quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

PESQUISA

PÉS DUROS E MELETES

“Povo sem história é povo ignorado, povo esquecido, sem nome, sem valor”.
Aníbal Lopes Viana

Vitória da Conquista é um município brasileiro do estado da Bahia. Sua população, conforme o IBGE, em 1º de Julho de 2008, era de 313.898 habitantes, o que a torna a 3ª maior cidade do estado e também do interior do Nordeste (excetuando-se as regiões metropolitanas).
Possui um dos PIBs que mais crescem no interior desta região. Capital regional de uma área que abrange aproximadamente 70 municípios na Bahia, além de 16 cidades do norte de Minas Gerais. Tem a altitude, nas escadarias da Igreja Matriz, de 923 metros podendo atingir mais de 1.000 metros nos bairros mais altos. Possui uma área de 3.743 km².

História:

Rua_GrandeO Arraial da Conquista foi fundado em 1783 pelo sertanista português João Gonçalves da Costa, nascido em Chaves em 1720, no Alto Tâmega, na região de Trás-os-Montes que com dezesseis anos de idade, veio para o Brasil a serviço de D. José I, Rei de Portugal, com a missão de conquistar as terra ao oeste da costa da Bahia.
Anteriormente já havia lutado ao lado do Mestre-de-Campo João da Silva Guimarães, líder da Bandeira responsável pela ocupação territorial do Sertão, iniciada em 1752. A origem do núcleo populacional está relacionada à busca de ouro, à introdução da atividade pecuária e ao próprio interesse da metrópole portuguesa em criar um aglomerado urbano entre a região litorânea e o interior do Sertão. Portanto, integra-se à expansão do ciclo de colonização dos fins do século XVIII.

Lindoya.

Lindoya.

Quando se fala em história de um povo, a cidade de Vitória da Conquista possui uma das mais belas. Não é uma história simples, acomodada, pobre em acontecimentos. Mas, antes de tudo, uma história rica, contundente, marcada por fatos que não saem da cabeça das pessoas, principalmente daquelas de mais idade. Sangue, violência, bondade, sabedoria, benevolência, trabalho, poesia, fatos hilariantes, dinamismo, coragem, arrojo, visão, fé. São alguns dos ingredientes preponderantes na história de nossa cidade.

Clube Social.

Clube Social.

Não se trata de sermos saudosistas, preso ao passado. O que nos faz voltar ao passado para pesquisar nossa história ou qualquer outra história nos ajuda a compreender nosso presente e refletir, deduzir e produzir o nosso futuro. Entendo o porquê de ter escutado muitas pessoas dizerem que os anos 50, 60 e 70 foram os melhores anos para se viver, pois quando olhamos para uma fotografia antiga nós resgatamos aquele elo entre a foto e a emoção gerada por ela, relativa ao período vivido. Na grande maioria das vezes, são lembranças boas e positivas porque nos ligamos aos saudosos valores da época, momentos felizes, a paz da época, o encontro na praça ou nas portas das casas para um bate-papo descontraído no final da tarde, a música que marcou uma época, a serenata, o serão, uma brincadeira, a disciplina, o respeito. Enfim, nos lembramos de algo que era bom, mas que na época não valorizamos e que sentimos falta agora.

Alguém pode ver as fotos e achar que as informações são superficiais, mas a depender do interesse e da curiosidade de cada um, talvez cada foto seja apenas o ponto de referência para uma pesquisa mais aprofundada. Têm-se a possibilidade de se escrever vários livros com temas inspirados em várias fotos. Poderíamos analisá-las, tendo como base o que representava naquele momento e com certeza quem quiser aprofundar algum tema irá encontrar várias possibilidades.

Curiosidades
:

Um Príncipe Alemão em Conquista. Como um príncipe veio parar aqui?
No ano de 1817, passou pelo então Arraial da Conquista vindo de Minas Gerais um príncipe Alemão Maximiliano Alexander Philip nascido no palácio de Wied Neuwied, em 1782. Chegou à Paraíba em junho de 1815, em julho desembarca no Rio de Janeiro. Em março de 1817 passou pelo Arraial da Conquista, naturalista e conhecedor de botânica, encontrou na região de Conquista espécimes raras da flora e fauna dos trópicos, que foram recolhidas e levadas para a Alemanha, onde foram depositadas em museus e universidades daquele país.
Ele conta que encontrou no Arraial o capitão-mor Antonio Dias de Miranda, filho de João Gonçalves da Costa que ficou alojado em sua casa. O Arraial de Conquista é quase tão importante quanto qualquer vila do litoral. Contando-se aí umas quarenta casas baixas e uma igreja em construção por conta de João Gonçalves da Costa e do capitão-mor Miranda, já que os moradores são pobres. A venda de algodão e a na geração de recursos para os moradores. Grande parte dos moradores do Arraial compõe-se de trabalhadores e de rapazes desocupados, que ocasionam muitos distúrbios, pois não há polícia nesta localidade. A malandrice e uma inclinação imoderada para as bebidas fortes são traços distintivos do caráter desses homens; daí resulta disputas e excessos freqüentes que torna detestável esse lugar, de má fama para as pessoas mais sérias e consideradas, que vivem em suas fazendas espalhadas em torno. Fomos freqüentemente incomodados por pessoas embriagadas que nos aborrecia. Trazendo cada um, como é perigoso costume da terra, um estilete ou um punhal na cintura, esses homens grosseiros e imorais, que nenhuma espécie de vigilância contém freqüentes assassínios e outras violências. Eis porque nunca será demais recomendar aos viajantes que procedam com a máxima cautela em Arraial da Conquista, para evitarem, para si e para o seu pessoal, aborrecimentos muito sérios.
Em novembro de 1817, retorna para a Europa, levando consigo o índio civilizado, de nome Quack, que o acompanhou durante sua expedição. Em 1840 foi eleito membro da Academia de Ciências Prussianas
Estes são alguns relatos do Príncipe sua passagem por Conquista. Visitando Mucugê me chamou a atenção a informação de que outros dois príncipes alemães que passaram por lá, então já era normal a visita deles aqui no Brasil na época.

Os índios:

As nações, Pataxó, Ymboré (Aimoré – Botocudos) e Mongoió foram os primeiros habitantes da uma vasta região denominada “Sertão da Ressaca” que era delimitada pelos rios das contas, Pardo e Jequitinhonha. Cada nação indígena tinha suas características:

Ymboré ou Botocudo:

BOTOCUDOSViviam em uma extensa faixa de terra entre Minas Gerais, Ilhéus, Porto Seguro e Espírito Santo. Tinham como característica a capacidade de se dividirem em inúmeros subgrupos e se dispersarem em extensas áreas, dando a impressão de serem em maior numero do que realmente eram. Ganhou dos portugueses o nome de Botocudo pelo fato de usarem nas orelhas e nos lábios um ornamento chamado botoque, que eram colocados em rituais. Eram considerados canibais, mas não há nada que comproves essa hipótese.
Segundo descrição do príncipe Maximiliano, eles tinham a cor avermelhada, cabelos fortes e pretos, duros e lisos, considerados bravos e muito temidos lutaram e resistiram até o seu extermínio, pela manutenção do seu território. Eram nômades, viviam da caça, pesca, frutos e raízes. Gostavam de pintar o corpo e usavam o urucum e o jenipapo, gostavam do vermelho e preto. Às vezes, usavam pinturas longitudinais, colorindo um lado de preto e deixando o outro sem pintura para representar a noite e o dia.

Pataxó:

Habitavam a área entre os rios Cachoeira e Pardo. Eram nômades, andavam em pequenos grupos sendo uma das últimas tribos a serem dominadas pelos portugueses após constantes ataques que provocaram a redução da tribo.
Não tinham aparência física diferentes, de estatura mediana, não se pintavam e quando pintavam faziam traços nas cores vermelho e preto. Ainda segundo o príncipe “os Pataxós se aliavam contra os Ymborés e tratavam os prisioneiros como escravos. Eram desconfiados e reservados, e não aceitavam que os filhos fossem criados entre os brancos, como as outras tribos o fazem prontamente”.
Viviam da caça e frutos e o animal predileto para sua alimentação era o macaco. Não davam muita importância para a pesca.
Mongoió:

Viviam entre os rios Pardo, Jequitinhonha e das Contas. Eram fortes de estatura mediana de pele morena. Também foram colonizados, porém, lutaram bravamente para defender seu território. Viviam da caça, da pesca e diferente das outras tribos, os Mongoiós praticavam a agricultura, plantavam batata-doce, feijão, banana, milho, melancia etc. O plantio era realizado no período das chuvas. Também gostavam de pintar-se com a s cores pretas e vermelhas. Com o contato com os missionários passaram a pintar a imagem da cruz na testa. Com o aumento da colonização os mongoiós passaram a vender seus produtos às tribos e as aldeias vizinhas.
As festas eram regadas a cauim bebida à base de milho, feita pelas mulheres. Curiosamente, elas tinham que mastigar o milho. Após a mastigação, o milho era cuspido em um recipiente feito do tronco da barriguda preparado para esta finalidade. Acrescentava-se água fervendo e levava ao fogo.

Banquete da morte:

Conta o príncipe que: “João Gonçalves depois de ordenar a seus homens que tivessem as armas prontas, convidou todos os índios para uma festa e, enquanto confiadamente se entregavam à alegria, foram cercados de todos os lados e quase todos mortos”.

Construção da Igreja Matriz:

Igreja_MatrizA primeira Igreja Matriz foi iniciada por João Gonçalves da Costa em 1803. Foi coberta em 1806 conforme se conclui pelas inscrições com esta data, quando da sua demolição em 1932. Em 15 de agosto de 1809, ainda inacabada, foi realizada a primeira missa por um Padre da vila de Rio Pardo (Minas Gerais).

Em março de 1817, como registrou o Príncipe maximilian, ainda estava em construção. Foi inaugurada sem os altares e decoração em 1823. A pintura interna e decoração do teto foram terminadas em 1848, pelo pintor italiano João Pirasoli. Portanto, 45 anos depois. Por certo, a demora na construção se deve às dificuldades no transporte de materiais vindos da capital em lombo de burros.
Em 31 de maio de 1919, o intendente Ascendino Melo sanciona a lei de desapropriação da Igreja em função das rachaduras das paredes que causavam preocupação. No entanto, a demolição só aconteceu em 1932.
Em 15 de agosto de 1932 foi lançada a pedra fundamental para a construção da nova Igreja. Em edição de seis de agosto de 1944 o Padre Palmeira publicou no jornal “A Conquista” sob sua direção, o artigo “A Nova Igreja Matriz”. “É um templo soberbo cuja construção se deve a operosidade e tenacidade de um frade: Frei Egídio de Elcito”.
“Quando pode uma vontade que quer, quando essa mesma vontade, nos seus apelos insistentes, faz eco na consciência esclarecida do povo católico”.
“A futura Catedral de Conquista nasceu da energia de um homem alimentada pela generosidade de um povo”.

Cinema:

Prédio_onde_ funcionava_o_Cine_Íris

Prédio onde funcionava o Cine Íris.

O cine Íris nasceu por conta de querelas políticas, na época se alguém fosse ligado a uma facção partidária e criasse uma filarmônica, por exemplo, logo era identificada como pertencente ao grupo tal e, assim, o adversário tratava logo de fundar a sua. Por isso, tínhamos a “Aurora”, interada ao Meletes, e a “Vitória”, dos Peduros. Se fosse jornal, acontecia a mesma coisa: “A Palavra” defendia os Peduros e “O Conquistense” aos Meletes. Com o cinema aconteceu assim: um senhor de nome Ubirajara chegou a Conquista e adaptou um cinema em um galpão existente no beco que hoje tem o nome de travessa Lima Guerra. Os freqüentadores levavam cadeira e bancos para se sentarem. Ubirajara aproximou-se dos Peduros e seu cinema tornou-se também Peduro. Maneca Moreira, chefe dos Meletes e muito rico, construiu o Cine Iris, com trezentos e cinqüenta cadeiras. Um luxo para a época, pois o prédio foi edificado para este fim, onde funcionava a Radio clube na Pç. Barão do Rio branco.

Mudanças de nomes:

Vitória da Conquista até chegar a este nome, passou por outros três nomes: em 1806 era conhecida como ARRAIAL DA CONQUISTA ou ARRAIAL DA VITÓRIA; em 09/11/1840 passou a ter o pomposo nome de IMPERIAL VILA DA VITÓRIA com a posse da primeira Câmara. Com a chegada da República em 1889, ficou proibido qualquer nome que lembrasse a época da Monarquia, por isso em 1891 passou a ser chamada de CIDADE DA CONQUISTA. Finalmente, em 1943 passou definitivamente a ser nossa “VITÓRIA DA CONQUISTA”.

Houve outra tentativa de mudar o nome para Saracota ou Conquistânea.
O saudoso historiador Mozart Tanajura conta em seu livro História de Conquista, que em 1945 foi criado o conselho Nacional de Revisão para fazer a revisão de nomes de cidades que tivessem dois nomes ou nomes que trouxesse insatisfação. Em Vitória da Conquista, foi criada uma comissão para esta finalidade que propôs ao então prefeito da época o Sr. Gerson Sales que mudasse o nome de vitória da Conquista para SARACOTA ou CONQUISTÂNEA. Graças à intervenção de Bruno Bacelar de Oliveira, que fez ver ao prefeito a origem e importância do nome de Vitória da Conquista conseguindo assim que o nome de nossa cidade fosse mantido. Em pesquisa sobre o significado do nome saracota, não obtive êxito. No entanto, a única cidade no mundo com este nome fica no Chile.

