sábado, 17 de janeiro de 2009

JORNADA INTERNACIONAL DE CINEMA DA BAHIA

A história da Jornada de Cinema da Bahia

Entrevista com Guido Araújo

Oficina Cinema-História - Como surgiu a Jornada de Cinema da Bahia?

Guido Araújo - Quando regressei da Europa, em 1967, após ter morado e estudado na Tchecoslováquia desde 1959, fui procurado, juntamente com o Walter da Silveira, por duas pessoas da Universidade Federal da Bahia: o Nelson Araújo e o Romélio Aquino, no sentido de criarmos algo na área de cinema. Naquela época, a Universidade tinha apenas um departamento cultural. No início de 1968, criamos o chamado Grupo Experimental de Cinema, que era fundamentalmente um curso livre de cinema, ministrado por nós dois. O Walter cuidava das aulas teóricas e históricas e eu das aulas práticas. Esse Grupo despertou grande interesse.

A primeira turma foi enorme, demonstrando o desejo da juventude baiana e dos artistas, de um modo geral, de realizar algo nesse sentido. Foi extremamente agradável aquele convívio, num ano atípico e transitório. Já estávamos sob a ditadura, mas naquela fase de movimentos, que foi 1968.

Através do Grupo, passamos a desenvolver as atividades de cine-clube na Reitoria da UFBA. Na época, o reitor era o Roberto Santos. Fomos conversar com ele. Ele nos disse que concordava que realizássemos as atividades e que ele nem levaria para a aprovação do Conselho para que não surgisse nenhum problema.

Demos início, então, às atividades, fazendo, sempre aos sábados, a projeção de um bom filme. Foi um sucesso incrível. Cada exibição contava com a presença de 600 a 700 pessoas. Isso, nós fizemos durante todo o ano de 1968. O ICBA nos emprestava os projetores e nós providenciávamos o filme.

Eu e o Walter fazíamos pequenos folhetos informativos, distribuíamos e exibíamos o filme. Em dezembro de 1968, veio o fatídico AI-5. Mesmo antes, numas das últimas exibições que realizamos já havíamos tido problemas.
Durante a exibição de Os Companheiros, com a Reitoria superlotada, ocorreu uma manifestação lá dentro. Tive que me esconder porque disseram que a polícia estava a minha procura. Como era final de ano, período de férias, suspendemos as atividades. No ano seguinte, quando nos preparamos para reiniciá-las, sentíamos que havia uma grande resistência.

Realizamos apenas duas ou três sessões.
Um dia, aproveitando que o Roberto Santos estava no exterior, eles proibiram as exibições, com uma alegação meio cretina: diziam que havia desaparecido um aparelho de telefone da portaria e que deveria ter sido alguém da sessão de cinema. Na verdade, a partir do AI-5, qualquer evento que concentrasse pessoas, sobretudo jovens e, particularmente, estudantes, era visto como subversivo. Começamos a pensar numa alternativa. Surgiu a idéia de fazer algo que não desse problemas com a polícia: fazer uma retrospectiva dos dez anos de cinema baiano de longa-metragem. Fizemos no Cine Bahia, no turno matutino, que era o período disponível.
Foi interessante, porque aglutinou pessoas de cinema da Bahia, até mesmo alguns que estavam desligados, a exemplo do Rex Schinddler e do Braga Neto. Fizemos a retrospectiva e daí surgiu o desejo de dar continuidade ao trabalho. Ao mesmo tempo, ainda realizávamos o curso.

Nesse ínterim, sobreveio, em 1970, a morte de Walter da Silveira, e eu fiquei praticamente sozinho, carregando o fardo. No mesmo dia em que Walter morreu, 5 de novembro, Dia da Cultura, estava sendo inaugurada a Biblioteca Central dos Barris, obra de Luís Viana Filho, que ordenou que a inauguração deveria se realizar de qualquer jeito. A professora Adalgisa Aragão, primeira diretora da Biblioteca, através de Jamison Pedra Prazeres, me convidou para participar da inauguração.
Eu tinha duas exposições e as coloquei lá no saguão: uma sobre Kafka e a outra sobre as crianças tchecas. E foi só o que havia, além das placas. Fechou assim que foi inaugurada porque não havia, de fato, sido concluída. Abriu apenas no mês de março de 1971. Então, o Jamison me convidou para dar um curso lá.
A Biblioteca tinha um auditório e um projetor. Eu fui dar o curso e fazia, assim, exibições de clássicos do cinema para os alunos. Quando o curso acabou, Adalgisa me propôs continuar exibindo filmes, mas havia os problemas dos custos.

Influenciado por pessoas que haviam pertencido à última diretoria do Clube de Cinema, como Ronilda Noblat e Ney Negrão, resolvi reativar o Clube criado por Walter da Silveira em 1950, um dos mais antigos do Brasil. Começamos a fazer exibições na Biblioteca Central, mas, com o período de chuvas, ficou tudo alagado.

Na Bahia, existiam dois grandes exibidores: o Francisco Pitton e Calumbi. Junto ao Calumbi, trabalhava o Adálio Valverde, que era seu sócio. Conversando com eles, surgiu a oportunidade de utilizar o Cine Rio Vermelho, às sextas-feiras, para as sessões do clube. Isso ocorreu em 1971 e foi um sucesso.

Nesse período, numa viagem que fiz para o Rio de janeiro, conheci Roland Schaffner, cuja vinda para a Bahia, com a finalidade de dirigir o Instituto Cultural Brasil Alemanha local, já estava planejada.
Através do Cosme Alves Netto, da cinemateca do Museu de Arte Moderna (MAM), ele soube da minha presença no Rio e manifestou o interesse de manter contato. Ele queria duas coisas: me conhecer e trazer a mostra de dez anos do Festival de Obenhausen para a Bahia. Trouxemos essa mostra e a apresentamos no Cine Rio Vermelho.
Juntando a retrospectiva que eu havia feito com essa mostra, sedimentou-se a idéia de criar a Jornada.
Em janeiro de 1972, eu fiz a I Jornada Baiana de Cinema. Era um momento difícil da situação política.
Foi modesta. Não tínhamos recursos, mas foi bastante positiva porque aglutinou pessoas que estavam querendo fazer cinema por aqui. Eu trouxe poucas pessoas de fora, pessoas-chave, com o mesmo pensamento. A maior parte da Jornada foi realizada na Biblioteca Central dos Barris e alguma coisa feita no ICBA.

OC-H - Você acredita que a Jornada teve alguma espécie de papel aglutinador da cultura de resistência à ditadura?

GA - Sim, ela teve. Não tanto nessa primeira, porque ela foi muito modesta. Mas isso ficará mais caracterizado a partir da segunda.
Denominei a primeira de Jornada Baiana de Curta-metragem. Nela, fiz um concurso apenas para produções baianas, uma pequena mostra de filmes, que continham uma certa visão crítica, como Vestibular 70, de Vladimir Carvalho, por exemplo, e um simpósio de discussão de problemas do cinema, especialmente, no Brasil.
Na noite do encerramento da Jornada de 1972, o Schaffner me convidou para comemorar sua chegada à Bahia. Ele e o Cosme me disseram: olhe, se você quiser continuar com a idéia de fazer a Jornada no próximo ano, pode contar com o nosso apoio. O Schaffner ofereceu o espaço e o Cosme auxiliou no sentido de conseguir filmes no Sul do país.
Partimos para uma Jornada nordestina, em 1973. Ela teve uma importância cinematográfica e política extraordinária. Naquela época, toda a atividade cinematográfica do país havia sido esmagada, quer dizer, o movimento cineclubista tinha sido totalmente aniquilado pela ditadura. Não havia sequer um clube de cinema funcionando no país.

Existia um desejo de ir contra a situação política, mas, naquela época, as coisas eram barra pesada! A repressão era violentíssima dentro das universidades, dos colégios e era muito difícil se fazer alguma coisa
.
O ICBA, como uma instituição alemã, gozava de certa imunidade diplomática. Isso nos permitiu a audácia de fazer coisas, lógico, graças ao apoio do diretor e também ao fato da Alemanha, no período, ter um governo social-democrata mais liberal, que lhe dava respaldo.

Essa Jornada, além de aparecerem muitos bons filmes, ficou marcada também pelo surgimento dos filmes em super 8. Foi o início da retomada do movimento cineclubista que se concretizaria depois de uma jornada específica de cineclubes que organizamos em Curitiba. Decidimos realizar a Jornada baiana em setembro, período de baixa estação e em que poderíamos contar com o apoio da Bahiatursa no que concerne às negociações com os hotéis. E até hoje, ela se realiza em setembro.
Do ponto de vista político, sobretudo a partir desse momento, 1973, a Jornada adquiriu um papel político muito intenso, aglutinando o movimento cinematográfico brasileiro, através da retomada dos cineclubes e também da organização de uma associação de classe dos cineastas. Surge aí o embrião da Associação Brasileira Documentarista, concretizada no ano seguinte.

