mas o seu propósito foi refletir sobre a vivência de um jovem numa cidade decididamente maravilhosa como era o Rio daquela época - sem violência, calma, quando todos podiam andar pelas ruas sem haver o menor perigo. O Rio que tinha no bairro de Copacabana a sua maior referência, com suas boites sofisticadas, onde se estabelecia uma vida noturna inesquecível. Quem não conheceu o Rio deste período não pode ter idéia de sua efervescência, de sua alegria, de sua joie de vivre. A suprema felicidade do título talvez esteja neste recordar nostálgico para uma época, repita-se, maravilhosa, encantadora.

O último filme de Arnaldo Jabor, Eu sei que vou te amar, apesar de alguns elogios que lhe foram conferidos, é bem ruim, verborrágico e muito pretensioso. Com a idade, Jabor ficou mais humilde, menos arrogante, quer no seu discurso cinematográfico, quer no seu jeito de ser. Sua filmografia é bastante irregular. Tem um ótimo filme, que é Toda nudez será castigada, talvez a melhor adaptação para o cinema das torrentes verbais do genial Nelson Rodrigues, que consagrou Darlene Glória como atriz. Mas tem também péssimos filmes, a exemplo de Pindorama, uma curtição filmada na Ilha de Itaparica, obra arrastada, mal ajambrada, que provocou intensa aporrinhação no espectador. Por outro lado, é autor de um excelente documentário (pelo menos é esta a impressão que se tem de uma obra vista há muitos anos) sobre a classe média brasileira: Opinião pública. Seu curta de estréia é bastante interessante: O circo, mas sua segunda incursão no universo rodrigueano, O casamento, não tem a contundência de Toda nudez será castigada.

Jabor fez parte do chamado Cinema Novo e é um nome muito citado. Polêmico, inteligente, sabe vender o seu peixe. Bem articulado, seu discurso sobre seus filmes são bem melhores do que eles. Mas não se pode negar que Toda nudez será castigada é um filme a respeitar, assim como, de certa forma, O casamento, ainda que neste carregue muito na dosagem, a procurar ser mais rodrigueano do que o próprio Nelson Rodrigues. Seus artigos em jornais não possuem uma unanimidade (concordando com o seu mestre, Nelson Rodrigues, de que toda a unanimidade é burra). Carrega muito nas tintas quando quer provocar e tem um acento anárquico (o que é bom) para, como dizia Glauber, "jogar vatapá no ventilador."

Ia-se esquecendo de dois filmes jaborianos: Tudo bem, uma tentativa de retratar as classes sociais dentro de um apartamento em reforma, com atuações brilhantes de Fernanda Montenegro e Paulo Gracindo, e Eu te amo, com Sonia Braga, Vera Fischer, no esplendor de sua beleza, Paulo César Pereio, o indefectível, e Tarcísio Meira, que também se passa, quase todo ele, no espaço exíguo de um amplo apartamento. Apesar de alguns bons momentos, o filme não se realiza por causa justamente da pretensão do autor de ser mais do que pode ser como artista que tenta se exprimir através das imagens em movimento.

A suprema felicidade tem uma bela reconstituição de época, e está cheios de toques poéticos. O autor está a querer, como já se disse, revisitar o seu passado carioca. Teve a sorte de morar no Rio num momento todo especial, qual seja a época dos anos dourados. No elenco, Marco Nanini (que faz o papel do avô do menino e sempre um bom ator), Dan Stulbach (revelação do cinema nacional, principalmente em Tempos de paz, de Daniel Filho), Mariana Lima, Maria Flor, João Miguel (o talentoso intérprete de Cinema, aspirinas e urubus, Estômago, entre outros e que se veio a saber ser filho do político baiano Domingos Leonelli), Jayme Matarazzo (neto de Mayza, a gloriosa Maysa de Meu mundo caiu), Elke Maravilha (como a avó do garoto), Jorge Loredo (o inesquecível Zé Bonitinho da televisão que tinha em Rogério Sganzerla um grande admirador), Maria Luiza Mendonça, Ary Fontoura (um dos grandes atores do cinema e do teatro brasileiros), Camila Amado (que já trabalhou com Jabor em O casamento e ganhou o prêmio de melhor atriz no Festival de Gramado), Emiliano Queiroz, entre outros. A fotografia é do excelente iluminador Lauro Escorel.
A suprema felicidade, tem-se aqui uma espécie de intuição e premonição, talvez venha a ser o melhor filme de Arnaldo Jabor, porque obra da maturidade criadora, quando o artista se despe de seu virtuosismo pedante juvenil.

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