Passagens do Pe. Palmeira:

O padre Palmeira, nascido em Alagoas, político por vocação, de grande cultura humanista, orador nato, tanto sacro quanto profano, polêmico, tinha muita presença de espírito e raciocínio rápido e irreverência.
Foi Secretário de Estado em 1963 no governo de Lomanto Júnior, ocupando a pasta da Secretaria de Educação e Cultura. Com o Golpe Militar de 64, e a aproximação do governador das forças dominantes, acabou perdendo o cargo de secretário. Conta o Sr. Sebastião Leite, que após ser exonerado do cargo de secretário, o governador, que tinha muito apreço pelo Pe. Palmeira enviou um emissário até a casa do Padre, com a missão de convidá-lo para, na primeira oportunidade, comparecer no Palácio do Governo para tomarem um uísque. O emissário, após conversas de praxe, assim procedeu, fez o convite como o governador pedira. O Pe. Palmeira então respondeu da seguinte forma: diga ao governador que eu “uisqueci”.

João Torres me apresentou a crônica de Antonio José Nascimento contando sobre a polêmica e mais picante passagem do Padre Palmeira, foi com o Prefeito Edvaldo Flores. Em 1958, o Padre solicita do prefeito a retirada de um jumento morto em frente ao Ginásio de Conquista. Obteve como resposta que o jumento não seria retirado enquanto o padre não encomendasse o corpo; no dia seguinte fez a tréplica: “como posso benzer o corpo, se a família não pediu?”

Repetindo certo candidato a Deputado e ex-prefeito de uma cidade, saiu com esta: “Povo de minha terra, se aqui tem escolas criadas, foi eu quem as criôlas; se tem ruas calçadas, foi eu quem as calçoulas, mas se não me elegerem Deputado, eu saio da vida pública e volto para a privada”.

Quando candidato a Deputado Estadual, ao fazer um comício em Itambé, a esposa do candidato a Prefeito pediu sua orientação para falar em público alegando ser muito tímida. Num repente falou: “pegue o microfone e solte o verbo, basta falar igual e no mesmo tom de quando você está brigando com seu marido”.

Como homem público ganhou muitos apelidos saídos dos palanques dos adversários, como: Homem de saia, urubu de saia, agourento, corvo, etc. Mas revidava no mesmo tom, apelidando os adversários de: Engole ele paletó, Gavião de Penacho e outros.

De outra vez um vereador lançou um panfleto afirmando que o Pe. Palmeira era pai de um garoto e se recusava a aceitar a paternidade. O Padre Respondeu: “Dizem por aí que eu sou um homem de saia, mas estão enganados, debaixo desta saia tem um pijama, debaixo deste pijama tem uma cueca, e debaixo desta cueca tem uma PALMEIRA”.

Caixeiros Viajantes:

Caixeiros_viajantesVitória da Conquista, sempre foi um entreposto comercial, favorecida pela sua localização geográfica. Antes da construção da linha tronco da Rio-Bahia, os comerciantes (chamados de CAIXEIROS) já se destacavam no crescimento da cidade e as lojas eram supridas através de lombos de burros conduzidos pelos Caixeiros Viajantes, conhecidos no passado como Cometas, que foram de grande importância para o desenvolvimento da cidade, nos tempo difíceis. Por onde passavam, eram recebidos com todas as honras, eram questionados sobre as notícias da Capital, os coronéis queriam saber sobre a política, além de comprarem jornais, mesmo que atrasados. Cada viajem durava em média sessenta dias. Eles se apresentavam a rigor em todos os momentos, não abrindo mão do terno branco e bem engomado, além de chapéu e bengala.

As firmas fornecedoras ao contratarem os viajantes, procuravam os solteiros de boa aparência e bem falantes, por isso os cometas impressionavam as filhas solteiras dos ricos coronéis e acabavam se casando.
Com o tempo, passaram a acompanhar as mercadorias pela via férrea, a “Maria Fumaça”, até as cidades chaves onde passava o trem: santo Antônio de Jesus, Jequié, Brumado, Senhor do Bonfim, Juazeiro, etc., a partir daí seguiam com as tropas para atendimento dos clientes.
A festa dos cometas no final dos anos 40 foi um encontro dos caixeiros viajantes de caráter nacional, com a presença de muitos políticos e autoridades da época. Realizada no Clube Social, vizinho ao Hotel Albatroz, teve a presença da famosa cantora Emilinha Borba.

Marco: construção da Rio-Bahia. Era o sonho de todos. Após sua conclusão a população dobrou, o comércio tomou impulso, a cidade progrediu, o transporte ficou fácil, a ligação com o sul do país facilitou a chegada de produtos industrializados, e ganhamos o título de “Capital do Sudoeste da Bahia.

BATALHAS:

Barulho do Tamanduá:

No ano de 1895, Vitória da Conquista presenciou uma das lutas mais violentas de sua história entre as famílias do Cel. Domingos Ferraz de Araújo e da viúva Lourença de Oliveira Freitas, ambas com ligações de parentesco.
Um acontecimento fútil, a morte de uma vaca do Coronel, que teria sido morta pelos filhos de Lourença (Calisto, Sérgio e Gasparino), ou por causa de uma quarta de mandioca, não se sabe ao certo, foi o motivo inicial do conflito. Afonso Lopes Moitinho, genro de Domingos Ferraz, foi agredido pelos filhos da viúva. Tempos depois, investido de autoridade policial saiu em perseguição aos irmãos e acabou por matar Sérgio e Gasparino que se encontravam enfermos em sua casa, sob a legação de resistência à prisão.

Afonso e Calisto tinham temperamento violento e de muita coragem e não mediam as conseqüências de seus atos.
Assassinados os filhos, Lourença foi à cidade implorar por justiça conduzindo os corpos. Por não ter sido ouvida em testemunho policial, deixou-os insepultos no cemitério local, dizendo: “vocês mataram os meus filhos, agora coma-os.”
Nesse tempo Calistinho, como era conhecido, havia fugido para as Lavras Diamantinas, onde conseguiu a amizades de alguns jagunços que lhe seriam úteis na vingança. Trouxe-os consigo a Conquista. Hospedou-os em Campo Formoso na casa do Major Martins, que era seu parente. Conseguiu com ele 50 homens armados. Saíram à noite e chegaram ao amanhecer na fazenda Tamanduá onde o Coronel Domingos residia, atacando-a nas primeiras horas do dia 20 de outubro de 1895.
Pegado de surpresa, mas com alguns jagunços às suas ordens, o fazendeiro resiste durante todo o dia. Sem munição e cercada por todos os lados, a residência é invadida. O jornalista Aníbal Viana contou que “Calisto e seus companheiros aproximaram ferozmente da Casa Grande e invadiram assassinando a todos com tiros, facadas e facãozadas, encontravam no interior da casa cerca de 22 pessoas, ficando o chão coberto de sangue”.

cem._do TamanduáDepois da tragédia em que morreram quase todos, já que dois conseguiram escapar, o casarão foi saqueado levando tudo o que encontraram de valor. O casarão da fazenda foi transformado em cemitério e lá estão, ainda hoje, as sepulturas e os restos mortais da família.

Calistinho após a vingança dispersou os jagunços e fugiu para Minas Gerais, onde foi perseguido e morto a mando de parentes da família que foi dizimada.
A tragédia do Tamanduá, como ficou conhecida na crônica sertaneja, teve repercussão regional, tendo sido lembrada durante muito tempo pelos poetas nordestinos que sobre o assunto escreveram Abcês e cantos romanceados.

Peduros e Meletes:

sobradoDe 1916 a 1919, apesar das famílias se constituírem numa endogamia, eminentemente rural, houve vários desentendimentos entre o Cel. José Fernandes de oliveira Gugé, que liderava o poder dominante, e o Cel. Manuel Emiliano Moreira de Andrade, Maneca Moreira, que liderava a oposição.
A imprensa, surgida em 1910, ajudou a acirrar os ânimos com publicações políticas contundentes entre intelectuais, a exemplo de Manoel Fernandes de Oliveira, Maneca Grosso, que escrevia para o jornal “A Palavra”, e assim ia-se definindo os dois grupos de forma acirrada.

Com o falecimento do Cel. Gugé em cinco de agosto de 1918, tido como pacificador, as divergências aumentaram e briga armada foi difícil de ser evitada.
O Juiz de Direito da Comarca era acusado de agir de maneira imparcial, conduzindo as decisões sempre favoráveis aos Meletes, grupo do qual se achava ligado pelo diretório político.

A luta armada se deu na manhã do dia 19 de janeiro de 1919. Os homens do sobrade de Paulino Fernandes, foi demolido para a construção do Banco do Brasil, atiravam contra a trincheira dos Peduros em frente ao sobrado. O tiroteio durou o dia todo. Antes, houve troca de tiros onde morreu o fazendeiro Teotônio Andrade e saiu ferido Tibúrcio Freitas. Também morreram vários jagunços.

Como a luta continuava, um grupo de pessoas composto pelas Senhoras Laudicéia Gusmão, Henriqueta Prates dos Santos, Eufrosina Freitas Trindade, Fulô da Panela, e Joana Angélica Santos (viúva do Cel. Gugé) saíram em meio à contenda empunhando bandeira branca, apoiadas pelos Senhores Dr. Crescêncio Silveira, Dr. Nicanor Ferreira, Agripino Borges, José Maximiliano Fernandes Oliveira, Cel. Deraldo Mendes Ferraz e o Major Belizário Mendes, segundo narra Anibal Viana, intercederam aos combatentes e conseguiram por fim à luta mediante certa condição: a do Juiz “sair da cidade montado em um boi” como castigo às suas provocações. Novos pedidos demoveram os Peduros da humilhação imposta ao Juiz, e ele subiu a serra do Piri piri (Piri em Tupi significa brejo) montado em um cavalo rumo a Salvador. Maneca Moreira transferiu-se com todos seus familiares para a cidade de Poções onde ficou residindo, não antes de terem assinado um acordo de paz.

Pacto de não matar:

COMPROMISSO_DE_NÃO_MATARO ódio, no entanto, persistiu entre Peduros e Meletes por algum tempo, até que ambos resolveram fazer as pazes, assinando um acordo, em 21 de janeiro de 1919, de acordo transcrição abaixo, para que não houvesse mais entre as duas partes qualquer tipo de vingança.

Nós abaixo assinados temos firmados a bem da paz e tranqüilidade de Conquista, evitar toda espécie de vingança contra qualquer cidadão, ficando sujeito as penas da lei e sem ampara de nenhum de nós todo aquele que transgredir esta clausula.
Cidade de Conquista, 21 de janeiro de 1919.
Zeferino Correia de Mello, Manoel Fernandes de Oliveira, Deraldo Mendes Ferraz, Virgílio Mendes Ferraz, Manuel de Oliveira Santos, Antonio da Silva Lemos, José Correia de Mello Freitas, Ascendino dos Santos Mello, Plácido Mendes Gusmão, José Wenceslau dos Santos Silva, Justino Gusmão, Cornélio da Silva Gusmão, José da Silva Gusmão, Manoel Januário de Andrade, João Gusmão de Oliveira, Manuel Emiliano Moreira Andrade, Rogério Ferraz Gusmão, João Fernandes de Oliveira Santos, Pompílio Nunes de Oliveira.
Reconheço verdadeiras as dezenove firmas supra que dou fé. Cidade da Conquista, 22 de janeiro de 1919.
Tabelião de Notas intº Joaquim Martim Bastos.

Origem dos nomes:

Conta Anibal Lopes Viana, em sua Revista Histórica, que certo dia um amigo e correligionário de Cel. Maneca Moreira atravessava a antiga Rua Grande, montado em um cavalo, conduzindo um melete, espécie de Tamanduá. Partidários do Cel. Gugé começaram a vaiar o cavaleiro e este irritado gritou: “Os amigos do Cel. Maneca Moreira são como meletes que são bichos fortes, de coragem e quando agarram não soltam mais. Vocês são uns peduros de raça ruim, sem preço e sem valor”. Deste dia em diante quem era partidário do Cel. Maneca Moreira ficaram com o nome de “Meletes” e os do Cel. Gugé, com o nome de “Peduros”

Desenvolvimento:
A região de Vitória da Conquista, compreendendo os municípios de Barra do Choça, Planalto e Poções, devido à localização em uma altitude próxima de 1.000m acima do nível do mar e por não ter geadas, sempre foi um produtor de café.
Entretanto a partir do ano de 1975 esta cultura agrícola foi incrementada com financiamentos subsidiados pelos bancos oficiais, passando a região a ser a maior produtora do norte e nordeste do Brasil.
A partir do final dos anos 1980, o município realça sua característica de pólo de serviços. A educação, a rede de saúde e o comércio se expandem, tornando a cidade a terceira economia do interior baiano. Esse pólo variado de serviços atrai a população dos municípios vizinhos.