A Jornada foi o momento que aproveitamos também, devido à posição privilegiada do ICBA, para exibir filmes que, naquela época, não poderiam ser vistos em outro lugar. Tivemos alguns problemas, é claro. Alguns filmes foram apreendidos, houve ameaças de intervenção e suspensão da Jornada.
Queriam que os filmes fossem liberados pela censura previamente, mas conseguimos, finalmente, contornar todos os problemas e exibir, pela primeira vez, por exemplo, filmes cubanos e películas que mostravam a luta de independência dos povos africanos.

OC-H - Que transformações ocorreram na natureza política da Jornada com o fim da ditadura e o processo de abertura que veio em seguida?

GA - Por incrível que pareça, não mudou muita coisa, porque a Jornada sempre se caracterizou por ser um movimento de resistência, um espaço independente, descompromissado e voltado para o cinema.
Quer dizer, ela não tem nada a ver com o cinema tradicional hollywoodiano. O que aconteceu na época da ditadura é que nós tínhamos o problema das ameaças, da censura.
A Jornada também enfrentou sempre dificuldades financeiras, por conta do seu caráter. Mas, por mais paradoxal que pareça, com a abertura, as coisas pioraram muito.
Durante o governo de Geisel e de Figueiredo, a Jornada contava com maiores recursos.
A Jornada nunca foi bem vista porque ela nunca se colocou do lado do poder, seja no nível empresarial, seja no governamental.
O único ano em que contei com o apoio de empresas privadas foi 1985, quando a Jornada tornou-se internacional. Isso só ocorreu porque nesse ano, com o surgimento do Ministério da Cultura, tivemos a presença do Ministro na Jornada. Mas foi um ano excepcional, nos seguintes a situação voltou a se tornar complicada.

OC-H - E para a Jornada de 1995, quanto você recebeu?

GA - Para essa Jornada, recebi 75 mil reais. Uma miséria, em se tratando de um evento internacional. Sessenta mil foram dados pelo Ministério da Cultura e os 15 mil restantes pela Fundação Cultural.

OC-H - Você considera que essa última Jornada marcou algum passo importante, além da sua consolidação como evento internacional?

Acho que ela marcou sim e em vários sentidos. Os próximos é que confirmarão isso. Logo no início do ano, eu estava lendo uma publicação francesa, quando tive a idéia de juntar os cem anos de cinema, de psicanálise e do raio X. Percebi que a Bahia tinha condições de sediar um evento desse tipo. Infelizmente, não encontrei apoio das pessoas que poderiam dispor de recursos para realizar esse sonho.
Mas, pelo menos, consegui realizar a Jornada no espaço que havia previsto inicialmente: no Memorial de Medicina. As pessoas que acompanharam esse trabalho sabem que o projeto inicial era outro.
Seria algo realmente grandioso e nem seria muito caro. Custaria aproximadamente 90 mil reais. Mas, mesmo com todas as dificuldades, a Jornada foi mais uma vez realizada.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

SÓ PARA ATORES

ALUNOS DO CAP - ESCOLA DE TV EM SALVADOR

Workshop de Interpretação para TV Introdução ao processo de representação para televisão. Além do curso, o aluno poderá ser convidado para fazer parte do site de atores da produtora http://www.elencovirtual.com/ ( foto encaminhada pelo aluno)
Com a diretora carioca SONAIRA D’ÁVILA.

O curso tem o objetivo de treinar e de cadastrar para elenco.
Duração: 3 diasDias : 20, 21 e 22/01 hora: 18 as 22 h
Informação e Inscrição: CAP, com Rada Rezedá.
Só para alunos de Rada Rezedá, o curso pode ser dividido em 2 x de R$ 250,00 com o segundo cheque para 10 de fevereiro.

COMEÇO DA NARRATIVA CINEMATOGRÁFICA

EQUIPE DE FILMAGEM EM SALVADOR

Por Beto Magno

Deve-se a um americano, David Wark Griffith (1875-1948), o mérito de ter introduzido um tipo de narrativa visual, seguido como modelo pela indústria cinematográfica Ocidental.

Griffith não era teórico, nem deixou tratados, no entanto, seus filmes foram pioneiros na criação de uma nova linguagem visual, onde a câmera começava a sair da "cadeira do teatro filmado", ritmando o tempo, aproximando-se e afastando-se dos presonagens, possibilitando, desta forma, que o espectador assistisse a uma cena sob ângulos diferentes. Deve-se a ele o uso de closeups, de planos gerais, de flashbacks e fades. Além disso, seus filmes apresentavam algumas técnicas narrativas, como, por exemplo, a sustentação dos movimentos fortes do enredo do filme e uma forma de interpretação que dava ênfase ao controle da expressão dramática dos atores.

A principal importância de GRIFFITH foi mostrar que uma câmera de cinema podia produzir um tipo de narrativa visual diferente da usada no teatro, estabelecendo assim os principios básicos para uma linguagem usada, até hoje, no cinema comercial americano.

Griffith percebeu que os enquadramentos mais abertos (planos gerais e planos conjuntos) servem para reforçar o aspecto descritivo da estória. Já os primeiros planos e closeups oferecem ao espectador uma proximidade maior com os personagens, podendo ser utilizados para trasmitir mais fortemente as emoções. Os planos médios, por outro lado, são planos eficientes para destracar a ação e o movimento dos atores. Em resuno:

DESCRIÇÃO - Grande Plano Geral (GPG)
Plano Geral (PG)
Plano Conjunto (PC)

NARRAÇÃO - Plano Médio (PM)
Plano Americano (PA_


EMOÇÃO - Primeiro Plano (PP)
Primeiríssimo Plano (PPP)
Plano Detalhe (PD).

OS PIONEIROS DO CINEMA

Irmãos Lumiére
Por Beto Magno

OS PRIMEIROS FILMES DA HISTÓRIA DO CINEMA, REALIZADOS PELOS IRMÃOS LUMIÉRE, POSSUÍAM ALGUMAS CARACTERISTICAS EM COMUM. A CÂMERA FICAVA SEMPRE FIXA, POSICIONADA NUMA MESMA ALTURA E COM O ÂNGULO DE VISÃO DA OBJETIVA PRÓXIMO AO DO OLHAR HUMANO. A MAIORIA DESTES FILMES ERAM DOCUMENTÁRIOS, SEM CORTES, DE CURTISSIMA DURAÇÃO ( TEMPO APROXIMADAMENTE DE 2 MINUTOS). OS IRMÃOS LUMIÉRE SIMPLISMENTE COLOCAVAM A CÂMERA NO TRIPÉ, ESCOLHIAM UM ASSUNTO QUALQUER, E REGISTRAVAM, SEM INTERRUPÇÃO, A CENA ATÉ O FILME CHEGAE AO FINAL. PODE-SE CITAR, COMO POR EXEMPLO: SORTIE DES OUVIRIERS DE L'USINE LUMIÉRE ( SAÍDA DOS OPERÁRIOS DA FABRICA LUMIÉRE), LE GÔUTER DE BÉBÉ ( OLANCHE DO BEBÊ ),LA DÉMOLITION D"UN MUR (A DEMOLIÇÃO DE UM MURO) E L"ARRIVÈE D"UN TRAIN EN GARE DE LA CIUTAT ( A CHEGADA DE UM TREM NA ESTAÇÃO DE UMA CIDADE), ESTE ULTIMO, O MAIS CONHECIDO.

QUANDO SE ASSISTE AOS CURTISSIMOS FIMES DE AUGUST E LOUIS LUMIÉRE, NOTA-SE QUE ELES APENAS REGISTRAVAM IMAGENS EM MOVIMENTO, SEM SE PREOCUPAR COM AS POSSIBILIDADES QUA A CÂMERA PODERIA OFERECER. AINDA NÃO EXITIA UMA LINGUAGEM CINEMATO´RÁFICA E O CINEMA NÃO ERA PENSADO COMO FORMA DE MANIFESTAÇÃO ARTÍSTICA.

NA VERDADE, DEVE-SE A MÉLIÈS O CREDITO DE SER O PRIMEIRO A UTILIZAR O CINEMA DE FORMA CRIATIVA, PINTANDO OS FOTOGRAMAS, MODIFICANDO A REALIDADE, INTERVINDO NO TEMPO E NO ESPAÇO, CRIANDO, DESTA MANEIRA, MAGICAS VISUAIS, COMO EXEMPLO PODE-SE CITAR L"HOMME ORCHESTRE ( A BANDA DE UM HOMEM SÓ), REALIZADO EM 1900, ONDE CADEIRAS E HOMENS MULTIPLICAM-SE E DESAPARECEM. EM L" HOMME Á LA TÊTE DE CAOUTCHOUC ( O HOMEM DA CABEÇA DE BORRACHA) DE 1902, UMA CABEÇA AUMENTA E DIMINUI ATRAVÉS DOS RECURSOS DE SUPERPOSIÇÃO E RETROCESSO DO FILME NO INTERIOR DA CÂMERA.