Bibliografia:
Ymboré, pataxó, Kamaka. A presença indígena no planalto da Conquista.
Tanajura, Mozart. História de Conquista: crônica de uma cidade.
Viana, Aníbal L. Revista Histórica

domingo, 3 de janeiro de 2010

EM BUSCA DE UM CINEMA ROMANTICO



Por André Setaro



O fato é que, com o surgimento dos novos suportes, com o avanço da tecnologia, que possibilita a visão de filmes “em qualquer lugar”, a magia das salas exibidoras desapareceu. As imagens em movimento se tornaram rotineiras. Nasce-se, hoje, vendo-as no televisor acoplado na parece do hospital enquanto ainda se está a sair para a vida. Todo mundo pode, atualmente, fazer um filme. Faz-se filmes como antigamente se fazia poesias. Mas isto não quer dizer que eles sejam poéticos (alguns podem sê-los).
E o velho cineclube? Ainda teria a mesma função, o mesmo fascínio, a mesma curiosidade? Em alguns lugares, as sessões, por assim dizer, cineclubistas, ainda funcionam, a exemplo das concorridas sessões do Comodoro, patrocinadas pelo cineasta Carlos Reichenbach na capital paulista.
Mas, creio, são exceções que fogem à regra.
O “negócio”, nos dias que correm, se encontra em baixar filmes da internet. E, com isso, aquele reverência que se tinha, diante das imagens em movimento, se perdeu no tempo. As coisas mudam, porém, e, com elas, a recepção ao filme se tornou um ato rotineiro sem o tão necessário encantamento e assombro. Na verdade, está a acontecer uma revolução no modo de ver o filme, e esta revolução tem que ser assimilada, compreendida. O cinema que se tinha, nos moldes de antigamente, está morto.
A sentença de morte foi dada poeticamente por “Cinema Paradiso” (“Nuevo Cinema Paradiso”, 1989), de Giuseppe Tornatore. E, também, na mesma época, por “Splendor”, de Ettore Scola. Mas, e a respeitar aqueles que gostam de ver filmes na telinha do computador, devo dizer, em alto e bom som: recuso-me, peremptoriamente a ver filmes na telinha do aparelho informático. Vejo-os muitos em DVD. Pode acontecer, em alguns casos, para falar a verdade, e a verdade verdadeira no sentido kantiano, de assistir a filmes baixados na internet se convertidos em DVD, mas que sejam obras raras, que não as tenha visto e que sejam importantes.
Com o advento do VHS, do laser-disc, do DVD, e, agora, com a possibilidade de se baixar quase tudo da internet, a pergunta que se quer fazer é a seguinte: ainda haveria condições de ser ter um clube de cinema nos moldes do de Walter da Silveira nas décadas de 50 e 60 em Salvador?
Naquela época, difícil era se ver certos filmes, que ficavam restritos às cinematecas. O mercado exibidor se restringia aos lançamentos e as constantes reprises de filmes de sucesso. Como, nos anos citados, assistir aos filmes neo-realistas, aos do expressionismo alemão, às obras mais independentes de cinematografias desconhecidas, às obras do realismo poético francês, à vanguarda da estética da arte muda? O único jeito era a viagem e, assim mesmo, o mais certo seria ao exterior, às cinematecas de Nova York ou a de Paris, além de outras importantes da Europa. Aqui no Brasil, existiam, mas ainda incipientes, as cinematecas do Rio e de São Paulo (esta com um acervo mais versátil). Salvador não tinha nenhuma possibilidade de constituir uma cinemateca.

A importância de Walter da Silveira (que boa parte da nova geração não sabe quem foi, apesar de nome de sala alternativa nos Barris) foi justamente a de, com a fundação do Clube de Cinema da Bahia, trazer filmes especiais, essenciais à evolução da linguagem e da estética cinematográficas. Walter da Silveira fez ver, aos baianos de província (mas uma província muito agradável bem diferente da cidade engarrafada de hoje), que o cinema, além de um bom divertimento, era, também, a expressão de uma arte.
O próprio Glauber Rocha, quando de sua morte, em novembro de 1970, em artigo para o Jornal da Bahia, confessou que o ensaísta fora seu grande mestre, que aprendeu a ver cinema através das palavras de Walter da Silveira. E conta, num artigo, o esporro que este lhe deu, quando, numa exibição de "O encouraçado Potemkin", numa sessão matutina no cinema Liceu, conversava, durante a exibição, com um amigo. Walter, percebendo o "arruído", deu-lhe tremendo esporro, segundo palavras do próprio Glauber que, conta, nunca mais falou durante a projeção de um filme, tal a indignação do mestre diante do jovem tagarela.

Atualmente, no entanto, com a facilidade existente, pode-se ver um raro filme antigo, a exemplo de "Ordet, de Carl Theodor Dreyer, famoso cineasta dinamarquês, em boa cópia em DVD. Este filme, há poucos anos, somente seria possível ser contemplado na cinemateca de Henry Langlois, em Paris. Outro dia, vim a saber, um conhecido baixou da internet, em cópia decente e legendada, "As estranhas coisas de Paris" ("Elena et les hommes", 1956), com a bela Ingrid Bergman e Jean Marais, filme difícil de se ver (nunca passa na televisão e não tem no disquinho).
Há dois anos, tentou-se implantar um cineclube na Faculdade de Comunicação. Com excelente programação. Retrospectivas de Kubrick, Buñuel etc. Mas os alunos, antes de entrar, perguntavam se os filmes estavam disponíveis em DVD. E davam meia-volta, volver.

Uma vez no Rio, ao saber da exibição de "Ladrões de bicicleta" na Cinemateca do Museu de Arte Moderna, em única sessão, ainda que mal tivesse chegado à cidade, corri para lá. Finda a exibição, chuva torrencial fiquei encharcado e voltei a pé para o hotel (a cidade engarrafada, tudo parado). Nos tempos atuais, faria o mesmo sacrifício? Claro que não, pois o DVD de "Ladri di biciclette" está disponível não somente para ser adquirido, mas também nas melhores locadoras da cidade.

Qual a função do cineclubismo nos dias atuais? Walter da Silveira, por exemplo, sobre ser um dos maiores ensaístas de cinema do Brasil (na Bahia ninguém nunca lhe chegou perto), era um homem, verdade se diga, à antiga, de tom grave, circunspeto, com uma gestualística bem diversa da juventude atual e, mesmo, dos menos jovens que atualmente constituem o meio circundante e intelectual, universitário. A figura de Walter faz lembrar aqueles antigos mestres universitários, principalmente os professores da Faculdade de Direito (no acento vocal, nas pausas, na maneira de expor o assunto, um "magister dixit").

Mas acontece que o mundo mudou e, com ele, a cultura. Houve um papel importantíssimo exercido por Walter da Silveira. Os realizadores que se aventuram na captação das imagens em movimento são contemporâneos de um cinema digital. Faz-se filmes até pelos telefones celulares. O Clube de Cinema da Bahia, portanto, não poderia existir - nem teria razão de ser - nesta chamada contemporaneidade. A própria psicologia de recepção da obra cinematográfica mudou. Bem, são reflexões ao acaso.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

TOCAIA NO ASFALTO É RESTAURADO


Por André Setaro

Escrevi hoje, na minha coluna semanal da revista eletrônica Terra Magazine, um comentário crítico ao filme baiano Tocaia no asfalto (1962), de Roberto Pires, que pode ser lido no seguinte endereço: http://terramagazine.terra.com.br/

Com seu negativo em processo de deterioração, Tocaia no asfalto foi inteiramente restaurado e vai ser exibido, nesta cópia luminosa e novíssima, quarta, 16 de dezembro, na Sala Walter da Silveira, que fica à rua General Labatut, nos Barris, às 19 horas. Quem mora em Salvador, uma oportunidade e tanto para ver ou rever este filme, que considero o melhor já feito dentro do itinerário de longas do cinema baiano.O talento de Roberto Pires é inegável e pode ser considerado um dos melhores artesãos do cinema brasileiro. Pires foi o responsável pelo primeiro longa metragem feito na Bahia: Redenção, em 1959, que se encontra sendo devidamente restaurado. Pires também realizou, no apogeu do Ciclo Baiano de Cinema, A grande feira (1961). Depois, retirou-se para o Rio de Janeiro para continuar a sua carreira (Máscara da traição, Crime no Sacopã etc).

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

TRUFFAUT: CINEASTA TERNO E AFETUOSO


Por André Setaro

Ao contrário do cinema de seus companheiros da Nouvelle Vague - Godard, Rohmer, Chabrol, Rivette, Resnais... racionalista e cerebral, o de François Truffaut é feito com a emoção e o coração, com extrema sensibilidade e uma simpatia incomum pelos seus personagens, que são tratados com ternura, generosidade e afeto. O crítico ferrenho, radical, intransigente, das revistas Cahiers du Cinema e Arts et Spetacules, que ataca em seus escritos o cinema clássico francês e o realismo psicológico de acadêmicos como Claude Autant Lara, Julien Duvivier, entre outros, sofre uma espécie de metamorfose quando passa a realizar filmes, transformando-se num cineasta terno e amável.

Os Incompreendidos (Les Quatre Cents Coups, cuja tradução literal é Os Quatrocentos Golpes), além de inaugurar a Nouvelle Vague – juntamente com Acossado, de Godard, Hiroshima, de Resnais... -, dá início à carreira de Truffaut como realizador de longas. E, neste 2009, a distância deste filme é de exatos 50 anos. Aqui também começa o ciclo dedicado a Antoine Doinel (sempre interpretado por Jean Pierre Léaud), um personagem com evidentes elementos autobiográficos, através do qual aborda o rito de passagem da infância à idade adulta. É a nostalgia da adolescência que Truffaut reflete nos filmes do ciclo Doinel, a fugacidade do tempo e a ânsia de amar, a chegada a idade adulta, o casamento... (Antoine et Colette, 1982, episódio de O Amor aos Vinte Anos/L’Amour a vints ans; Beijos Proibidos/Baisers Volés, 1968, Domicílio Conjugal/Domicile Conjugal, 1970, e; Amor em Fuga/L’Amour en Fuite, 1978).

(Em Os Incompreendidos, Truffaut, avant la lettre, considerando a época, alude à Nouvelle Vague e a seu amigo e colega Jacques Rivette, quando os pais de Antoine – que, por sinal, nos outros filmes do ciclo estão sempre ‘indo ao cinema’ – decidem ir ver Paris Nous Appartient, de Rivette, filme emblemático, apesar de pouco conhecido do movimento francês, e, de volta, no automóvel, consideram-no ‘muito bom’ – melhor homenagem impossível).
Romântico, sem, contudo, abandonar a visão irônica e dolorosa das relações afetivas, Truffaut tem a sua obra-prima já na terceira incursão longametragista: Uma Mulher para Dois/ Jules et Jim (1961), crônica de uma relação triangular (Oskar Werner, Jeanne Moreau...) baseada no texto literário de Henri Pierre Roché, autor que lhe serviria de inspiração para realizar, dez anos depois, abordando a mesma temática da dificuldade de amar, As Duas Inglesas e o Continente/ Les Deux Anglaises et le Continent (1971). O problema da comunicação no amor, aliás, do amor impossível, en fuite, é uma constante na filmografia de Truffaut, como revelam A História de Adele H/ L’Histoire de Adele H (1976), com Isabelle Adjani, A Mulher do Lado/ La Femme de la Cote (1981), entre outros.

Se seus colegas da Nouvelle Vague procuram elaborar uma linguagem que desconstrói o discurso cinematográfico tradicional, revertendo os cânones da lei de progressão dramática griffithiana, François Truffaut não pretende nunca em seus filmes dissolver a estrutura lingüística, mas, ao contrário, busca desesperadamente a fluência narrativa, o toque mágico capaz de envolver o espectador a fazê-lo pensar que não está no mundo’. É verdade que brinca com a metalinguagem, mas num sentido de reverência e ao cinema como em A Noite Americana/ La Nuit Americaine (1973), belíssima homenagem ao processo de criação cinematográfica onde Truffaut comparece como ele mesmo no papel de um diretor que faz um filme. O filme dentro do filme, portanto.

Outra vertente temática na obra truffautiana é a dominante policial, influência, na certa, de sua admiração por Alfred Hitchcock – seu livro de entrevista com este, Hitchcock/Truffaut, da Brasiliense (e, agora, em outra edição pela Cosac ou Companhia das Letras), é, simplesmente, uma aula magna de cinema. Há Hitchcock em Fareinheit 451 (1966), que faz na Inglaterra, com o mesmo Oskar Werner de Jules et Jim, baseado na ficção-científica de Ray Bradbury. Outra obra alusiva ao mestre é A Noiva Estava de Preto/ La Mariée Était em Noir (1967), com Jeanne Moreau ou, mesmo, Tirez sur le Pianiste, segundo filme (1960), e A Sereia do Mississipi/ La Sirene du Mississipi (1969), no qual declara, através das imagens em movimento, a sua paixão momentânea, Catherine Deneuve, que trabalha, aqui, ao lado de Jean Paul Belmondo. E no seu canto de cisne De Repente num Domingo/ Vivement Dimanche (1984), cujo ‘claro/escuro’, proposital, vem em auxílio de uma proposta estilística em função do film noir francês. Sem esquecer o elaborado, como mise-en-scène, Um só pecado (Le peau douce, 1963).Que, revisto agora, considero um dos melhores filmes do cineasta.

Autor, porque dono de um estilo próprio, marcante, ainda que com um universo temático diversificado, François Truffaut, na sua filmografia, envereda por assuntos diversos, a exemplo de O Garoto Selvagem/ L’Enfant Sauvage (1970), filme sobre a luta de um médico, no século XIX, para ‘domar’, um menino bárbaro criado sem contato com a civilização – influência possível para Werner Herzog em O Enigma de Kaspar Hauser. Na Idade da Inocência/ L’Argent de Poche (1976), experiência na qual, repetindo Jean Vigo (Zero de Conduite), o universo que retrata é constituído somente de crianças. Sem esquecer O Último Metrô/ Le Dernier Metro (1980), uma volta ao passado, Segunda Guerra Mundial na França ocupada, para valorizar, numa situação-limite, a importância dos pequenos gestos.