MÉLIÈS TAMBEM FOI REPONSÁVEL PELA INTRODUÇÃO DO CORTE NOS FILMES, O QUE PERMITIA, PELA PRIMEIRA VEZ, PENSAR O CINEMA EM TERMOS DE MONTAGEM, NO ENTANTO, MÉLIÈS ERA RELUTANTE EM ULTILIZAR TÉCNICAS JÁ CONHECIDAS PELA FOTOGRAFIA, COMO, POR EXEMPLO, O CLOSE-UP. EXISTIA UMA CERTA PREOCUPAÇÃO EM NÃO CORTAR OS PERSONAGENS NA ALTURA DO JOELHOS OU DO BUSTO, ACREDITANDO QUE O PÚBLICO NÃO ACEITARIA BEM A IDÉIA DE ASSISTIR AOS ATORES CORTADOS.

OBSERVANDO A PRODUÇÃO DOS PIONEIROS DO CINEMA PODE-SE DIZER QUE ESTES FILMES APRESENTAVAM AO ESPECTADOR A MESMA PERSPECTIVA OBSERVADA POR UM ESPECTADOR DE TEATRO, POIS A CÂMERA PERMANECIA SEMPRE FIXA, SEM ALTERAR O PONTO DE VISTA EM RELAÇÃO AO CENÁRIO. O´PRÓPRIO CORTE, QUANDO ULTILIZADO, SERVIA APENAS PARA DIVIDIR DUAS AÇÕES DIFERENTES, DA MESMA FORMA QUE O TEATRO ULTILIZA A CORTINA ENTRE DOIS ATOS. DURANTE ALGUM TEMPO, NO INÍCIO DO SECULO PASSADO O CINEMA FOI CONSIDERADO COMO SENDO O " TEATRO FILMADO".

REFORMA DA LEI ROUANET

Reportagem de Cadão Volpato e João Bernardo Caldeira, publicada no jornal Valor do dia
11/08

A gente não quer só comida
Governo defende maior participação do Estado na cultura e elabora proposta de reforma na lei de incentivo.

A Lei Rouanet na berlinda

Se um artista do calibre de Cildo Meireles, consagrado como um dos grandes nomes da arte contemporânea mundial, batesse à porta do departamento de marketing de uma empresa em busca de patrocínio para uma obra de arte que usa picolés de água como elementos catalisadores, qual seria a resposta do interlocutor? Provavelmente, seria uma bela negativa. Cildo, que está com uma elogiada retrospectiva em cartaz na Tate Modern de Londres, não teve de passar por isso. Convidado pelo Itaú Cultural para a mostra “Futuro Presente”, inaugurada no ano passado, ele apresentou essa idéia - que, entre outros possíveis significados, comenta a escassez de água no mundo nas próximas duas décadas - e recebeu R$ 300 mil para executá-la.

Para o superintendente de atividades culturais do Itaú Cultural, Eduardo Saron, a obra de Cildo teve a virtude de produzir uma reflexão sobre o tema (o futuro) e agregar valor à marca do banco e do instituto. “A pessoa pedia um sorvete no carrinho [eram dez espalhados pela cidade] e o sorveteiro explicava: ‘Isto é uma obra de arte, os desdobramentos dela estão no instituto.’ Muita gente que nunca havia entrado no prédio da avenida Paulista, onde fica o Itaú Cultural, apareceu”, afirma.

Essa compreensão do alcance da arte contemporânea não é a mais comum entre os patrocinadores de cultura no Brasil. Na maioria das vezes, os departamentos de marketing e de comunicação decidem pelo mais óbvio e o mais fácil, isto é, a obra de arte que não oferece muitos riscos quando agregada ao nome da empresa. “Agregar valor à marca” é apenas uma das vantagens que os mecenas empresariais têm hoje no Brasil. Lançando mão das leis de incentivo, as companhias conquistam prestígio entre o público, em grande parte das vezes, usando recursos do Estado obtidos via renúncia fiscal. Hoje, esse mecanismo representa 80% do montante investido pelo Ministério da Cultura (MinC).

Mas a Lei Rouanet, principal fonte de recursos para a cultura do país, está na berlinda. E com discussões alimentadas pelo próprio MinC. O ministro Juca Ferreira tem realizado encontros em diversas capitais para debater alterações na legislação e em seu principal mecanismo de incentivo, criado pelo governo Fernando Collor em 1991. O objetivo é delinear uma proposta de projeto de lei a ser enviada ao Congresso no início do ano parlamentar, em fevereiro. A proposta do Executivo envolve ainda as pastas da Fazenda, do Planejamento e a Casa Civil.

De acordo com a avaliação do ministério, a Lei Rouanet fracassou no objetivo de trazer a almejada auto-sustentabilidade para o setor, que se tornou dependente da renúncia fiscal como se fosse o único instrumento capaz de viabilizar as atividades culturais. Os produtores teriam se acomodado com o patrocínio e deixado de buscar retorno financeiro. Os empresários teriam se habituado com a idéia de que investir em cultura pressupõe apenas o uso de recursos públicos, sem precisar investir do próprio bolso.

Ferreira, que discutiu o tema em São Paulo na quarta-feira, diz que a Lei Rouanet é uma importante fonte de recursos para a cultura, mas ele ressalta sua insuficiência para configurar uma política pública e para os desafios da diversidade e da riqueza cultural do país. “Só no Brasil o mecenato é pegar dinheiro do Estado para fazer filantropia cultural”, afirmou num encontro em Salvador. Documentos do Minc indicam que 3% dos proponentes de projetos culturais beneficiados pela Lei Rouanet captam cerca de 50% dos recursos.

Para Yacoff Sarkovas, especialista em atitudes de marca e presidente da Significa e da Articultura, a dedução fiscal é, de fato, um meio “irracional, perdulário e ineficiente de investimento público, pois transfere recursos do Estado para a área cultural sem nenhuma estratégia de política pública”.

No ano passado, as leis de incentivo canalizaram R$ 1 bilhão para atividades culturais. A previsão para este ano é chegar a R$ 1,4 bilhão. Segundo Roberto Nascimento, secretário de Incentivo e Fomento à Cultura do MinC, a proporção de investimentos culturais feitos por meio de renúncia fiscal é demasiada e inadequada. Isso porque, do seu ponto de vista, esse peso implica um direcionamento financeiro feito pelos patrocinadores, “o que obviamente não atende plenamente às necessidades da sociedade”, diz Nascimento.

Nascimento considera que o ideal seria que o MinC tivesse mecanismos mais equilibrados. “Queremos aperfeiçoar os mecanismos atuais, incorporar novos instrumentos e fortalecer o próprio orçamento do MinC”, afirma. Neste ano, a pasta recebeu 0,61% do orçamento federal, um número que deve chegar a 0,7% em 2009, se não houver um comprometimento maior por causa da crise financeira. A meta é ampliar para 1%, conforme recomendação da Unesco.

Caso a nova proposta seja aprovada, atividades pouco atraentes para o empresariado terão oportunidades com a estruturação dos fundos setoriais (instrumentos de financiamento de projetos usados em outras áreas como saúde e educação), que corrigiriam disparidades. O Fundo Nacional de Cultura deve ser o principal mecanismo de financiamento da política pública.

Que a lei de incentivo fiscal não funciona plenamente não resta nenhuma dúvida. Do MinC aos artistas, passando por alguns produtores culturais e pelos patrocinadores, todo mundo enxerga maiores ou menores defeitos nela. O que alguns deles admitem é que, sem ela, não daria para ficar.



“A lei precisa passar por um aperfeiçoamento. Não acho que esteja errada”, diz Saron, do Itaú Cultural. “Ela precisa amadurecer, se recontextualizar num Brasil que pouco tem a ver com o que era 17 anos atrás.” Na opinião do executivo, a lei tem aspectos positivos. “O principal deles é que ajudou a profissionalizar o sistema cultural do país. Assim que surgiu a Lei Rouanet, as pessoas tiveram de aprender a apresentar seus projetos, a fazer seus planejamentos, a desenvolver uma forma de executar e prestar contas.”

O escritor gaúcho Paulo Scott, que suspendeu temporariamente uma sólida carreira no direito para dedicar-se de corpo e alma à literatura, também acredita que, na essência, a lei não é ruim. “O problema é que o artista às vezes vira refém da figura do produtor cultural, que existe para o bem e para o mal. As empresas ganham promoção das suas marcas à custa dos contribuintes e, por uma questão de mercado, querem seus nomes vinculados ao trabalho de quem já é muito conhecido”, aponta.

Justiça seja feita à Petrobras, a empresa que mais investe em cultura no país - somente no ano passado foram mais de R$ 170 milhões. Segundo a gerente de patrocínios, Eliane Costa, a estatal “busca agregar valor à reputação de sua marca com o patrocínio a projetos que valorizam e incentivam a cultura brasileira não só no segmento da produção, como também na difusão e fruição dos bens culturais”. Quem vê o Grupo Corpo, de dança, em ação, reconhece facilmente a marca Petrobras, que é uma das mais valiosas do país e da América Latina, segundo os rankings de “branding”.