Em todos os filmes de François Truffaut, um denominador comum: a narrativa que sobrepuja a fábula, a doce fabulação que advém de um sentido preciso de mise-en-scène, o touch truffautiano, sempre terno, apaixonado, capaz de levar ao espectador o prazer do autor com o que está a filmar e o prazer, imenso, de se assistir ao que se está a ver.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

NO TEMPO DO CINEMASCOPE

Por André Setaro
Em 1953, a Fox, temerosa da concorrência da televisão, que fechou metade das salas exibidoras dos Estados Unidos, lançou, com grande marketing, o formato CinemaScope e som estereofônico, ainda que já tivesse sido descoberto décadas antes pelo francês Henry Chrétien. O primeiro filme em CinemaScope foi O manto sagrado (The robe), de Henry Koster, com Richard Burton e Jean Simmons. Conta-se do espanto dos espectadores quando Burton, a recitar teatralmente, anda do lado direito para o esquerdo da tela com a sua voz se deslocando (era o processo estereofônico). Nos primeiros filmes em CinemaScope, a predominância era dos planos gerais, geralmente ambientes amplos e repletos de personagens. Os filmes eram mais paisagísticos do que introspectivos.
Quem trouxe o ser humano e os closes ups intensos para o CinemaScope, revolucionando-o, foi George Cukor em Nasce uma estrela (A star is born, 1955), com Judy Garland e James Mason. Mas não se poderia deixar de citar Aconteceu em Veneza Sait-on jamais...), de Roger Vadim, com aquele close fascinante dos olhos de Françoise Arnoul a tomar conta de todo o espaço da tela. Exibindo O manto sagrado na sua grade de programação, o Telecine Cult, há alguns anos, teve o acinte de apresentá-lo na abominável tela cheia, full screen, destruindo todas as composições de enquadramento desse filme pioneiro, ainda que superado e velho, datado.
De cult, The robe não tem nada. Mas, a Paramount, para entrar na concorrência, inventou o Vistavision, cujo formato é menos largo do que o CinemaScope. (O Telecine, que se diz cult, está, agora, a exibir Satyricon, de Fellini, em horrenda tela cheia).
alguns dias, programei o sábado à tarde para ver Viva Maria, de Louis Malle. O filme começa em CinemaScope, com a saltitante Brigitte Bardot em cima do trem a andar e, de repente, finda a apresentação dos créditos, o filme se espicha de uma forma que me fez desligar, num ex-abrupto, a televisão, quase quebrando-a.
Se, com a entrada deste formato todos os cinemas tiveram que se adaptar a ele, com as lentes anamórficas e mudança de telas, os exibidores, no entanto, não modificaram as janelas dos projetores adequados para o Vistavision. Resultado: todos os filmes da Paramount (incluindo a maioria dos de Hitchcock) foram exibidos no Brasil cortados pelos lados. Somente agora, com as cópías em DVD é que, pela primeira vez, os brasileiros estão a ver os filmes em Vistavision na sua integridade.
Infelizmente, a maioria das pessoas tá pouco se lixando para o formato dos filmes. O que interessa é a história, a trama, a intriga. Fiquei estarrecido quando ouvi de um jovem que prefere ver os filmes dublados porque tem preguiça de ler as legendas. A incultura cinematográfica cresce a passos largos. O cinéfilo do pretérito virou um simples consumidor de filmes e, como já disse aqui, o ir ao cinema atualmente é diferente do ir ao cinema no passado. O ir ao cinema hoje é uma das fases do processo do 'shoppear'. Não se vai mais ao cinema, mas se vai ao shopping e, estando nele, ao cinema. Os consumidores, débeis mentais, não possuem, portanto, um propósito estabelecido a priori de ir ao cinema ver determinado filme. Entra-se numa sala 'multiplexada' por causa de um cartaz, de um rosto bonito, de determinado ator ou atriz ou pela sugestão da ação, violência e sexo.
Lembro-me que, em priscas eras, comprava o jornal para saber das estréias, estabelecendo, por exemplo, "amanhã, sem falta, vou ver Matar ou morrer logo na primeira sessão, às 14 horas, no cinema Guarany".
Era uma outra cultura, uma outra época. O cinema como casa de espetáculos já morreu e está devidamente morto e enterrado.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

ESQUEMA NOVO ANUCIA OS VENCEDORES DE 2009

Bruno Vianna premiado com o filme Ressaca
Foto: Ana Carolina

Por Jean Romeiro

O CineEsquemaNovo 2009 – Festival de Cinema de Porto Alegre (CEN) anunciou sábado (24/10) no Centro Cultural Usina do Gasômetro os filmes vencedores da sua sexta edição. Foram distribuídos 17 prêmios para produções de diversos gêneros, formatos e linguagens, vindas de várias regiões do Brasil, priorizando sempre as idéias audiovisuais expressas na sala de exibição. Os filmes foram escolhidos pelo júri de premiação, composto por Cezar Migliorin, Christian Saghaard, Maria Helena Bernardes, Maria Henriqueta Satt e Lina Chamie, além do voto popular, os participantes da Oficina de Crítica Cinematográfica e a equipe do festival.
A lista contempla as obras em sua individualidade e suas características mais marcantes, gerando prêmios diversos para filmes diversos. Excetuando-se as categorias de Melhor Longa-metragem e Melhor Curta ou Média-metragem, todas as produções em mostras competitivas do CineEsquemaNovo concorreram juntas aos troféus e prêmios em serviços, entregues pelos apoiadores Link Digital, Som de Cinema, Tec Áudio, Lume Filmes, Heco Produções e Revista Aplauso.
“Ressaca”, longa-metragem de Bruno Vianna (RJ), montado em tempo real dentro da sala de cinema, através de um mecanismo desenvolvido pelo diretor, foi um dos grandes premiados da noite levando quatro troféus: Melhor Longa-metragem e Melhor Ator para João Pedro Zappa, pelo Júri de Premiação, além do Prêmio da Nova Crítica, concedido pelos participantes da Oficina de Crítica Cinematográfica e ainda o Melhor Longa pelo voto popular.
Os longas “Loveless” e “A Casa de Sandro” também foram premiados: o primeiro, dirigido por Cláudio Gonçalves (RJ) recebeu menção honrosa “pela composição dos planos e o tratamento rigoroso de enquadramento e decupagem”, enquanto Gustavo Beck foi escolhido o Melhor Diretor por “A Casa de Sandro” (RJ), ambos pelo júri de premiação.
“Sweet Karolynne”, de Ana Bárbara Ramos (PB) foi escolhido pelo Júri de Premiação o Melhor Curta-metragem. Pelo voto popular conquistou o segundo lugar na Mostra de Curtas. O primeiro lugar pelo voto da audiência ficou com o curta mineiro “Perto de Casa”, de Sérgio Borges, que também recebeu menção honrosa do júri de premiação “pela atenção à picardia e pela felicidade na relação cinema, família e mundo”. A melhor direção de fotografia ficou com o mineiro Matheus Rocha, de “A arquitetura do Corpo”, dirigido por Marcos Pimentel.

As produções cearenses também se destacaram nesta mostra. O diretor Guto Parente (CE), que conquistou em 2008 o prêmio de Melhor Curta do CEN por “Espuma e Osso”, foi contemplado neste ano com a Melhor Direção por “Passos No Silêncio” e recebeu o prêmio de Melhor Argumento Experimental, para “Flash Happy Society”. A Melhor montagem foi para outro cearense, “Muro”, de Tião.
Na Mostra Aula de Cinema foram eleitos “1978”, de Tyrell Spencer e André Garcia (Unisinos/RS), que ficou em primeiro lugar, à frente do segundo colocado “Hollywood”, de Laura Montalvão, Marcos Serafim e Thiago Benites (FAP/PR).
Já o Troféu CineEsquemaNovo, concedido pela organização do festival, foi entregue para Carlosmagno Rodrigues (MG), “pela consolidação de uma obra que é acompanhada pelo festival desde a sua primeira edição”.
Confira a seguir a relação completa dos premiados, acompanhados das justificativas do Júri de Premiação e das médias de votação (1 a 5) do Voto Popular:

MELHOR LONGA-METRAGEM – JÚRI DE PREMIAÇÃO“Ressaca”, de Bruno Vianna (RJ / 2009 – 75:00)
Comentário do Júri: “Pela direção dos atores, a força das cenas e o experimento realizado com a montagem ao vivo”.

MELHOR CURTA ou MÉDIA-METRAGEM – JÚRI DE PREMIAÇÃO“Sweet Karolynne”, de Ana Bárbara Ramos (PB /2009 – 15:00)
Comentário do Júri: “Pelo modo como o filme se aproxima com delicadeza e inteligência de seu personagem e tema. Destaca-se a maneira como o filme dessacraliza a morte e elogia a vida”.

MELHOR LONGA-METRAGEM – JÚRI POPULAR“Ressaca”, de Bruno Vianna (RJ / 2009 – 75:00)Média: 4,115

MOSTRA DE CURTAS E MÉDIAS – JÚRI POPULAR – PRIMEIRO LUGAR“Perto de Casa”, de Sérgio Borges (MG / 2009 – 09:30)Média: 4,078
MOSTRA DE CURTAS E MÉDIAS – JÚRI POPULAR – SEGUNDO LUGAR“Sweet Karolynne”, de Ana Bárbara Ramos (PB / 2009 – 15:00)Média: 3, 945

MOSTRA DE LONGAS-METRAGENS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MELHOR ATORJoão Pedro Zappa, por “Ressaca”, de Bruno Vianna (RJ / 2008 – 100:00)
Comentário do Júri: “Pela delicadeza e competência na construção de seu personagem”.

MOSTRA DE LONGAS-METRAGENS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MELHOR DIRETOR Gustavo Beck, diretor de “A Casa de Sandro” (RJ / 2009 – 75:00)
Comentário do Júri: “Pelo rigor narrativo e pelas composições temporais e pictóricas. Existe no filme uma investigação em torno da distância entre personagem e narrador”.

MOSTRA DE CURTAS E MÉDIAS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MELHOR DIREÇÃO“Passos No Silêncio”, de Guto Parente (CE /2008 – 17:00)
Comentário do Júri: “Pela construção da narrativa em seu mergulho no intraduzível da poesia”.
MOSTRA DE CURTAS E MÉDIAS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MELHOR MONTAGEM“Muro”, de Tião (CE /2008 – 18:00)
Comentário do Júri: “Montagem através da qual o filme efetiva uma forma potente de evocação de sentidos.”
MOSTRA DE CURTAS E MÉDIAS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MELHOR ARGUMENTO EXPERIMENTAL“Flash Happy Society”, de Guto Parente (CE / 2009 – 08:00)
Comentário do Júri: “Pela construção de uma narrativa imagético-sonora e pela experiência com imagens do cotidiano”.
MOSTRA DE LONGAS-METRAGENS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MENÇÃO HONROSA“Loveless”, de Cláudio Gonçalves (SP / 2009 – 61:00)
Comentário do Júri: “pela composição dos planos e o tratamento rigoroso de enquadramento e decupagem”

MOSTRA DE CURTAS E MÉDIAS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MENÇÃO HONROSAPara Matheus Rocha, Diretor de Fotografia de “A arquitetura do Corpo”, de Marcos Pimentel (MG / 2008 – 21:00)
Comentário do Júri: “pela precisão e expressividade da fotografia”

MOSTRA DE CURTAS E MÉDIAS – JÚRI DE PREMIAÇÃO – MENÇÃO HONROSAPerto de Casa, de Sérgio Borges (MG /2009 – 09:30)
Comentário do Júri: “Pela atenção à picardia e pela felicidade na relação cinema, família e mundo”

TROFÉU CINE ESQUEMANOVO – JÚRI EQUIPE ORGANIZADORA DO CEN
Carlosmagno Rodrigues (MG)
Justificativa: “pela consolidação de uma obra que é acompanhada pelo festival desde a sua primeira edição”.

MOSTRA DE LONGAS-METRAGENS – PRÊMIO DA NOVA CRÍTICA (Júri Alunos da Oficina de Crítica Cinematográfica)“Ressaca”, de Bruno Vianna (RJ / 2009 – 75:00)
Justificativa: Pela criação de um dispositivo inovador, que está à serviço de uma experiência estética única.

MOSTRA AULA DE CINEMA – JÚRI POPULAR – 1º LUGAR“1978”, de Tyrell Spencer e André Garcia (Unisinos/RS, 2009 – 05:00)Média: 4,275

MOSTRA AULA DE CINEMA – JÚRI POPULAR – 2º LUGAR“Hollywood”, de Laura Montalvão, Marcos Serafim e Thiago Benites (FAP/PR, 2009 – 08:17)Média: 3,774
Mostra Itinerante pelo Brasil

O CEN 2009 traz parte da sua programação para lojas da Livraria Cultura por todo o Brasil. De 29 a 31 de outubro, serão exibidos filmes selecionados e premiados nas mostras competitivas do festival este ano: Mostra de Curtas e Médias-Metragens e Mostra Aula de Cinema. O evento ocorre simultaneamente em Porto Alegre, São Paulo, Brasília, Recife e Campinas, com sessões na quinta e sexta-feira, às 18h e 20h e no sábado às 16h, 18h e 20h.
Sobre o CineEsquemaNovo 2009.

A sexta edição do CineEsquemaNovo – Festival de Cinema de Porto Alegre (CEN) aconteceu de 17 a 24 de outubro, Porto Alegre, na Sala P.F. Gastal, o Cine Santander Cultural e o Cine Bancários.

O festival é organizado por Alisson Avila, Gustavo Spolidoro, Jaqueline Beltrame, Morgana Rissinger e Ramiro Azevedo. Conta com o financiamento da Lei Federal de Incentivo à Cultura e patrocínio da Petrobras. Co-realização da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, através da Coordenação de Cinema, Vídeo e Fotografia da Secretaria Municipal de Cultura. Apoio especial: Santander Cultural. Apoio: Cine Bancários e Livraria Cultura.
Conta com colaboração especial da Nau, Tokyo Filmes e Procempa. Apoio de mídia da MTV, RBS TV e TV Com, TVE, Cine Brasil TV, Ulbra TV, TV Unisinos, Pop Rock, FM Cultura, Unisinos FM, Tordesilhas, Estação Elétrica e Academia de Filmes. Apoio de produção do Master Hotéis, Farofa, Aquavit, Via Imperatore, Atelier de Massas, Copacabana, Sharin, Shullas e Bar do Beto.
Apoio de premiação da Som de Cinema, Tec Audio, Link Digital e Revista Aplauso.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

ROBERT MULLIGAN: CINEASTA DA EVOLUÇÃO

Robert Mulligan: cineasta da evocação

Por André SetaroApesar de não ter alcançado a glória de seus ilustres colegas (Billy Wilder, Hitchcock, George Stevens, Cukor...), Robert Mulligan é um cineasta bem acima da média e que não foi devidamente valorizado, fora alguns filmes ocasionais mais louvados por outros motivos que pela mise-en-scène (como são os casos de O sol é para todos, que deu o Oscar a Gregory Peck, e Houve uma vez um verão).

O blogueiro (ou blogüista), por coincidência, começou a sua trajetória de cinéfilo na mesma época em que Robert Mulligan deu início a seu percurso como realizador cinematográfico, ou seja, em 1957. E, portanto, acompanhou toda a sua filmografia, ainda que os primeiros filmes tenham sido vistos nas constantes reprises que existiam no cinema do passado (a televisão matou a reprise dos filmes). A começar do princípio, não se podia prognosticar o futuro Mulligan em Vencendo o medo (Fear strikes out, 57), uma tentativa biográfica do jogador de beisebol Jim Piersall, interpretado por Anthony Perkins, que se ajusta ao papel, pois o biografado era homem extremamente neurótico, cheio de tiques, manias, e o filme desvenda uma explicação meio freudiana e mostra a causa do desequilíbrio do jogador na infância difícil, dominada por pai severo e rude (Karl Malden). Ainda no cast: Norman Moore.

Mulligan, após Vencendo o medo, passa três anos a esperar a oportunidade de dirigir o seu segundo longa, ainda que, neste interregno, tenha trabalho muito em episódios e seriados da televisão americana. É um cineasta oriundo da tv, mais liberto das normas pétreas dos estúdios, assim como Sidney Lumet, que com mais de 80 anos dirigiu um dos melhores filmes de 2008: Antes que o diabo saiba que você está morto (Before the devil knows you're dead). O filme que se segue a Fear strikes out é A taberna das ilusões perdidas (The rate race, 1960), baseado em peça de Garson Kanin, com Tony Curtis e Debbie Reynolds.

A lembrança que se tem de O grande impostor (The great impostor, 1961) é muito boa, ainda que memória de adolescente que nunca mais teve a oportunidade de revê-lo. A vida de um homem (Tony Curtis) que, durante a sua existência, adotou perto de vinte identidades diferentes, saindo ileso de todas as confusões. Além de Curtis, Edmond O'Brien, Karl Malden, e música do grande maestro Henry Mancini. Neste mesmo ano, 61, uma sophisticated comedy que causou enorme sucesso de bilheteria, mas que, crê-se, vista hoje, não se sustentaria: Quando setembro vier (Come september), com Rock Hudson (o queridinho das comédias românticas), Gina Lollobrigida (a italiana sensual), Walter Slezak, Sandra Dee, Bobby Darin. Rock é um milionário que descobre que seu caseiro transformou sua belíssima villa na Itália em hotel. Mas ele se apaixona por uma das hóspedes, a sensual Lollobrigida. As canções foram compostas (e cantadas) por Bobby Darin. Recorda-se que o primeiro plano do filme, em cinemascope, colorido, mostra um imenso avião que, abrindo seu compartimento de bagagens, faz sair, dele, um Rolls Royce de prata. O script é perfumaria de Stanley Shapiro.

Rock Hudson é convidado para estrelar Labirinto de paixões (The spiral road, 1961), que tem, ainda, Gena Rowlands (a atriz estupenda e esposa de John Cassavetes), Burl Ives, entre outros menos votados. Na verdade, um melodrama, que viu-se no Rio, no poeira Politeama, quando este saudoso cinema, que ficava no Largo do Machado, passava programa duplo, um vehicle para Rock Hudson. No máximo, uma direção eficiente do ponto de vista artesanal.

O grande Mulligan põe sua manga de fora no ano seguinte, em 1963, em O sol é para todos (To kill a mockinbird, 1962), filme que deu o Oscar de melhor ator a Gregory Peck no papel de um advogado humanista que defende um negro. A ação se localiza numa cidadezinha de Alabama em 1920, racista e preconceituosa. O negro é injustamente acusado de violentar uma branca. Tudo é contado pelo ponto de vista do casal de filhos do advogado e há um tom evocativo que Mulligan viria a adotar em outros de seus filmes. Com Mary Badham, Rosemary Murphy. Baseia-se num livro escrito por Herman Lee, amiga de Truman Capote.

Em 1963, Mulligan resolve fazer um filme in loco em Nova York: O preço de um prazer (Love with the proper stranger, 1963). Cineasta oriundo da televisão, como já aqui se referiu, com os talentosos Frankenheimer, Lumet, há, neste filme, um enfoque que se pretende menos hollywoodiano e com certa influência do neo-realismo italiano (Hitchcock, o grande Hitchcock, o mestre dos mestres, já fizera uma experiência quase neo-realista em O homem errado (The wrong man, com Henry Fonda como o músico que é confundido com um assassino e, no final, quando a polícia descobre o verdadeiro culpado, e os dois se encontram face a face, Fonda tem pena do homicida, porque sabe que vai passar pelo mesmo calvário que ele.) Mas O preço de um prazer é sobre uma caixeira do Macy’s, que não é outra senão a sublime Natalie Wood, que engravida depois de passar uma noite com um estranho (Steve McQuenn). Ela, então, pede sua ajuda para encontrar um médico para que realize um aborto. A partitura é de Elmer Bernstein e a fotografia (em expressivo preto e branco), de Milton Krasner.

Ainda em 1965, Mulligan, apesar de já ter demonstrado ser um realizador acima da média, fora notado apenas por alguns exegetas da crítica francesa, e certos hermeneutas americanos como Andrew Sarris e Peter Bogdanovich, mas, neste ano, realiza O gênio do mal (Baby, the rain must fall), aproveitado o astro (McQuenn) do filme anterior, que, aqui, é um homem que sai da prisão, volta para a mulher (Lee Remick) e tenta ganhar a vida como guitarrista e cantor. Mas o xerife da cidade (Don Murray) vem a se apaixonar por ela, criando, com isso, o conflito básico. O afamado Glenn Campbell aparece no conjunto no qual McQuenn toca.

O touch mulliganiano está acesso com sensibilidade e a devida evocação na obra que se segue: À procura do destino (Inside Daisy clover, 1966), cujo tratamento temático é avançado para a época. Mulligan procura fazer de sua personagem principal, uma estrela juvenil problemática de Hollywood, o protótipo de todas as atrizes que tiveram problemas na sua trajetória (de Judy Garland a Marilyn Monroe): o patrão tirânico, o marido homossexual, a avó psicótica. Com Natalie Wood, em seu esplendor na relva, Robert Redford, Christopher Plummer, colhendo os louros como o Capitão Trapp de A noviça rebelde/The sound of music, e a sempre inexcedível Ruth Gordon.

Subindo por onde se desce (Up the down staircase, 1967) é também um filme in loco, que procura enfocar a problemática de uma professora de escola de periferia de Nova York, Sandy Dennis, obra que procura sempre um tom realista no desenvolvimento de sua narrativa. Ainda que não seja um grande filme, lembra Sementes da violência, de Richard Brooks, com Glenn Ford e Sidney Poitier.

Os anos 60 se aproximam do fim e Maio de 68 se anuncia. Mas Mulligan, alheio ao que se passa, se refugia no western, mas western de primeira linha, um de seus melhores filmes: A noite da emboscada (The stalking moon, 1969), com Gregory Peck, militar do exército que, prestes a se aposentar, encontra, desamparados, uma mulher (Eva-Marie Saint) e seu filho, fruto de uma relação com apache violento, e decide transportá-los a lugar seguro, mas o índio, ao tomar conhecimento, resolve perseguí-los. A perseguição, num desenvolvimento que faz lembrar, tal a tensão, um thriller eletrizante, em nenhum momento faz aparecer o apache. Tudo é tensão, atmosfera, clima. Uma direção de brilhantismo indiscutível.

Em 1970, porém, volta-se aos jovens contestadores, apoiando-se num argumento bem de acordo com sua época contestatória e faz uma espécie de documento sociológico em O caminho da felicidade (The pursuit of happiness). Michael Sarrazin é um rebel without a cause que, com seu carro, para escapar de pagar o estacionamento, mata um operário e vai para trás das grades, mas foge e, com sua namorada (Barbara Hershey) empreendem uma fuga alucinante que parece não ter fim num autêntico road movie.

E vem Houve uma vez um verão (Summer of ’42, 1971), obra delicada e feita com sensibilidade sobre a iniciação sexual de um adolescente (Gary Grimes) que, num verão de 1942, quando os Estados Unidos entram em guerra, seduz a esposa (Jennifer O’Neil, carioca de nascimento, que Howard Hawks, por causa deste filme, aproveitaria em seu derradeiro western, Rio Lobo, ao lado de John Wayne) de um oficial que está ausente envolvido no conflito bélico de então. Mulligan conduz o relato com extrema finesse e o filme é uma mostra da vacuidade de certas mulheres que, deixadas sozinhas por circunstâncias alheias à sua vontade, ficam ao relento do desejo e das paixões. Há um tom evocativo que o cineasta repete com plena consciência de suas possibilidades poéticas, principalmente quando a partitura é de um maestro como Michel Legrand. E a fotografia de Robert Surtees é um assombro.

Talvez não exista um filme que trata da maldade embutida na infância do que A inocente face do terror (The other, 1972). Ambientado em Connecticut, em 1935 – e novamente aquele atmosfera de evocação tão peculiar a Mulligan, dois garotos gêmeos se deparam com a maldade e a perversidade. A mise-en-scène do realizador atesta o seu vigor, a sua singularidade, a sua marca no cinema americano. Mas o melhor, por incrível que possa parecer, ainda estaria por vir: Jogos do azar, testamento do cineasta, uma obra de densidade exemplar, um pulsar envolvente, magistral, cinema puro na sua procura de decifrar e fazer ver a beleza possível de uma mise-en-scène. O intérprete principal de Jogos de azar (The nickel ride, 1974) é Jason Miller, que viria, neste mesmo ano, a fazer um padre em O exorcista, de William Friedkin.

Encerra-se esta breve homenagem a Robert Mulligan com as palavras de Carlos Reichenbach, que fecha com chave de ouro a trajetória desse importante realizador, destacando, o Comodoro, a beleza de um filme como The nickel ride.

“É curioso notar que outros cineastas da mesma geração, como Robert Mulligan, por exemplo, que não foram tão incensados pela crítica no começo, acabaram realizando uma obra menos pretensiosa e muito mais coerente. No caso de Mulligan, o sucesso popular e o prestígio em Hollywood, só veio a acontecer no meio da carreira, com Houve uma vez no verão (Summer Of 42) e A inocente face do terror (The other), ambos de 72, embora ele já tivesse realizado filmes mais notáveis como Fear strikes out (Vencendo o medo - 57), To kill a mockingbird (O Sol é para todos - 63), Baby, the rain must fall (título deslumbrante, burramente "traduzido" como O gênio do mal - 64), Inside daisy clover (À Procura de um destino - 66), Up the down staircase (Subindo por onde se desce - 67) e The pursuit of happiness (uma ode radical ao inconformismo, lançada no Brasil com o título de O caminho da felicidade - 70). É verdade que, após o sucesso com os dois filmes citados acima e o fim de sua parceria com o produtor Alan Pakula - que também se tornou diretor de cinema, mas num estilo mais cool e menos arrojado que Mulligan - sua obra caiu em desgraça. Embora tenha produzido e dirigido o filme mais anticomercial de Hollywood, The nickel ride (Jogos de azar - 74) - um drama chumbo grosso e depressivo sobre viciados em jogo, fotografado inteiramente com iluminação vertical onde mal se vê os olhos do atores - encerrou a carreira com uma péssima adaptação ianque de Dona Flor E Seus Dois Maridos e o chorumela Clara´s heart."

domingo, 29 de novembro de 2009

FILME SOBRE OS NOVOS BAIANOS É PREMIADO EM BRASILIA

HENRIQUE DANTAS E MORAES MOREIRA NO FESTIVAL DE CINEMA EM BRASILIA

Filhos de João, Admirável Mundo Novo Baiano


titulo original: (Filhos de João, Admirável Mundo Novo Baiano)


lançamento: 2009 (Brasil)


direção: Henrique Dantas


atores: Tom Zé , Orlando Senna , Rogério Duarte , Mário Luiz Tompson de Carvalho , Solano Ribeiro


duração: 75 min


gênero: Documentário


status: inéditos





sexta-feira, 27 de novembro de 2009

MONTAGEM INTELECTUAL OU IDEOLÓGICA

A Montagem Intelectual ou Ideológica

A Montagem Intelectual ou Ideológica: operação com um objetivo mais ou menos descritivo que consiste em aproximar planos a fim de comunicar um ponto de vista, um sentimento ou um conteúdo ideológico ao espectador. Eisenstein escreveu na justificativa de sua montagem de atrações: "uma vez reunidos, dois fragmentos de filme de qualquer tipo combinam-se inevitavelmente em um novo conceito, em uma nova qualidade, que nasce, justamente, de sua justaposição (...) A montagem é a arte de exprimir ou dar significado através da relação de dois planos justapostos, de tal forma que esta justaposição dê origem à idéia ou exprima algo que não exista em nenhum dos dois planos separadamente. O conjunto é superior à soma das partes".