A dança, segundo o artigo 18 da Lei Rouanet, permite 100% de abatimento fiscal. Outro artigo, o 26, permite apenas 30%. Do R$ 1 bilhão captado no ano passado, apenas R$ 100 milhões foram obtidos por meio do artigo 26. A meta do MinC é ampliar a atuação do setor privado vislumbrando um horizonte em que essa participação seja igualitária. “Teríamos então R$ 900 milhões advindos da renúncia fiscal e outros R$ 900 milhões provenientes da iniciativa privada”, diz Nascimento. “Por que não criar um logotipo adequado para quem usa os 100% de abatimento fiscal?”, sugere Eduardo Saron. A colocação dos logos das empresas é regulamentada pela lei.

Outra proposta do MinC é criar um selo para empresas com responsabilidade cultural. “Não vejo nenhum problema em haver projetos com 100% de renúncia fiscal, desde que sejam importantes para a cultura brasileira”, diz ele. Como parece evidente no caso do Grupo Corpo.

O Itaú Cultural escolheu os 30% do artigo 26 desde a fundação do instituto, há mais de duas décadas. Significa que a empresa oferece uma contrapartida. Ou seja, usa 70% de dinheiro do próprio bolso no mecenato.

“No Brasil, o sistema de financiamento público às artes baseado em dedução fiscal embaralhou as três fontes originais de financiamento: o Estado, o investimento social privado e o patrocínio empresarial. E muitos artistas e produtores ajudam a propagar o câncer do incentivo fiscal”, diz Yacoff Sarkovas, um dos mais antigos e renitentes críticos das leis de incentivo.
Num país como o Brasil, atrasado no quesito educação e incrivelmente bem colocado no aspecto criativo, arte e cultura têm sido insistentemente relegadas ao segundo plano. A autocrítica do MinC é que o Estado tem pouco peso para cuidar dessa situação. Quando ele aparece, transfere para as empresas a decisão sobre o que patrocinar.

“O Estado leva muito tempo, em todos os seus níveis federativos, para reparar e aperfeiçoar o que não está bem, o que não é justo e eficiente”, observa o escritor Paulo Scott. “O dirigismo hoje está nas mãos das empresas”, diz o secretário Nascimento.
Produtores e consultores que defendem o modelo atual, no entanto, argumentam que os projetos patrocinados são todos aprovados pelo MinC e as empresas estatais federais e estaduais são responsáveis pela decisão de 40% dos investimentos feitos por meio das leis de incentivo. Por esse motivo, o dirigismo apontado pelo ministério seria frágil, pois o Estado estaria bastante envolvido no que a Lei Rouanet viabiliza.

O tema provoca um acalorado debate ideológico. Enquanto a responsabilidade social entrava na moda, o que de certa forma empurrou as empresas para a discussão da cultura no país, o Estado andava meio por baixo. “Há três ou quatro meses, ele estava absolutamente fora de moda”, comenta Eduardo Saron. “E as empresas continuando a ocupar seu papel de provedor de políticas culturais”, continua. “Mas aí o mundo entra em crise, quebrando, e o Estado tem de intervir fortemente para sustentar a economia. Acredito que, aos poucos, ele vai se fortalecer cada vez mais como regulador, quando se tratar de cultura.”

O produtor Rodrigo Teixeira tenta ver mais longe: “O papel do Estado é discutir com as empresas formatos de investimento para a criação de uma indústria cultural.” Ele trabalha com direitos autorais e esteve envolvido na produção de pelo menos um sucesso surpreendente, o filme “O Cheiro do Ralo”, de Heitor Dhalia. “Sou um péssimo captador de incentivos fiscais”, admite, porém. “‘O Cheiro’ foi finalizado por meio de editais. Mas só em outras três ocasiões fui atrás de incentivos”, afirma. “Tomei um ano de nãos por conta do filme.” Os departamentos de marketing de diversas empresas se recusaram a apostar numa obra com esse título. “O Cheiro do Ralo” foi realizado graças ao investimento particular de algumas pessoas.

Teixeira encarou outro problema no projeto literário Amores Expressos, que enviou escritores para uma temporada de um mês em diversas cidades do mundo, com a missão de escrever um romance em seguida. A idéia recebeu um bombardeio pesado vindo de todas as direções. O centro da questão era que Teixeira levantava a possibilidade de recorrer à Lei Rouanet. Escritores chegaram a reclamar dos critérios de escolha do time de colegas que estava de malas prontas para as viagens. Muitos outros criticaram as viagens em si e o luxo que certamente estaria embutido nelas. No meio do tiroteio, Teixeira apenas sacou o projeto do MinC, no qual ele ainda nem sequer havia sido aprovado.

“Fui atrás de investidores que acreditam nesse modelo de negócio e se interessaram em pagar a conta.” O resultado já começa a ser visto nos livros que vão sendo editados pela Companhia das Letras, uma das parceiras do projeto. E os desdobramentos podem vir na forma de filmes e vídeos, como já constava na idéia original. Teixeira está aprendendo a andar no terreno pantanoso em que se transformou a produção de arte e cultura no país. “Sinto falta de gente jovem discutindo as políticas culturais. A gente só vê a velha geração se pronunciando.”
O caso do Amores Expressos exemplifica bem o estado de ânimo geral quando o assunto é lei de incentivo. E o próprio ministro Juca Ferreira é dos mais críticos nos encontros que tem realizado com produtores culturais. As sugestões para a reforma que pretende fazer na lei vão surgindo de todos os lados, o que é bastante saudável. Sarkovas, por exemplo, é favorável a uma redução da carga tributária. “Isso beneficiaria a sociedade civil e ajudaria a construir um Estado mais eficaz, que formule e implemente políticas públicas, financiando diretamente as ações”, diz. “A dedução fiscal gera produção cultural da mesma forma que dar dinheiro grátis para granjeiros gera produção de galinhas. Além do mais, ela distorce o investimento privado real via patrocínio de verdade, feito com dinheiro das empresas.”

O produtor Rodrigo Teixeira acredita em linha de crédito para produtores culturais. “O governo deveria incentivar os bancos governamentais a arrumar linhas de crédito, a juros baixos, para ajudar a cultura, seja no teatro, no cinema, na produção independente de TV ou na literatura.”
“Sinto falta de uma presença mais ampla de outras grandes empresas entre as grandes incentivadoras de cultura. Afinal, o governo federal, só em 2007, destinou cerca de R$ 1 bilhão à renúncia fiscal para a cultura”, diz Eliane Costa, da Petrobras. É o que ela mudaria no atual panorama do mecenato brasileiro.

Já Paulo Scott - cujos projetos recebem apoio de pequenos empresários (”livrarias, editoras, cafés e gráficas”, ele explica) - tornaria as ferramentas de acesso mais simples, menos burocratizadas e menos dependentes da figura do intermediário. “Boas idéias nem sempre dependem de produtores conhecidos e estabelecidos”, diz. “Também priorizaria as obras de experimentação, as obras de resgate cultural e histórico, de promoção da igualdade - é patético esse nosso hábito de dar atenção só ao que já é superbadalado”, completa o escritor.
“Eu disse isso ao próprio ministro Juca”, afirma Eduardo Saron, do Itaú. “Não adianta só mexer na Lei Rouanet. Se você mexer apenas nela e não no orçamento do ministério e no Fundo Nacional de Cultura, continuaremos tendo um sistema descompensado. Com orçamento tão baixo, você sempre vai querer se valer da lei para fazer as políticas do ministério.”
Seria uma discussão quase sem fim, não fosse o fato de o governo ter anunciado a disposição de apresentar o resultado da conversa com a sociedade para o próprio Congresso, no começo do ano que vem.

Mas também não significa que acabou. A famigerada Lei do Audiovisual, uma ampliação da Lei Rouanet criada por Itamar Franco em 1993, ainda está em pé - e qualquer tentativa de discuti-la parece bater num muro intransponível. Há muito que se fazer num país tão jovem como o Brasil, e tão carente de cultura. Um país onde, segundo a pesquisa do MinC, apenas 13% dos brasileiros freqüentam cinema alguma vez por ano, 92% dos brasileiros nunca freqüentaram museus, 93,4% dos brasileiros jamais freqüentaram alguma exposição de arte, 78% dos brasileiros nunca assistiram a um espetáculo de dança, embora 28,8% deles saiam para dançar.