Amparado nestes ditos de Eisenstein, há de se ver que, no cinema, como em quase todos os ramos das ciências, quando se reúne elementos (no sentido amplo) para obter um resultado, este é freqüentemente diferente daquele que se esperava: é o fenômeno dito de emergência. Aprende-se, por exemplo, em biologia, que pai e mãe misturam seu patrimônio hereditário para criar uma terceira personagem não pela soma desses dois patrimônios, mas, ao contrário, pela combinação deles em um novo patrimônio inédito. Em química, sabe-se ser possível misturar dois elementos em quaisquer proporções, mas não é possível combiná-los verdadeiramente em um corpo novo se não tem proporções perfeitamente definidas (Lavoisier). Da mesma forma, na montagem de um filme, os planos só podem ser reunidos numa relação harmoniosa.

A montagem ideológica consiste em dar da realidade uma visão reconstruída intelectualmente. É preciso não somente olhar, mas examinar, não somente ver, mas conceber, não somente tomar conhecimento, mas compreender. A montagem é, então, um novo método, descoberto e cultivado pela sétima arte, para precisar e evidenciar todas as ligações, exteriores ou interiores, que existem na realidade dos acontecimentos diversos.
A montagem pode, assim, criar ou evidenciar relações puramente intelectuais, conceituais, de valor simbólico: relações de tempo, de lugar, de causa, e de conseqüência. Pode fazer um paralelo entre operários fuzilados e animais degolados, como, por exemplo, em A Greve (1924), de Eisenstein. As ligações , sutis, podem não atingir o espectador. Eis, aqui, um exemplo da aproximação simbólica por paralelismo entre uma manifestação operária em São Petersburgo e uma delegação de trabalhadores que vai pedir ao seu patrão a assinatura de uma pauta de reivindicações (exemplo extraído do filme Montanhas de ouro, do soviético Serge Youtkévitch).
- os operários diante do patrão
- os manifestantes diante do oficial de polícia
- o patrão com a caneta na mão
- o oficial ergue a mão para dar ordem de atirar
- uma gota de tinta cai na folha de reivindicações
- o oficial abaixa a mão; salva de tiros; um manifestante tomba.
A experiência de Kulechov demonstra o papel criador da montagem: um primeiro plano de Ivan Mosjukine, voluntariamente inexpressivo, era relacionado a um prato de sopa fumegante, um revólver, um caixão de criança e uma cena erótica. Quando se projetava a seqüência diante de espectadores desprevenidos, o rosto de Mosjukine passava a exprimir a fome, o medo, a tristeza ou o desejo. Outras montagens célebres podem ser assimiladas ao efeito Kulechov: a montagem dos três leões de pedra - o primeiro adormecido, o segundo acordado, o terceiro erguido - que, justapostos, formam apenas um, rugindo e revoltado (em O Encouraçado Potemkin, 1925, de Eisenstein); ou ainda a da estátua do czar Alexandre III que, demolida, reconstitui-se, simbolizando assim a reviravolta da situação política (em Outubro).

O que Kulechov entendia por montagem se assemelha à concepção do pioneiro David Wark Griffith, argumentando que a base da arte do filme está na edição (ou montagem) e que um filme se constrói a partir de tiras individuais de celulóide. Pudovkin, outro teórico da escola soviética dos anos 20, pesquisou sobre o significado da combinação de duas tomadas diferentes dentro de um mesmo contexto narrativo. Por exemplo, em Tol'able David (1921), de Henry King, um vagabundo entra numa casa, vê um gato e, incontinente, atira nele uma pedra. Pudovkin lê esta cena da seguinte forma: vagabundo + gato = sádico. Para Eisenstein, Pudovkin não está lendo - ou compreendendo o significado - de maneira correta, porque, segundo o autor de A Greve a equação não é A + B, mas A x B, ou, melhor, não se trata de A + B = C, porém, a rigor, A x B = Y. Eisenstein considerava que as tomadas devem sempre conflitar, nunca, todavia, unir-se, justapor-se. Assim, para o criador da montagem de atrações, o realizador cinematográfico não deve combinar tomadas ou alterná-las, mas fazer com que as tomadas se choquem: A x B = Y, que é igual a raposa + homem de negócios = astúcia. Em Tol'able David, quando Henry King corta do vagabundo ao gato, tanto o primeiro como o segundo figuram proeminentemente na mesma cena. Em A Greve (Strike), quando Eisenstein justapõe o rosto de um homem e a imagem de uma raposa (que não é parte integrante da cena da mesma forma que o gato o é em Tol'able David, porque, para King, o gato é um personagem),esta é uma metáfora.

Em Estamos construindo (Zuyderzee, 1930), de Jori Ivens, várias tomadas mostram a destruição de cereais (trigo incendiado ou jogado no mar) durante o débacle de 1929 da Bolsa de Valores de Nova York, a depressão que marcou o século XX. Enquanto apresenta os planos de destruição de cereais, o realizador alterna -os com o plano singelo de uma criança faminta. Neste caso, o cineasta, fotografando uma realidade, recorta uma determinada significação. Os planos fotografados por Jori Ivens podem ser retirados da realidade circundante, mas é a montagem quem lhes dá um sentido, uma significação. Os cineastas soviéticos, como Serguei Eisenstein e Pudovkin, procuravam maximizar o efeito do choque que a imagem é capaz de produzir a serviço de uma causa.
Considerada a expressão máxima da arte do filme, a montagem, entretanto, vem a ser questionada na sua supremacia como elemento determinante da linguagem cinematográfica com a introdução - em fins dos anos 30 - das objetivas com foco curto que permitiu melhorar as filmagens contínuas - a câmera circulando dentro do plano - com uma potenciação de todos os elementos da cena e com um tal rendimento da profundidade de campo (vide Cidadão Kane (1941), de Orson Welles, Os melhores anos de nossas vidas, 46, de William Wyler) que possibilitou tomadas contínuas a dispensar os excessivos fracionamentos da decupagem clássica. A tecnologia influi bastante na evolução da linguagem fílmica, dando, com o seu avanço, novas configurações que modificam o estatuto da narração - o próprio primeiro plano - o close up - tão exaltado por Bela Balazs como "um mergulho na alma humana" - com o advento das lentes mais aperfeiçoadas já se encontra, esteticamente, com sua expressão mais abrangente e menos restrita.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

OS CAFAJESTES

OS CAFAJESTES Um espetáculo músical irretocável com: Rafa Medrado, Marcelo Timbó, Renato Fechine e Daniel Rabelo, com texto de Aninha Franco e Direção de Fernando Guerreiro.

AVATAR

Direção: James Cameron

Sinopse


No épico de ação e aventura AVATAR, James Cameron, diretor de Titanic, nos leva a um mundo espetacular, além da nossa imaginação. Na distante lua Pandora, um herói relutanteembarca em uma jornada de redenção e descoberta, liderando uma batalha heroica para salvar a civilização.
O filme foi idealizado por Cameron há 14 anos, quando ainda não existiam meios para concretizar suas ideias. Agora, após quatro anos do trabalho de produção real, AVATAR nos proporciona uma inovadora experiência de imersão total no cinema, em que a tecnologia revolucionária que foi inventada para realizar o filme se dilui na emoção dos personagens e na história arrebatadora.

domingo, 22 de novembro de 2009

FAZER CINEMA NO BRASIL É DIFICIL PRA QUALQUER UM


Há um par de anos, Bruna Lombardi e Carlos Alberto Riccelli decidiram tornar pública sua porção cinéfila. Na Mostra de Cinema de São Paulo, o casal passou a ser visto não apenas nos acontecimentos mais badalados, mas também em sessões-cabeça, como uma exibição de Império dos Sonhos, de David Lynch, num domingo de manhã. Pareciam querer dizer que, atores bonitos, tinham virado outra coisa. Em 2005, exibiram Stress, Orgasmos e Salvação, primeiro filme com direção de Riccelli e roteiro de Bruna. Mas a produção, sofrível, passou em brancas nuvens.

Dois anos mais tarde, o casal voltaria às telas da Mostra com O Signo da Cidade. Após percorrer vários festivais com boa recepção do público, o filme estréia em São Paulo na sexta-feira 25 e segue, nas semanas seguintes, para outras cidades. É inegável o salto qualitativo. O Signo da Cidade, ao contrário do primeiro filme, sabe onde quer chegar. Com suas histórias entrecruzadas à la Crash ou Amores Brutos, repete uma fórmula que tem agradado as platéias e procura emocionar.

Fatalista, no sentido de tratar o destino como algo inevitável, e catártico, o título inclui-se na vertente cinematográfica que flerta com a auto-ajuda. Mas Riccelli discorda da definição e tira outra da manga. “Mostramos personagens desesperados, solitários, que procuram uma programa de rádio ou uma astróloga e colocam o destino nas mãos dessas pessoas”, descreve.

O Signo da Cidade quer mostrar as solidões que a cidade de São Paulo oculta. Acerta em algumas, carrega nas tintas em outras. Soa excessivo, por exemplo, o número de suicidas que cruzam o caminho da astróloga vivida por Bruna. Uma das qualidades do filme é o elenco (confira em www.osignodacidade.com.br), que inclui atores como Juca de Oliveira, Eva Wilma e Denise Fraga, capazes de nos fazer acreditar nas aflições dos personagens.

Na terça-feira 22, antes de seguir para a pré-estréia, Carlos Alberto Riccelli conversou, por telefone, com a reportagem de CartaCapital. Afável, admitiu que, em fase de lançamento de filme, falar com a imprensa se torna uma das prioridades de um diretor.

Carta Capital: A primeira pergunta é tão óbvia quanto inevitável. Em que momento você decidiu que queria virar cineasta?
Carlos Alberto Riccelli:
O cinema é uma paixão desde criança. Quando eu era menino, meus pais sempre nos levavam, eu e três irmãos, ao cinema. Íamos ver as chanchadas da Atlântida. Eu comecei a ser ator sonhando fazer cinema. Por mais que adorasse teatro, era nos filmes que eu me encontrava. Mas, dirigir, foi algo que surgiu de forma não programada, apesar de eu sempre ter me interessado por tudo que se passava no set e de ficar pensando em como determinada cena poderia ser feita. Foi quando a Bruna começou a fazer o programa Gente de Expressão que acabei pegando a câmera várias vezes. Eu era produtor, mas sempre sobrava alguma coisa de direção para mim.


CC: Você considera seu primeiro filme, Stress, Orgasmos e Salvação, uma espécie de exercício? Ele parece, de certo modo, bem mais improvisado que O Signo da Cidade.
CAR:
Foi, de alguma maneira, um exercício, mas eu encarava como um filme pra valer. Stress ... é baseado num conceito, mas é algo que me interessa muito.


CC: E o novo filme, nasceu do que? Da história, da vontade de falar de São Paulo?
CAR:
O processo de criação é algo muito estranho. Não sei o que veio antes. Trabalhamos o roteiro da Bruna durante três anos. No fim, chegamos onde nem imaginávamos.


CC: O filme repete a estrutura de várias produção contemporâneas, como Crash, por exemplo. Isso foi algo intencional?
CAR:
Não. Na verdade, a Bruna sempre gostou de escrever para vários personagens. É por isso que o filme tem essa estrutura de painel. Além do Crash, se você pensar, Amores Brutos, Magnólia ou Short Cuts também são assim.


CC: O filme também é bastante fatalista, não? Me chamou a atenção, por exemplo, o número de suicidas ...
CAR: Você tem que criar conflitos e depois resolver.


CC: Mas São Paulo acaba surgindo também como uma cidade de solitários e, de certa maneira, neuróticos ...
CAR:
Existe uma indiferença das pessoas em relação ao próximo. Não é por maldade, mas pela competição. A vida corrida faz com que não tenhamos de olhar para o outro. E aí muita gente liga para um programa de tevê ou procura uma astróloga e joga a solução na mão dessas pessoas. Muitas vezes, elas acabam tendo um final trágico. Mas às vezes também encontram que as ajude. Isso é uma coisa que toca muito as platéias. Ao final, as pessoas vêem um pouco de esperança. É um filme que ajuda as pessoas.