ENTREVISTA DO MINISTRO JUCA FERREIRA AO JORNAL DO BRASIL

“O cofre da cultura”

Ministro Juca Ferreira fala sobre as mudanças na Lei Rouanet e diz que ano será de muitos acordos
Monique Cardoso, JB
Instrumento fundamental para o financiamento de projetos culturais em todo o Brasil por meio de renúncia fiscal, há quase 18 anos, a Lei Rouanet vai perder sua força. O MinC divulga, nos próximos dias, o novo texto do projeto de lei de fomento às artes que será enviado ao Congresso Nacional em fevereiro. As modificações são fruto de debates realizados em diversas capitais com agentes do setor. Tiram o poder de fogo da Rouanet, que hoje é responsável por 73% da verba que circula na área. Hoje um saco vazio, o Fundo Nacional de Cultura (FNC) vai passar a ser o principal meio de distribuição de verba para teatro, dança, artes plásticas, música, patrimônio e outras manifestações. O Vale-Cultura sai do papel e o ministério deve reter parte da arrecadação das loterias federais para o orçamento da pasta. De férias em Salvador, o ministro Juca Ferreira antecipa ao Jornal do Brasil os principais pontos do novo projeto de lei e chama o governo federal à responsabilidade. “O ano de 2009 vai ser de negociação. É incontornável a necessidade de o governo criar recursos para o orçamento do MinC”.

A Lei Rouanet vai acabar?

Não vamos acabar com a renúncia fiscal, vamos modificar as regras e ampliar os mecanismos para cinco ou seis formas diferentes. O Fundo Nacional de Cultura é que vai ser o principal instrumento. Estamos enviando um projeto de lei novo, não são apenas emendas. O texto fica, até fevereiro, em consulta pública. Nos últimos meses promovemos os Diálogos Culturais, fiz muitas reuniões com os secretários de Cultura do país inteiro e chegamos a uma série de normativas. É grande a confiança de que o texto será aprovado rapidamente e sem modificações significativas. Demorou, mas amadurecemos bastante.

Houve boa receptividade para as propostas?

Política pública não se faz em gabinete. É preciso ouvir artistas, financiadores, institutos, teóricos, pesquisadores, produtores. A receptividade de tudo o que eu fiz até agora foi acima das expectativas. Até pessoas que não apóiam o governo contribuíram com o debate. A reforma vem responder a certas inquietações: os produtores estavam preocupados com o recuo das intenções de patrocínio por causa da crise. As novas propostas dão margem de tranqüilidade.

Da onde virá o dinheiro para o Fundo Nacional de Cultura?

O Fundo Setorial do Audiovisual foi o primeiro que lançamos, com R$ 74 milhões. O FNC será composto por fundos setoriais de gestão compartilhada entre o setor público e setores relacionados. O atual FNC não capta. O novo vai captar, fazer convênios, gerar mecanismos de patrocínio e financiamento. Mas faço questão de dizer: o instrumento só vai dar certo se o ponto de partida orçamentário for razoável. Não pode ser frágil para substituir a renúncia. E cada fundo terá personalidade própria. O do livro, por exemplo, vai ter a contribuição da área editorial. Mas não é para substituir o dinheiro orçamentário. É para somar, crescer. É incontornável a necessidade de o governo criar recursos.

Os fundos vão funcionar de maneira independente?

As áreas serão: Artes, Patrimônio, Livro e Leitura e Diversidade Cultural, Cidadania e Acesso. Vamos aproveitar as vantagens de cada setor, desenvolver modos de captação específicos. Cada área da cultura terá seu modelo de gestão e avaliação de projetos da maneira mais especializada possível. Se as áreas são diferentes, o modelo de financiamento não pode ser um só.

Qual vai ser a vantagem para o investidor no novo modelo?

Para que submeter o produtor à via-crúcis que é bater na porta do departamento de marketing de empresas com o pires na mão se a renúncia é de 100%? Quase todo o financiamento de cultura é feito com dinheiro público. Vai ser mais simples: o empresário vai poder contribuir com o fundo por renúncia fiscal ou outros modos, sem ter de escolher projetos, o que gera custo e tempo para eles. Deixa que o ministério seleciona. Outra parte importante é a certificação de responsabilidade social com a cultura do país. Não avançamos no universo das empresas. Apenas cerca de 7% das empresas brasileiras contribuem. É muito pouco. O novo modelo dará retorno de marca maior e menos trabalho.

E a tão sonhada descentralização dos recursos?

Com o fundo isso é bem mais fácil. Hoje, com todas as deficiências, a distribuição dos recursos administrados pelo FNC tem proporcionalidade democrática, apesar da diferença de desenvolvimento cultural de região para região.
O Vale-Cultura finalmente sai do papel.
Vai ser como o tíquete-refeição. É o investimento no consumo. Hoje só se investe na produção e não se dá acesso. O trabalhador pode trocar por livro, entrada em teatro, dança, cinema. Milhões de brasileiros hoje não têm consumo cultural. Está praticamente em exercício, estou conversando com a área econômica sobre isso, para definir já as empresas que vão gerir.

O senhor espera que a nova lei emplaque, mesmo com a crise batendo à porta?

Estamos com muita expectativa e acompanhando a chegada da crise ao Brasil para definir políticas de proteção da área cultural. Supondo que o dinheiro suma, o que não deve acontecer, há cumplicidade do governo, o impacto seria pequeno. O ano de 2009 vai ser de muita negociação, com governo, parlamento, área privada. Uma vez aprovadas essas mudanças, trabalho para que haja reforço orçamentário para que o fundo cumpra plenamente seu papel.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

CONSCIENCIA

"Preocupe-se mais com sua consciência do que com sua reputação. Sua consciência é o que você é, e sua reputação é o que os outros pensam de você. E o que os outros pensam é problema deles!"
(Bob Marley)

sábado, 10 de janeiro de 2009

O CORNETEIRO LOPES

Diretor Lázaro Farias


Wladimir Cazé - Correio da Bahia

Curta-metragem mostra batalha baiana travada entre portugueses e brasileiros pelo domínio do país

Episódio pouco conhecido da Independência do Brasil, a Batalha de Pirajá vai ser reeencenada no curta-metragem O Corneteiro Lopes, primeira película de ficção do diretor baiano Lázaro Faria, que terminou de ser rodado na quarta-feira passada, com filmagens na Igreja da Conceição da Praia (Cidade Baixa). O roteiro - escrito por Faria com a colaboração de Paulo Caldas, Manuela Dias, Claudio Nigro Luis Wanderhausem - foi um dos ganhadores do Prêmio Coni Campos 2002 de Cinema da Secretaria da Cultura e Turismo da Bahia. "Foi uma luta insana, mas cumprimos o prazo e conseguimos momentos maravilhosos", diz o diretor, que recebe esta semana o copião e, na seqüência, começa a montagem. O lançamento está previsto para o próximo dia 2 de julho.

O filme (em 35mm e dolby digital) terá custo total de mais de R$150 mil, sendo que R$70 mil são provenientes do prêmio governamental. O projeto também prevê um DVD - com o curta, o making of e depoimentos de historiadores, militares e educadores -, que será distribuído em escolas e bibliotecas. Estão no elenco o ator português Nuno Lopes (da novela global Esperança) e os brasileiros Leandro Firmino da Hora (o Zé Pequeno de Cidade de Deus), Thalma de Freitas (da também global Laços de família), Gideon Rosa e Paolo Ferreira.
Ocorrida na madrugada de 7 para 8 de novembro de 1822, nos arredores de Salvador, a Batalha de Pirajá foi decisiva para a rendição das tropas portuguesas sitiadas na cidade. Embora a independência do Brasil tivesse sido decretada dois meses antes, a ordem de entrega do comando da Bahia ao imperador Pedro I não fora reconhecida pelo general português Madeira de Melo, que assumiu o controle de Salvador. O filme vai mostrar a batalha da artilharia com que os portugueses tentaram surpreender os brasileiros e furar o cerco montado pela resistência local, liderada pelo general francês Labatut.
Durante essa batalha, o corneteiro português Luiz Lopes, que integrava as tropas de Labatut, recebeu a ordem de tocar uma "retirada", mas - até hoje não se sabe por que - tocou a ordem de "avançar cavalaria degolando". O toque assustou o exército lusitano e mudou o desfecho do conflito. O palco de guerra foi reproduzido cenograficamente nas proximidades de Arembepe. "Reproduzimos com 35 figurantes uma situação que envolveu 12 mil pessoas", disse Faria ao Folha.
O Exército apoiou a produção, através da 6ª Região Militar, que ofereceu ajuda em logística, fardamento de época, armas e pessoal de figuração, além de peritos em explosões. O especialista em efeitos especiais Farjala, da TV Globo, foi convocado para as filmagens. A trilha sonora está a cargo de Bau Carvalho (guitarrista dos Lampirônicos), que vai gravar uma versão moderna do Hino ao 2 de julho.
Mistério histórico - O roteiro foi baseado numa entrevista que o historiador Cid Teixeira concedeu ao diretor, também autor do argumento. "Pesquisei em Portugal, na Torre do Tombo e no Museu Ultramarino e não encontrei muita informação sobre Lopes. Cid Teixeira foi a pessoa que deu mais subsídios para o roteiro, inclusive elementos imaginativos", diz Faria.
Como o motivo histórico para Lopes ter desobedecido a ordem de Labatut é desconhecido, o filme conta uma versão romanceada, que inclui uma escrava por quem ele estaria apaixonado. Segundo Faria, Luiz Lopes tinha cerca de 40 anos e há 20 morava no Brasil, onde veio tentar a sorte na carreira militar. "Ele não tinha interesse em voltar a Portugal e se os portugueses ganhassem a batalha, certamente seria enforcado como traidor. Isso era motivo suficiente para chutar o pau da barraca", interpreta o diretor. "O fato é que os toques de ''retirada'' e ''avançar cavalaria degolando'' são totalmente diferentes. Não há a possibilidade de ter sido engano", opina.
Faria já dirigiu vídeos publicitários e institucionais e estreou na ficção com O segredo do faraó (1998). Também cuidou da produção e da direção de fotografia do curta Lua violada, de José Umberto Dias, produzido com o prêmio da Secretaria de 2001.

PLAOMA ROCHA "GARIMPA" OBRA DO PAI!

JOEL PIZZINI, PALOMA ROCHA, HELENA IGNEZ, JULIO BRESSANE E DJIN SGANZERLA

Beto Magno

Paloma Rocha, filha do diretor brasileiro Glauber Rocha, revelou que pretende realizar uma série de projetos relacionados à obra cinematográfica de seu pai neste ano e em 2009, quando o cineasta completaria 70 anos.

Estreiou na TV Brasil o primeiro destes novos projetos, a série inédita "Sertão Glauber".
Dividida em oito episódios de 30 minutos, a série, com imagens feitas em 1968, mostra a história de "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro", filme exibido no último Cine Ceará e vencedor do prêmio de melhor direção no Festival de Cannes em 1969.
"Sempre existe uma confusão, porque muita gente acha que ele ganhou a Palma de Ouro pelo filme, mas, na verdade, foi o prêmio de melhor diretor, no ano em que o festival foi presidido por Luchino Visconti", conta Paloma, produtora e diretora da série.

"O mais engraçado é que nós não temos este prêmio porque, na época, Zelito Vianna (produtor do filme e irmão do comediante Chico Anysio) o levou para o hotel onde estavam hospedados na França. Então, todos saíram para comemorar e, depois, acabaram perdendo o documento", afirma Paloma.

Cópia restaurada de "O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro" estréia no Ceará
Paloma conta que o projeto de "Sertão Glauber" começou há três anos, quando ela e Joel Pizzini, co-diretor da série, começaram a trabalhar no relançamento dos filmes restaurados do cineasta, ícone do Cinema Novo.
"A idéia era ter um documentário para cada filme. Fizemos o "Anabazys - Anatomia do Sonho", que foi exibido no Festival de Veneza e ganhou prêmio no Festival de Brasília, e este material da série iria apenas acompanhar DVDs com filmes do Glauber", conta Paloma.
Porém, após uma conversa com a TV Brasil realizada em janeiro, a emissora se interessou pelo material e Paloma e Pizzini decidiram formatar o material para criar a série em parceria.
"Estamos fazendo praticamente 'arqueologia' da obra do Glauber", afirma Paloma.

Entre os momentos mais interessantes de "Sertão Glauber", ela destaca uma entrevista de Pizzini a Martin Scorsese para a Folha de S.Paulo, onde o cineasta afirma, entre outras coisas, que os filmes do brasileiro podem ajudar jovens atores a não se renderem à indústria hollywoodiana.
Paloma diz que, além de depoimentos como o de Scorsese e outras figuras relevantes da época como o diretor de teatro José Celso Martinez Corrêa, o crítico Ismail Xavier ou Jean-Pierre Gorin, braço-direito de Jean-Luc Godard, a série conta ainda com diversos trechos de obras da filmografia de Glauber.
"O trabalho ajuda os espectadores a entender e conhecer melhor sua obra, com trechos de filmes e imagens importantes, como quando Glauber foi entrevistado em Cuba, em 1968, para falar sobre o papel do intelectual na América Latina, que na época ia para rua, lutava", conta Paloma.
"É uma obra política, poética, com um ritmo 'épico didático', como diria Glauber", completa.
Desejo
Paloma afirma que a idéia de uma série televisiva sobre a obra de Glauber Rocha era um sonho antigo de seu pai.
"Estamos satisfeitos e muitos felizes com o resultado da série e com sua exibição pública. Fazer uma série nestes moldes era um sonho antigo dele (Glauber)", conta a diretora. "De repente, chegou a TV no momento certo e o programa estava pronto".

70 ANOS

Paloma Rocha diz ainda que pretende expandir os projetos relacionados a filmografia de seu pai, principalmente no ano que vem, pela comemoração dos 70 anos de seu nascimento.
"Este ano fizemos uma pequena exposição em Salvador, para comemorar seus 69 anos dele, em 14 de março. Mas gostaria de, em 2009, fazer uma grande mostra com todo este vasto material que estamos trabalhando e recuperando", afirma.

CAP COMUNICAÇÃO

INSTALAÇÕES DO CAP ESCOLA DE TV EM SALVADOR

BETO MAGNO


O CAP é uma empresa que atua nas áreas de comunicação e marketing, produção de videos e promoção de cursos livres na área de televisão. Os cursos do CAP são: CURSO DE INTERPRETAÇÃO PARA TV, PROPAGANDA E CINEMA para atores;TELEJORNALISMO para estudantes de jornalismo,apresentadores e todos os profissionais que utilizam a comunicação como instrumento de trabalho.Este curso possui em sua grade aulas de dicção, memorização, postura e respiração, leitura e interpretação de textose gravação de textos frente as cameras.CURSO DE LOCUÇÃO;CURSO DE PRODUÇÃO E DIREÇÃO DE AUDIOVISUAIS.Na assessoria de comunicação e marketing empresarial e politico o CAP trabalha em parceria com alguns bons profissionais do mercado baiano a exemplo da jornalista Evanice, 30 anos de profissão (10 anos de jornal A TARDE - coluna Lady Eva.O CAP também é uma produtora de videos. Grava, edita e finaliza comerciais para tv, documentários e programas de tv, etc.O último documentario produzido pelo CAP, em novembro de 2005, foi o Caballeros 45, em comemoração aos 45 anos da Sociedade Cultural Caballeros de Santiago. Em fase de produção está o documentário Maracangalha 95 anos que deverá ser lançado em 2008. A frente do CAP está Rada Rezedá.Atriz, Apresentadora de Tv, Locutora e Publicitária. Formada em Inglês. Graduanda em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo cursou dança no Studio de Dança da Bahia durante 10 anos e Artes Cênicas na UFBA. Fez diversos cursos com grandes nomes do Teatro Nacional como: Sérgio Brito, Augusto Boal, Bia Lessa,Paulo Autran,Fernananda Montenegro, etc. Possui, ainda, diversos cursos na área de marketing político e empresarial. Como locutora é a voz de grandes clientes: Shopping Barra, Shopping Itaigara, etc. Durante 3 anos foi a VOZ OFICIAL da TIM / MAXITEL, escolhida pelo grupo Vicunha/Itália em uma seleção de 100 locutoras em todo o Brasil. APRESENTADORA DO PROGRAMA DE VEREADORES DE PINHEIRO 13.Programas de Televisão: ABRAKABAM, com estreia para janeiro de 2009,Planeta Criança, piloto de programa infantil (2003),Programa Xodó Show (Band Bahia) Programa Bacana, revista de variedades na Band Bahia (2001); Campanha Política do PFL na Tv Cultura do Sertão (2000); Axé Tv, piloto de programa de auditório (1999); Bahia Viva, programa de entrevistas no Canal Executivo da Embratel (1998); Rada Vai às Compras na Band Bahia (1994); Tv Pelô, programa de entrevistas ao lado de Zezé Mota e Kátia Guzzo, (19931994). Teledramaturgia: O Caso da Menina Morta, na Rádio Cidade (novela de rádio 2001); Buzú Bacana, humorístico na Band Bahia (2001); Zulia, a Fada da Alegria, CD Infantil da NT Editora (1999); Renascer, novela da Rede Globo (1993); As Mocréias, humorístico de Sérgio Farias (1992), Mãe-de-Santo, mini-série da Rede Manchete (1991), dentre outros. Propaganda: Cesta do Povo, Jornal Correio da Bahia, Secretaria de Saúde do Governo do Estado da Bahia, Secretária de Educação do Estado da Bahia,Shopping Itaigara, A Provedora, Pacto Federal, Café Duas Estrelas, Distribuidora de Livros Salvador, etc. Teatro: Todas as Dúvidas de Elizabeth Bournier (2007),Crime Cracker, de Luis Sérgio Ramos (1999); Telma a Tonta, de Luis Sérgio Ramos (1998); Séquiço Frágil, direção Valdiki Moura (1996); Pode Ser Que Seja Só o Leiteiro Lá Fora de Caio Fernando de Abreu, direção Paulo Dourado (1993); As Mocréias, Fale-me de Amor, Em Cima da Terra Em Baixo do Céu, com direção de Sérgio Farias (1991-93); Dirigiu o espetáculo-recital O Desaparecimento de Luíza Porto, de Carlos Drummond de Andrade (1993), dentre outros.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