CC: Nesse sentido, tem um quê de auto-ajuda ...
CAR
: Fala-se muito em auto-ajuda hoje em dia. Mas o filme não é isso, não tem essa pegada.


CC: O fato de você e a Bruna serem atores conhecidos deve facilitar o lançamento, não? Pelo menos, vocês não devem sofrer do problema de invisibilidade que atinge boa parte dos filmes brasileiros.

CAR: Olha, fazer cinema é difícil para qualquer um no Brasil. A gente não consegue espaço no circuito, por exemplo. E não adianta ser mais ou menos conhecido. Os donos das salas querem saber se o filme vai dar dinheiro ou não. Estamos fazendo essa promoção a um real, no dia do aniversário de São Paulo, para chamar a atenção e acreditamos no boca-a-boca. Se as pessoas gostarem, elas vão falar para os amigos. É nisso que apostamos.

CINEMA E PSICOLOLOGIA


Uma formas de diversão é o teatro. Da época clássica até os dias de hoje, as pessoas sempre gostaram de assistir e de se envolver com peças teatrais. No final do século XIX, com a invenção do cinema, o teatro não deixou de existir, mas a encenação de histórias passou a dividir espaço com as películas de cinema.

Ao assistirmos um filme, rimos, choramos, nos assustamos, nos identificamos com seus personagens e sua história. Dentro dos filmes vemos "pedacinhos" da vida que possuímos, tivemos ou que achamos que seria a ideal.Os filmes podem ser comparados com o material dos sonhos. Assim como os sonhos são a realização de desejos, os filmes têm também esta capacidade de realização de desejos, tanto para os autores que os escrevem, quanto para quem os assistem.

Quando falamos nos espectadores que assistem aos filmes, podemos fazer uma correlação entre os adultos que vão aos cinemas, com as crianças em suas brincadeiras. Nas brincadeiras infantis de heróis, bandidos, mocinhos e vilões, os pequenos tentam igualar seus atos aos dos adultos.

Ao vencerem os vilões em seus jogos, possuiriam as mesmas capacidades e seriam tão detentores de poder quanto os adultos, que pelo prisma infantil, realizam tudo que a criança não pode. Vemos exemplos disso nas brincadeiras infantis, e também nos filmes infanto-juvenis exibidos à tarde nas redes de televisão.

Da mesma forma, o adulto ao ir ao cinema se identificaria com o mocinho do filme, tendo também poderes ampliados e capacidade assim de realizar inúmeras façanhas, realizações que seriam mais difíceis de se concretizar se ocorressem fora do plano da fantasia.

Mesmo quando não falamos de filme de ação, e sim de dramas, o cinema também pode ser descrito como satisfação de desejos e fantasias. Ao se identificar com alguém que sofre na tela, o espectador se identifica também com as lutas para vencer as dificuldades inerentes à vida, com as dificuldades que têm os personagens do cinema.

Também nos filmes românticos o casal da história luta contra as dificuldades para ficarem juntos, dificuldades muitas vezes semelhantes às dos espectadores do filme, que se identificam com o sofrimento dos personagens em cena.

Mas há momentos que as pessoas podem realmente ser comparadas com os heróis do cinema. Estes lutam em busca de algum objetivo, assim como as pessoas, que ao vencerem alguma dificuldade maior podem se sentir como heróis, como os personagens dos filmes.

Bibliografia:

FREUD, Sigmund. Tipos psicopáticos no palco. Rio de Janeiro: Imago,1980. vol. VII.


formas de diversão é o teatro. Da época clássica até os dias de hoje, as pessoas sempre gostaram de assistir e de se envolver com peças teatrais. No final do século XIX, com a invenção do cinema, o teatro não deixou de existir, mas a encenação de histórias passou a dividir espaço com as películas de cinema.

Ao assistirmos um filme, rimos, choramos, nos assustamos, nos identificamos com seus personagens e sua história. Dentro dos filmes vemos "pedacinhos" da vida que possuímos, tivemos ou que achamos que seria a ideal.Os filmes podem ser comparados com o material dos sonhos. Assim como os sonhos são a realização de desejos, os filmes têm também esta capacidade de realização de desejos, tanto para os autores que os escrevem, quanto para quem os assistem.

Quando falamos nos espectadores que assistem aos filmes, podemos fazer uma correlação entre os adultos que vão aos cinemas, com as crianças em suas brincadeiras. Nas brincadeiras infantis de heróis, bandidos, mocinhos e vilões, os pequenos tentam igualar seus atos aos dos adultos.

Ao vencerem os vilões em seus jogos, possuiriam as mesmas capacidades e seriam tão detentores de poder quanto os adultos, que pelo prisma infantil, realizam tudo que a criança não pode. Vemos exemplos disso nas brincadeiras infantis, e também nos filmes infanto-juvenis exibidos à tarde nas redes de televisão.

Da mesma forma, o adulto ao ir ao cinema se identificaria com o mocinho do filme, tendo também poderes ampliados e capacidade assim de realizar inúmeras façanhas, realizações que seriam mais difíceis de se concretizar se ocorressem fora do plano da fantasia.

Mesmo quando não falamos de filme de ação, e sim de dramas, o cinema também pode ser descrito como satisfação de desejos e fantasias. Ao se identificar com alguém que sofre na tela, o espectador se identifica também com as lutas para vencer as dificuldades inerentes à vida, com as dificuldades que têm os personagens do cinema.

Também nos filmes românticos o casal da história luta contra as dificuldades para ficarem juntos, dificuldades muitas vezes semelhantes às dos espectadores do filme, que se identificam com o sofrimento dos personagens em cena.

Mas há momentos que as pessoas podem realmente ser comparadas com os heróis do cinema. Estes lutam em busca de algum objetivo, assim como as pessoas, que ao vencerem alguma dificuldade maior podem se sentir como heróis, como os personagens dos filmes.

Bibliografia:

FREUD, Sigmund. Tipos psicopáticos no palco. Rio de Janeiro: Imago,1980. vol. VII.

Cinema e Psicologia, escrito por Márcio Felix, Psicólogo.

O VELHO E BOM HITCHOCK

Pacto sinistro, Alfred Hitchock

Uma das cinco ou seis obras mais importantes para o conhecimento de Hitchcock. É o filme onde o tema hitchcockiano de base- a troca das culpabilidades- aparece mais abertamente, e não apenas como tema mas como motor principal da ação.Esta ação, constituída em sua linha principal pela armadilha na qual se debate um dos personagens ( Guy, interpretado por Farley Granger), é refletida na luz cintilante, metálica e glacial forjada pelo diretor de fotografia Robert Burks, aqui em seu primeiro trabalho para Hitchcock. Enquanto falso culpado, Guy se encontra tão privado de iniciativa e de liberdade quanto seu homólogo Henry Fonda em O homem errado.Como Balestrero, ele expia uma culpa metafísica ligada ao pecado original. Para Hitchcock, parece que não há “falso culpado” integral: Guy, que pensou em matar, que desejou matar, já entrou no infernal círculo da culpabilidade. E o face a face central de Strangers on a train é aquele entre o Diabo ( admiravelmente interpretado por Robert Walker) e sua criatura. Esta no fim triunfará, depois de ter cortejado o abismo, pois Hitchcock, moralmente falando, se alinha entre os otimistas, ou pelo menos tenta nos dar esta impressão. Em seus últimos filmes, quando ele poderia ter escolhido- numa época mais liberal- encerrar seus filmes com a vitória do Mal, e não com um happy end, ele sempre recusou-se a fazê-lo. Seu estilo aqui é clássico, rigoroso, quase austero, mas com acessos febris que correspondem aos momentos de extrema tensão e de mais intenso suspense ( a sequência do assassinato de Miriam, a do paralelismo entre o match de Guy e a ida de Bruno ao parque de diversões, e enfm a sequência final do carrossel). É aí, quando o cineasta melhor tem seu público na mão, que ele se distancia da intriga propriamente dita para se entregar a arabescos visuais que compõem uma sinfonia de imagens e de sons onde o prazer de narrar cede o passo a um puro deleite plástico e dinâmico. Mas Hitchcock sempre espera que o espectador esteja sob seu domínio para enfim se dar o prazer de satisfazer sua verdadeira natureza: a de um formalista genial que utiliza a duração, da qual é mestre absoluto, para cinzelar imagens infernais e apocalípticas que exorcizam suas obsessões. Nestes instantes, que podem durar até longos minutos, ele com freqüência encontra a ocasião de inventar e utilizar com maestria tornada lendária todo um arsenal de truques, de efeitos óticos e fotográficos que permanecem a maior parte do tempo um enigma à primeira visão, e às vezes nas seguintes.

O CINEMA NO BRASIL

HISTÓRIA DO CINEMA NO BRASIL

A primeira exibição de cinema no Brasil aconteceu em julho de 1896, no Rio de Janeiro. Um ano depois já existia no Rio uma sala de cinema, o "Salão de Novidades Paris", de Paschoal Segreto. 19 de junho é considerado o Dia do Cinema Brasileiro. (Atualmente o dia do Cinema no Brasil é 5 de Novembro).

Paschoal Segreto




A estruturação do mercado exibidor acontece entre 1907 e 1910, quando a usina de Ribeirão das Lajes é inaugurada e o fornecimento de energia elétrica no Rio de Janeiro e São Paulo passa a ser de maior qualidade. Em 1908 já havia 20 salas de cinema no Rio, boa parte delas com suas próprias equipes de filmagem. Exibiam filmes de ficção das companhias Pathé e Gaumont (França), Nordisk (Dinamarca), Cines (Itália), Bioskop (Alemanha), Edison, Vitagraph e Biograph (EUA), complementados por documentários, como por exemplo, “A parada de 15 de Novembro”.

Os primeiros filmes de ficção feitos no Brasil eram em geral realizados por pequenos proprietários de salas de cinema do Rio de Janeiro e São Paulo, sendo freqüentemente reconstituições de crimes já explorados pela imprensa: "Os Estranguladores", de Francisco Marzullo (1906), o primeiro sucesso, com mais de 800 exibições no Rio de Janeiro; "O Crime da mala", de Francisco Serrador (São Paulo, 1908) e "Noivado de Sangue", de Antonnio Leal (Rio de Janeiro, 1909).

Há também comédias, como o curta "Nhô Anastácio chegou de viagem", de Marc Ferrez (1908).

Em 1909 surgem os filmes "cantados", com os atores dublando-se ao vivo, por trás da tela. O sucesso do sistema resulta na filmagem de revistas musicais e trechos de óperas como "O Guarany", de 1911.

Hoje não existem sequer fragmentos desses filmes.
A partir de 1911, chegam a São Paulo imigrantes italianos que acabariam tomando conta do mercado nos próximos 30 anos. Nessa época surge o longa "Inocência" (1915), a partir do romance de Taunay, e "O Guarani". No Rio de Janeiro, Luiz de Barros, que viria a realizar mais de 60 longas-metragens até os anos 70, também começa por adaptações literárias de José de Alencar: "A Viuvinha" (1915), "Iracema" (1918) e "Ubirajara" (1919).

A partir de 1916, os documentários se organizam em cine-jornais, que eram produzidos e exibidos semanalmente, mantendo o pessoal de cinema em atividade com filmagens de futebol, carnaval, festas, inaugurações, políticos, etc. Muitas pautas eram claramente encomendadas, misturando jornalismo e propaganda.

Até 1935, havia 51 cine-jornais no país. O Canal 100 e os cine-jornais de Primo Carbonari e Jean Manzon são mostrados nos cinemas até o final dos anos 70, quando desistem de competir com a instantaneidade dos telejornais.
Já em 1911, empresários norte-americanos visitaram o Rio de Janeiro para sondar o mercado cinematográfico brasileiro, e logo abriram o Cinema Avenida para exibir exclusivamente filmes da Vitagraph. Com a Primeira Guerra Mundial, a produção européia se enfraquece, e os EUA passam a dominar o mercado mundial. Francisco Serrador cria a primeira grande rede de exibição nacional (salas em São Paulo, Rio de Janeiro, Niterói, Belo Horizonte e Juiz de Fora). Com a maior organização do mercado exibindo principalmente filmes estrangeiros a produção brasileira de filmes sofre uma grande queda. Atores, Atrizes, cinegrafistas, técnicos e fotógrafos perdem seus empregos.

O cinema americano pouco a pouco assume os primeiros lugares.
A burguesia do Rio de Janeiro, dentro dos padrões sociais da época, se aproxima dos enredos e personagens norte-americanos que passam a ter papel civilizatório e ideológico considerável.
Em 1924, mais de 80% dos filmes exibidos vinham dos EUA e a produção nacional não atingia os 2%.

A partir de 1930, diversos acordos comerciais estabelecem que os filmes norte-americanos passem a entrar no Brasil isentos de taxas alfandegárias.
O primeiro filme sonoro brasileiro é a comédia "Acabaram-se os otários" (1929), de Luiz de Barros. "Coisas nossas" (1931), de Wallace Downey, é um musical cantado em português, com cantores brasileiros, e de grande sucesso. Na contra-mão, Mário Peixoto realiza "Limite" (1930), filme mudo de pouca aceitação popular, mas hoje considerado um marco do cinema experimental.

No começo dos anos 30, o cinema brasileiro passa por uma rápida fase otimista, já que os "talkies" (filmes falados) de Hollywood têm dificuldades de entrar no mercado brasileiro, por deficiência das salas e pelo problema da língua. Em 1930-31 são produzidos quase 30 longas de ficção. Surgem no Rio de Janeiro as produtoras Cinédia, de Adhemar Gonzaga, e Brasil Vita Filmes, de Carmen Santos. Humberto Mauro, maior diretor de cinema do país, realiza para a Cinédia sua obra-prima "Ganga bruta" (1933) e para a Brasil Vita Filmes o sucesso "Favela dos meus amores" (1935).