CURSO PARA TV

O quê: CURSO DE INTERPRETAÇÃO PARA TV E TELEJORNALISMO
Início: 31 DE JANEIRO DE 2009
Duração: 5 meses aulas SABADO DAS 9 AS 12.30 H
Público alvo: jornalistas, radialistas, atores, estudantes de comunicação
Local: Rio Vermelho, Rua Macaúbas, 130. Tel: (71) 9167-8274 / 8774.8870
Realização: CAP COMUNICAÇÃO
RESERVE SUA VAGA COM ANTECEDENCIA

Clube de Cinema da Bahia redivivo

Guido Araújo ri de contentamento com a ressurreição do Clube de Cinema da Bahia, que, desativado desde 1990, há, portanto, 18 anos, vai voltar a funcionar. Para quem não sabe, o Clube, fundado em 1950, à frente Walter da Silveira, foi responsável pela formação de muitos realizadores, críticos e amantes do cinema, entre os quais o internacional Glauber Rocha, que começou a entender Eisenstein pelas mãos de Walter da Silveira. Com a morte deste, em novembro de 1970, aos 55 anos, o Clube ficou sob a responsabilidade de Guido Araújo, que deslocou a sua programação para o extinto cinema Rio Vermelho e os jardins do Instituto Goethe, com a inauguração do Cinerante (cinema + restaurante), cuja denominação tem seus direitos autorais em nome do próprio Guido ou de Roland Schaffer (que era, na ocasião, início da década de 70, o diretor do Goethe/Icba). Espaço quase consular, o Goethe virou point dos universitários e dos amantes da arte (não somente o cinema tinha pouso neste instituto alemão, mas também todas as artes em geral), chegando, inclusive, a dar origem ao vocábulo icbano para denominar todo aquele que era um habituée de suas programações culturais.
Pouco depois de receber o importante Prêmio Roberto Rossellini, concedido pelo Festival de Cinema de Maiori (cidade da costa Amalfina, onde Rossellini realizou vários de seus filmes - L'amore, Paisà), na Itália, como organizador da Jornada Internacional de Cinema da Bahia, agora em outubro último, Guido Araújo é contemplado com o Troféu Paulo Emílio Salles Gomes concedido pelo Conselho Nacional de Cineclubes no momento em que, neste ano, o movimento cineclubista completa 80 anos de atividades no Brasil.
O fato é que o Clube de Cinema da Bahia vai voltar às suas atividades. Recebi de Guido Araújo uma mensagem na qual convoca todos os amigos cineclubistas baianos para uma assembléia na próxima sexta, dia 12. Eis um trecho dela: "estamos convidando os amigos e ex-sócios do Clube de Cinema da Bahia de outras épocas, para que, juntos, possamos em Assembléia, reerguer o CCB, já com estatutos adequados aos tempos atuais. A data agendada para o reencontro dos amigos do CCB, será no próximo dia 12 de dezembro, sexta feira, a partir das 17 horas, sala 05 do ICBA, no emblemático espaço do Instituto Goethe, que sempre esteve ao lado das promoções cinematográficas dos cineclubistas baianos e da Jornada de Cinema da Bahia."
Postado por André Setaro.

QUE TODA DOR SE TRANSFORME EM LUZ


Eu Me Lembro

por André Setaro

Evocação de um pretérito, que se consubstancia, na verdade, no próprio passado do autor, retrato de uma geração e do espírito de uma época, Eu me lembro, de Edgard Navarro, cujo roteiro venceu, por unanimidade, o Prêmio Carlos Vasconcelos Domingues, primeiro de uma série de editais patrocinados pela Secretaria de Turismo e Cultura do Estado da Bahia como incentivo à produção de filmes, obra de estréia desse realizador no longametragismo, é surpreendente pelo seu vigor poético, que se caracteriza pela atipicidade em relação à costumeira abordagem temática daqueles que fazem cinema nestas plagas.
A sua singularidade vem, em primeiro lugar, da maneira pela qual Navarro trata o seu tema, mas, também, pelo que diz. Retrato de sua geração, a mesma, aliás, que se angustia e se exaspera em Meteorango Kid, o herói intergalático (1970), de André Luiz de Oliveira, Eu me lembro, trinta e quatro anos depois deste filme, vem, por assim dizer, fazer um balanço da trajetória tumultuada de uma rebeldia anárquica que pontificou a partir de meados dos anos 60 com o chamado Cinema Marginal. E que tem, na Bahia, o seu apogeu na iconoclastia do boom superoitista do qual Edgard Navarro é, talvez, o seu mais emblemático representante, com as dilacerações fílmicas de O rei do cagaço, Lyn e Katazan, Exposed, entre outros, e, particularmente, O Superoutro (1980), este um média metragem já anunciador de um cineasta febril e extremamente agitado que, com o passar dos anos, adquiriria uma certa pacificação para o mergulho em seu amarcord que se cristaliza em Eu me lembro.
A verve satírica, o humor, sempre presente a cada fotograma, estão, no entanto, intactos, mas, paradoxalmente, ocultos por elipse no filme de longa metragem. Não mais o tumulto interior à flor da pele, a crueldade, imensa, de rir de si próprio – característica, aliás, somente dos grandes artistas, a escatologia jogada ao ventilador, a imperiosa necessidade de afirmar as suas idiossincrasias diante do estar-no-mundo, como podem ser verificados na sua filmografia de superoitista aparentemente perturbado pela angústia da existência, mas a assunção da maturidade, a disponibilidade de olhar o seu itinerário com a paciência dos sábios, a temperança dos que, passado o delírio, conquistam a paz para, assim conseguida, por em prática um revival de sua própria vida. Se o delírio se aquietou, encontra-se, no entanto, potencialmente sugerido nas imagens de Eu me lembro.
Nascido em meados do século passado, Navarro empreende neste filme uma busca de suas lembranças desde a primeira, quando esteve no cais do porto para receber um parente e viu um navio ancorado. O resgate memorialístico se faz por meio de sua percepção do homem e das coisas desde tenra idade. É, neste ponto de vista, um inventário, um recuerdo, mas um inventário, diga-se logo, de um artista sensível e exultante, que oscila entre o amargor e a alegria, entre o riso e a tristeza. Eu me lembro, em mãos de um outro cineasta que não as de Edgard Navarro, poderia resultar num amontoado de lembranças pueris, mas o autor soube resgata-las com halo poético não destituído, entretanto, de um olhar irônico muito acentuado e de uma consciência sempre presente da tragicidade da existência.
Estruturado através de fragmentos de memória, Eu me lembro não possui uma narrativa para aqueles que buscam a instalação do conflito clássico in progress ou páginas de viradas explosivas. Se há conflito, este se instaura no interior dos fragmentos e na obra como um todo como o conflito de um realizador com suas lembranças. O corpus, portanto, do filme de Edgard Navarro, é um corpus pleno de fragmentos, estilhaços do que se lembra de mais essencial na formação de uma personalidade. Mas o que se possa ver como individualismo se espraia numa perspectiva universalista, porque a obra navarriana é, na verdade, o inventário poético de toda uma geração. Nesse sentido, e, aqui, não vai nenhuma alusão a interferências estéticas, considerando ser o filme de Navarro muito singular e especial, Eu me lembro é filho de Meteorango, assim como, também, de toda uma saga underground que se estabeleceu quando o autor saiu da aborrecência para a consciência de uma juventude sem rumo. A formação do cineasta se deu na plenitude de uma época na qual poucas eram as saídas, asfixiadas que estavam por um regime de exceção rigoroso e pelas influências vindas do exterior: a eclosão do hipismo, com sua filosofia do flower power, Maio de 68, o cinema subterrâneo que se tinha notícia, a desconstrução operada por Jean-Luc Godard, et caterva. E Edgar, num happening acontecido em meados dos anos 70, durante uma das jornadas baianas, pôs em prática o dito sganzerliano de O bandido da luz vermelha: 'quando a gente não pode fazer nada, a gente se avacalha e se esculhamba'. No meio de um debate estéril, no cine-teatro do Icba, fez corar o crítico José Carlos Avellar e, constatando que palavras seriam inúteis para o rebate de uma arenga, tirou a roupa, e nu, com a mão no bolso, estarreceu os participantes.
Uma constante do cinema navarriano é o humor, conditio sine qua non para a existência de uma obra de arte, assim é se nos parece. O humor é essencial e pode ser aplicado mesmo nas situações mais trágicas (vide Shakespeare, Racine, Nelson Rodrigues, Luis Buñuel...). O humor e a consciência da tragicidade da existência, dois elementos fundamentais para a substancialização de uma visão de mundo. Edgard Navarro já mostrou, em seus filmes anteriores, que os possui às escâncaras. Assim, em Eu me lembro, cada fragmento do seu amarcord é pontuado com uma chave irônica, um acento humorístico, um olhar, ora sarcástico, ora cheio de piedade, sobre a pobre condição do homem na Terra. Filme exemplar nesse sentido, pleno de observações perspicazes sobre o comportamento humano, acerca das idiossincrasias do ser enquanto vivente e navegador e condutor de seu itinerário vivencial. A primeira visão do filme pode provocar omissões, pois Eu me lembro foi dado a conhecer em única e especialíssima sessão privé.
Impressionante como, contando com poucos recursos – o dinheiro do prêmio, insuficiente para a reconstituição de uma décadas ou, mesmo, para a feitura de um longa-metragem, Navarro conseguiu transmitir o espírito de sua época. A direção de arte é excelente e os intérpretes, todos atores baianos, constituem tipos extraordinários, a destacar a figura do pai, cuja força de convencimento e poder de verdade são inegáveis. Mas não se poderia, sob pena de violenta omissão, ressaltar a presença tocante de empregada negra, que comove pela sua expressão, pela sua autenticidade, principalmente no fragmento no qual, já decaída pela idade, pelo passar do tempo, entra triste num asilo de idosos. São pequenas coisas que o filme de Navarro possui que conseguem transmitir todo um sentimento de mundo, toda a angústia do fluxo temporário que aniquila, que destrói as esperanças de outrora e revelam a maldade do mundo para com os seus viventes. Mas e a louca que fala impropérios e dita suas diatribes? Crepuscular a seqüência quando o jovem Edgard, já entrado na juventude, passeia com um amigo por ruas noturnas e encontra uma maluca a dizer coisas aparentemente ensandecidas, mas que revelam verdade e dor. O close-up desta personagem enfurecida pela loucura lúcida é de força invulgar.
Nenhum filme brasileiro até agora apresentou tão bem o retrato da era ripesca como faz Navarro em Eu me lembro. Talvez porque, também, um personagem do período no qual viveu intensamente suas divagações, curtindo a letargia do estar e da inação, o fato é que transmite muito bem o que foi aquela época. Se em Meteorango Kid, o herói intergalático, na famosa seqüência do apartamento em que os três personagens fumam maconha, o tom é de desespero, dilaceramento, e explosão, no filme de Navarro reinam uma calmaria, uma letargia, capazes de estabelecer o clima do revival do próprio filme, com os fantasmas do passado a desfilar no gramado verde até que o personagem central, que é o próprio Edgard, decaídas as expectativas, desfeitas as desesperanças, diz que vai comprar uma câmera Super 8. É o embrião que se instaura, o embrião do cineasta.
Na estrutura do discurso cinematográfico navarriano, os fragmentos, que fazem parecer bolhas que se desmancham no ar da memória em flou, de repente, assumem uma combustão quando do sonho agitado do personagem principal. É o próprio filme que se sintetiza como um ensaio memoralístico, revelando a sua estruturação de estilhaços de lembranças e, com isso, fazendo lembrar também a necessidade que todos precisam da memória, a memória como estabelecimento presente, constituinte do próprio ser humano (vide Hiroshima, mon amour, O ano passado em Marienbad, Muriel, todos de Alain Resnais).
A herança felliniana é, porém, a que corre no sangue de Navarro no filme em questão. A influência não significa nenhum desmérito, pois como disse Harold Bloom, famoso crítico literário, toda a literatura ocidental descende de Hamlet, de William Shakespeare, chegando, mesmo, a identificar Bloom em qualquer livro uma decorrência do arquétipo emblemático do bardo. Fellinianas são as cenas dos fantasmas, a da mulher gorda que recebe xingamentos dos meninos – Sagharina de Oito e meio? e a belíssima seqüência do charlatão que se impõe como prestidigitador a fazer uma mulher adormecer sob hipnose.
Mas o que importa é que Eu me lembro, de Edgard Navarro, suavizando, aqui, suas diatribes anteriores, sem perder a ironia devastadora – e que bela e insólita aquele momento do enterro quando um maltrapilho joga caixões de defunto num amontoado deles, adquirindo atmosfera surrealista, é um dos melhores filmes já feitos pelo cinema baiano em todos os tempos. E um exemplo para a cinematografia brasileira.

OS TRINTA FILMES MAIS SIGNIFICATIVOS DO CINEMA BRASILEIRO

DIRETOR BETO MAGNO

A referência mais antiga ao cinema brasileiro data de 1898. Afonso Segreto, a bordo do navio Brésil, tirou algumas "vistas" da Baía da Guanabara com uma câmera de filmar Lumière que acabara de adquirir em Paris. A Cinemateca Brasileira adotou este evento como marco e, dentro de seu espírito de preservar e divulgar o cinema nacional, promoveu, em 1988, urna série de atividades para celebrar os 90 anos do cinema brasileiro.
Uma delas consistiu na escolha dos 30 filmes brasileiros mais significativos, realizada através de consulta a críticos de jornais, revistas e emissoras de televisao, além de pesquisadores ligados a universidades e órgãos culturais, visando a estabelecer uma videoteca básica, para divulgação internacional.
Diferentes fases e estilos encontram-se aqui representados – o filme mudo, o Cinema Novo, as produções da Vera Cruz, o cinema intimista e o "marginal" –, dando prova da vitalidade de um cinema que superou os obstáculos à sua própria existência, surgidos ao longo dos anos.
OS FILMES (por ordem alfabética):
O assalto ao trem pagador, de Roberto FariasO bandido da luz vermelha, de Rogérío Sganzerla Bang bang, de Andrea Tonacci Brasa dormida, de Humberto Mauro Bye bye Brasil, de Carlos Diegues Cabra marcado para morrer, de Eduardo Coutinho Os cafajestes, de Ruy Guerra O cangaceiro, de Lima Barreto Deus e o diabo na terra do sol, de Glauber Rocha O dragão da maldade contra o santo guerreiro, de Glauber Rocha Eles não usam black-tie, de Leon Hirszman Os fuzis, de Ruy Guerra Ganga bruta, de Humberto Mauro O grande momento, de Roberto Santos A hora e a vez de Augusto Matraga, de Roberto Santos Limite, de Mário Peixoto Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade A margem, de Ozualdo Candeias Matou a família e foi ao cinema, de Júlio Bressane Memórias do Cárcere, de Nelson Pereira dos Santos Noite vazia, de Walter Hugo Khouri O pagador de promessas, de Anselmo Duarte Pixote - a lei do mais fraco, de Hector Babenco Rio quarenta graus, de Nelson Pereira dos Santos São Bernardo, de Leon Hirszman São Paulo Sociedade Anônima, de Luiz Sergio Person Terra em transe, de Glauber Rocha Toda nudez será castigada, de Arnaldo Jabor Tudo bem, de Arnaldo Jabor Vidas secas, de Nelson Pereira dos Santos.

BETO MAGNO

Documentário revela figura do poeta baiano Waly Salomão



SÃO PAULO - Grande vencedor do Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade de 2008, "Pan-Cinema Permanente", do diretor paulista Carlos Nader, revela algumas das muitas faces do poeta e compositor baiano Waly Salomão (1943-2003). O filme estréia em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Filho de pai sírio e mãe baiana, Salomão chegou a estudar Direito, mas desde a adolescência foi fisgado pela poesia. Seu primeiro livro foi publicado em 1971, "Me Segura que eu Vou Dar um Troço". Não parou mais na carreira literária, vencendo o prêmio Jabuti, em 1997. Em 2003, tornou-se Secretário do Livro e da Leitura do Ministério da Cultura, na gestão de seu amigo Gilberto Gil.
Amigo e biógrafo do artista plástico Hélio Oiticica, Salomão aproximou-se dos tropicalistas no final dos anos 60, tornando-se um dos compositores preferidos das cantoras Gal Costa e Maria Bethânia e parceiro de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Jards Macalé -- com quem escreveu as canções "Vapor Barato" e "Mal Secreto", que seu tornaram sucesso na voz de Gal.
Entre outras músicas famosas, estão "Mel" e "Talismã", com a co-autoria de Caetano e gravadas por Maria Bethânia, e "Luz do Sol", parceria com Carlos Pinto.
Fazendo justiça à personalidade inquieta de seu biografado, "Pan-Cinema Permanente" recolhe suas manifestações de várias fontes, como as dos filmes em que ele atuou, "Quilombo" (84), de Cacá Diegues, e "Gregório de Mattos" (03), de Ana Carolina.
A maioria das imagens inéditas, que registram saborosas conversas com Salomão em viagens, são fruto da ampla convivência do diretor Nader com o poeta e compositor, que o filmou ao longo de 15 anos.
Também são entrevistados amigos do poeta, como o próprio Caetano, Antônio Cícero -- com quem Salomão escreveu as letras do disco "Zona de Fronteira", de João Bosco --, Gilberto Gil e seus filhos, Omar e Khalid Salomão.
O documentário registra algumas seqüências especialmente engraçadas, como a participação de Salomão num programa de TV síria onde, entre inglês e português, o poeta confunde seu entrevistador, que procura manter as regras do jogo.
Salomão morreu vítima de câncer no fígado, aos 59 anos, no Rio de Janeiro, em maio de 2003.
Por Neusa Barbosa, do Cineweb