As distribuidoras de filmes norte-americanos no Brasil investem muito dinheiro em publicidade e na aparelhagem de som dos cinemas.

A revista Cinearte diz incentivar o cinema brasileiro, mas defende explicitamente a imitação dos filmes norte-americanos, sua "higiene", seu "ritmo moderno" e seu respeito pelos que têm "o direito de mandar". No ano de 1934, não é produzido nenhum longa no país.

Dentro da idéia de imitar Hollywood, a Cinédia continua produzindo musicais: românticos como "Bonequinha de seda" (1936) ou carnavalescos como "Alô, alô, Brasil" (1935) e "Alô, alô, carnaval" (1936), nos quais surge Carmen Miranda, logo contratada por Hollywood. Em 1940, produz "Pureza", com grande orçamento, cenários especiais, equipamentos importados dos EUA e um absoluto fracasso. Em 1942, dos 409 filmes lançados no país, apenas 1 é brasileiro.

No final dos anos 40, empresários e banqueiros paulistas se associam ao engenheiro Franco Zampari na Vera Cruz - uma grande produtora construída nos moldes de Hollywood, com enormes estúdios, muitos equipamentos, diretores europeus e elencos fixos.

Em 5 anos são produzidos 18 filmes por Alberto Cavalcanti, do melodrama "Caiçara" (1950) ao musical biográfico "Tico-tico no fubá" (1952), do drama histórico "Sinhá moça" (1953) à comédia sofisticada "É proibido beijar" (1954).
Apesar disso, a Vera Cruz nunca conseguiu resolver o problema da distribuição de seus filmes, e foi à falência. Pressionada pelas dívidas, vendeu os direitos de "O Cangaceiro" (1953), de Lima Barreto, para a Columbia Pictures, e não ganhou nada por ter produzido o primeiro filme brasileiro de sucesso internacional.
Outras companhias com o mesmo espírito da Vera Cruz, mas com menor capital, tiveram o mesmo fim.
No Rio de Janeiro dos anos 40, Moacir Fenelon, José Carlos Burle e Alinor Azevedo criam a Atlântida Cinematográfica, sem grandes investimentos em infra-estrutura, mas com produção constante, estréiam com o sucesso "Moleque Tião" (1941), drama baseado na vida do comediante Grande Otelo, que interpretou a si próprio no filme. Luiz Severiano Ribeiro, dono do maior circuito exibidor brasileiro, associa-se e passa a facilitar a exibição dos filmes da Atlântida. Pela primeira vez no cinema brasileiro, estão associados produção e exibição.
Em seguida, a Atlântida passa a produzir comédias musicais tendo como tema principal o carnaval, como "Este mundo é um pandeiro" (1947) e "Carnaval no fogo" (1949), ambos de Watson Macedo.
Aos poucos, as histórias vão abandonando o carnaval e explorando a comédia de costumes, a partir dos tipos folclóricos do Rio de Janeiro. Os melhores momentos vêm com os filmes de Carlos Manga "Nem Sansão nem Dalila" (1954) e "Matar ou correr" (1954), satirizando dramas americanos de sucesso. O público gosta, mas os críticos "sérios" dizem que chanchada não é cinema. (Chanchada em espanhol significa exatamente "porcaria".)
As chanchadas (e a Atlântida) se esgotam no final dos anos 50, quando o público parece cansar da fórmula, e as maiores estrelas são chamadas para trabalhar na televisão.
Ainda nos anos 50, por influência do Neo-realismo italiano, surge no Rio de Janeiro um profundo questionamento às tentativas de transplantar Hollywood para o Brasil. Alex Viany realiza "Agulha no palheiro" (1953) e Nelson Pereira dos Santos filma "Rio, 40 graus" (1955), ambos com baixo orçamento, temática popular e busca de um realismo brasileiro. O filme de Nelson termina proibido pela censura.
Em São Paulo, Roberto Santos aplica os mesmos princípios na comédia de costumes "O Grande momento" (1958). Como os anteriores, o filme tem problemas de distribuição e não atinge o grande público.
Em Salvador, "Bahia de todos os santos" (1960), de Trigueirinho Neto, e "Barravento" (1961), de Glauber Rocha, desencadeiam um novo ciclo regional, que atrai cineastas de outros estados em busca da temática nordestina: entre outros, "O pagador de promessas" (1962), de Anselmo Duarte, premiado com a Palma de Ouro no Festival de Cannes, apesar de criticado pelos novos cineastas como um filme "tradicional".
Uma parcela pequena da juventude brasileira descobre o novo cinema, comprometido com a transformação do país. Em 1963, o movimento é deflagrado por 3 filmes: "Os Fuzis", de Ruy Guerra; "Deus e o diabo na terra do sol", de Glauber Rocha; e "Vidas secas", de Nelson Pereira dos Santos. Em todos eles, é mostrado um Brasil desconhecido, com muitos conflitos políticos e sociais. Uma mistura original de Neo-realismo (por seus temas e forma de produção) com Nouvelle vague (por suas rupturas de linguagem). É Glauber quem define os instrumentos do cinema novo: "uma câmara na mão e uma idéia na cabeça"; e também o seu objetivo: a construção de uma "estética da fome".
Após o golpe militar de 31 de março de 1964, os cineastas (e o país) se interrogam sobre o futuro e sobre as suas próprias atitudes de classe. Os filmes marcantes desse segundo momento do Cinema Novo são "O Desafio" (1965), de Paulo César Saraceni; "Terra em transe" (1967), de Glauber Rocha; e "O Bravo guerreiro" (1968), de Gustavo Dahl.



Com o AI-5 (13 de dezembro de 1968), a ditadura militar fecha o Congresso e os partidos políticos existentes e censura a mídia e as diversões públicas. A perseguição às oposições, a restrição da atividade sindical e a prática de tortura nas prisões criam um clima de medo que se reflete em toda a cultura do país. Neste terceiro momento, o Cinema Novo volta-se para o passado, para a História, ou para projeções alegóricas do país real.
A partir daí, uma nova geração de cineastas responde à nova situação política do país com mais radicalidade: a estética do lixo, o Cinema marginal. Em vez de se espelhar no melhor cinema europeu para fazer filmes que o público não vê, a idéia é desvirtuar a linguagem do pior cinema norte-americano a que o público está acostumado. Os principais representantes do movimento são Rogério Sganzerla (O Bandido da Luz Vermelha, 1968) e Júlio Bressane (Matou a família e foi ao cinema, 1969). Em 1970, os dois fundam a produtora Belair e realizam, em apenas 3 meses, 6 longas de baixíssimo custo.


O Estado brasileiro há muito tempo interferia no cinema do país - a princípio, para garantir o mercado do filme norte-americano; mais tarde, em resposta a anseios nacionalistas de industrialização. Em 1936, Roquete Pinto criou o Instituto Nacional do Cinema Educativo (INCE), onde Humberto Mauro dirigiu mais de 300 documentários. Mas é com a criação da Empresa Brasileira de Filmes (Embrafilme), em plena ditadura militar (1969), que o Estado passa a financiar a produção, enquanto o Conselho Nacional de Cinema (Concine) se preocupa com a legislação. Parte do lucro das distribuidoras de filmes estrangeiros no Brasil é taxado e esse dinheiro é usado para produzir filmes nacionais, mas o sistema de escolha dos filmes a serem produzidos é absolutamente centralizado. Os cineastas oriundos do Cinema novo ficam com a maior parte dos recursos.
A contradição básica do sistema se revela quando o filme "Pra frente, Brasil" (1982), do ex-diretor geral da Embrafilme, Roberto Farias, parcialmente financiado pela Embrafilme (um órgão do governo) é proibido pela Censura (por outro órgão do mesmo governo).


A Pornochanchada é um gênero do cinema brasileiro comum na década de 1970. Surgiu em São Paulo, foi uma produção bem numerosa e bem comercial, também conhecida como produção da Boca do lixo, de onde despontaram vários diretores de talento que souberam usar o que dava bilheteria na época (filmes eróticos softcore) para fazer filmes de grande valor estético e formal. Chamado assim por trazer alguns elementos dos filmes do gênero conhecido como chanchada e pela dose alta de erotismo que, em uma época de censura no Brasil, fazia com que fosse comparado ao gênero pornô, embora não houvesse, de fato, cenas de sexo explícito nos filmes. Revelou algumas atrizes que depois ficaram famosas na TV e passaram de certa forma, a esconder de seus currículos a participação nos filmes do gênero.


Surgem como filmes feitos para as massas, muito influenciados pelas comédias populares italianas. As cotas de exibição obrigatória, impostas pelo governo do período da ditadura militar, davam espaço para o desenvolvimento desse gênero. Os filmes eram financiados por produtores independentes, comerciantes locais, ou quem mais se interessasse, por que eram de fato muito lucrativos.


Inicialmente ficou conhecida como cinema da "boca do lixo", pois os filmes eram produzidos numa região da cidade de São Paulo conhecida por esse nome. Depois surgiu também a pornochanchada carioca.


Nos anos 70, a palavra de ordem dos ex-cinemanovistas é "Mercado é cultura". Tratava-se de fazer com que os filmes brasileiros fossem vistos pelo público de cinema no Brasil. E, de certa forma, isso foi alcançado graças às produções da Embrafilme de um lado, às produções baratas da turma da pornochanchada de outro, aos filmes infantis dos Trapalhões de um terceiro, e ainda por um novo "star-system" gerado pela televisão.


A participação dos filmes brasileiros no mercado cresceu muito: 14% dos ingressos vendidos em 1971 eram para filmes brasileiros e 35% de ingressos vendidos em 1982.


"Dona Flor e seus dois maridos" (1976), de Bruno Barreto, chega a 11 milhões de espectadores, mais do que qualquer filme estrangeiro. "A Dama do lotação" (1978), de Neville d'Almeida; "Lúcio Flávio, o passageiro da agonia" (1977), de Hector Babenco; "Eu te amo" (1981), de Arnaldo Jabor; "Xica da Silva" (1976), de Cacá Diegues; e mais 14 filmes dos Trapalhões ultrapassam, cada um, os 3 milhões de ingressos vendidos.


Em outubro de 1982, a crise econômica do país piora com a falta de dinheiro para pagar a dívida externa. Falta dinheiro para que o consumidor brasileiro possa ir ao cinema, falta dinheiro para produzir filmes. A produção volta a cair. Os exibidores, assessorados pelos distribuidores estrangeiros, começam uma batalha judicial contra a lei da obrigatoriedade, e em muitas salas simplesmente param de passar filmes brasileiros. Metade dos filmes produzidos em 1985 foi de sexo explícito.


Graças à "Lei do Curta" (de 1975), que obriga a sua exibição antes do longa estrangeiro, o curta-metragem passa a ser o único cinema brasileiro com acesso ao mercado. Assim, em todo o país surgem novos cineastas e novas propostas de produção, e os curtas brasileiros ganham vários prêmios internacionais.


Outro destaque da década é a produção de documentários de longa-metragem, também sem acesso ao mercado, mas refletindo sobre a história recente do país, como exemplo temos Jango (1984), de Sílvio Tendler.


Em 15 de março de 1990, Fernando Collor assume a presidência da República. Em seu governo, as reservas financeiras particulares da população brasileira, como contas-poupança, foram confiscadas e a Embrafilme, o Concine, a Fundação do Cinema Brasileiro, o Ministério da Cultura, as leis de incentivo à produção, a regulamentação do mercado e até mesmo os órgãos encarregados de produzir estatísticas sobre o cinema no Brasil foram extintos.


Em 1992, último ano do governo Collor, um único filme brasileiro chega às telas. Foi A Grande Arte, de Walter Salles, falado em inglês e ocupante de menos de 1% do mercado.


Em dezembro de 1992, no governo de Itamar Franco, o Ministro da Cultura Antonio Houaiss cria a Secretaria para o Desenvolvimento do Audiovisual, que libera recursos para produção de filmes através do Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro e passa a trabalhar na elaboração do que viria ser a Lei do Audiovisual, que entraria em vigor no governo de Fernando Henrique Cardoso.


A partir de 1995, começa-se a falar numa "retomada" do cinema brasileiro. Novos mecanismos de apoio à produção, baseados em incentivos fiscais e numa visão neoliberal de "cultura de mercado", conseguem efetivamente aumentar o número de filmes realizados e levar o cinema brasileiro de volta à cena mundial. O filme que inicia este período é Carlota Joaquina, Princesa do Brasil (1995) de Carla Camurati, parcialmente financiado pelo Prêmio Resgate. No entanto, as dificuldades de penetração no seu próprio mercado continuam.


Alguns filmes lançados nos primeiros anos do novo século, com uma temática atual e novas estratégias de lançamento, como Cidade de Deus (2002) de Fernando Meirelles, Carandiru (2003) de Hector Babenco e Tropa de Elite (2007) de José Padilha, alcançam grande público no Brasil e perspectivas de carreira internacional.Em Janeiro de 2009 o Cinema Brasileiro tem um momento histórico: Uma continuação de sucesso com Se Eu Fosse Você 2 de direção de Daniel Filho com Tony Ramos e Glória Pires nos papéis dos protagonistas que ultrapassa 1 milhão de espectadores com menos de uma semana.